Apesar de terem apresentado rentabilidade inferior e dívida líquida maior do que em 2019, as maiores empresas brasileiras terminaram 2020 com tendências positivas na situação econômica e financeira. Ainda assim, 2021 começa com cenário incerto para a realização de novos investimentos.
As observações constam de nota técnica elaborada pelo Centro de Estudos de Mercados de Capitais (Cemec) da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). A entidade avalia, divulga e promove o debate sobre o desempenho e a funcionalidade do mercado de capitais no Brasil, com o objetivo de mobilizar recursos de poupança para financiar a economia do país.
A análise levou em consideração as demonstrações contábeis até o terceiro trimestre de 2020 de 454 empresas não financeiras, das quais 296 de capital aberto e 158 fechadas. Do total, 293 têm faturamento acima de R$ 300 milhões; 66, entre R$ 90 milhões e R$ 300 milhões; e 95, abaixo de R$ 90 milhões. A amostra utiliza dados dos levantamentos ValorPro e Melhores e Maiores da revista Exame e exclui Petrobras, Eletrobras e Vale.
Os autores ressaltam que as conclusões dizem respeito à média do universo pesquisado, mas que “o impacto da crise da pandemia em 2020 foi extremamente diferenciado entre setores e entre empresas”, o que pode comprometer em certa medida o significado de indicadores calculados sobre valores médios ou totais.
Apesar de as vendas no período terem sido 3,4% superiores ao observado nos 12 meses anteriores, em termos de rentabilidade houve queda significativa: a relação entre lucro líquido e receita operacional líquida (ROL) caiu de 6,3% para 2,5%. Segundo o estudo, a queda se deve ao aumento de despesas financeiras líquidas, uma vez que as empresas conseguiram manter os coeficientes de resultados operacionais.
Mesmo com a crise, as empresas conseguiram elevar as margens de lucro bruto sobre vendas para níveis iguais aos de 2019 (26,3%). “Dada a predominância de empresas industriais na amostra, pertencentes ao segmento de produtos comercializáveis (tradables), é razoável supor que esse resultado tenha sido induzido também pela desvalorização cambial”, ressaltam os autores.
A distribuição de dividendos para acionistas caiu de 1,17% do PIB, em 2019, para 0,85%, o menor coeficiente desde 2009.
Em relação à taxa de investimentos das empresas, houve queda, vindo de 15,79% do PIB observado em 2019 para R$ 14,84%, após uma modesta recuperação iniciada em 2018. O índice é o segundo menor desde o ano 2000, superando apenas o verificado em 2017 (14,63%).
Retomada do crescimento depende do investimento privado
A nota aponta que a retomada do crescimento depende essencialmente do aumento do investimento privado, uma vez que as restrições fiscais têm reduzido cada vez mais o espaço para investimento público.
Segundo o estudo, a pandemia tem tido forte impacto na incerteza de empresários e investidores em relação a decisões de investimento. O chamado indicador de incerteza observado ao fim do terceiro trimestre de 2020 foi o maior de toda a série iniciada em 2010.
A dívida bruta das empresas brasileiras não financeiras aumentou quase 20% entre dezembro de 2019 e setembro de 2020, com salto de R$ 731 bilhões – de R$ 3,713 trilhões para R$ 4,444 trilhões. Dois terços desse aumento não representam entrada de caixa, mas somente impacto da desvalorização cambial sobre a dívida externa. A captação líquida de recursos domésticos foi de R$ 236,2 bilhões, facilitada pelas medidas emergenciais do Banco Central.
Em relação às pequenas e médias empresas, embora a situação seja mais difícil do que nas de maior porte, chamou a atenção uma reversão na tendência de crescimento no número de companhias inadimplentes. O indicador vinha crescendo desde o início de 2016, mas a partir do segundo trimestre de 2020 ele voltou a patamares de 2015. A razão seriam os programas emergenciais criados para favorecer essas empresas.
Cenário de investimento para 2021 é incerto
Os resultados não favorecem o aumento de investimentos daqui para frente. “As taxas de retorno de capital total investido se situaram muito abaixo do custo médio ponderado de capital; as expectativas de crescimento da demanda (PIB) nos três anos adiante foram mantidas em 2,5% a.a. num quadro de elevada capacidade ociosa e alto nível de incerteza”, diz o estudo.
A nota diz ainda que, em razão do avanço recente da pandemia de Covid-19 e da defasagem dos efeitos da vacinação, “as perspectivas para 2021 carregam altos níveis de incerteza”. Se, por um lado, as expectativas do mercado de crescimento do PIB em torno de 3,5% forem realizadas, as maiores empresas devem ter evolução positiva de sua situação econômica e financeira, dizem os autores.
Por outro lado, “os fatores que se supõem relevantes na decisão de investir não sinalizam cenário favorável para o aumento total de investimentos das empresas da amostra”.
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