O plano de redução de impostos traçado pelo Planalto em parceria com o Congresso Nacional já fez efeito nas bombas e derrubou o preço dos combustíveis. Sem novas surpresas no mercado internacional de petróleo, a tendência é de que os valores nas bombas fiquem mais comportados até o fim do ano, enquanto durar a desoneração de tributos federais.
Mas e depois? Há caminhos para o Brasil manter esse patamar de valores mais baixo? E isso pode acontecer com o apoio de estados e municípios, que vão enfrentar perdas de arrecadação com o teto permanente do ICMS?
Os caminhos existem, aponta a coletânea “Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil”, lançada no fim de maio. A obra, organizada pelo economista e pesquisador do Insper Marcos Mendes, analisa várias ações implantadas no país nos últimos anos que não produziram os efeitos esperados. Os 33 autores que participaram do livro também apontam algumas soluções para os problemas que ainda afligem a sociedade brasileira.
No capítulo sobre política energética, o especialista em petróleo Décio Oddone defende o preço de paridade de importação (PPI) praticado pela Petrobras, mas também destaca que os preços ao consumidor devem ser justos, porque há um grande impacto social com a elevação da inflação, que recai sobre as pessoas mais pobres e algumas categorias profissionais. “Mesmo não havendo ação mágica para reduzir o preço ou atenuar a volatilidade, há espaço para, mediante uma atuação adequada, sem interferência ou distorções, mitigar os efeitos ao consumidor”, escreve no livro.
Os caminhos existem, aponta a coletânea “Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil”, lançada no fim de maio. A obra, organizada pelo economista e pesquisador do Insper Marcos Mendes, analisa várias ações implantadas no país nos últimos anos que não produziram os efeitos esperados. Os 33 autores que participaram do livro também apontam algumas soluções para os problemas que ainda afligem a sociedade brasileira.
No capítulo sobre política energética, o especialista em petróleo Décio Oddone defende o preço de paridade de importação (PPI) praticado pela Petrobras, mas também destaca que os preços ao consumidor devem ser justos, porque há um grande impacto social com a elevação da inflação, que recai sobre as pessoas mais pobres e algumas categorias profissionais. “Mesmo não havendo ação mágica para reduzir o preço ou atenuar a volatilidade, há espaço para, mediante uma atuação adequada, sem interferência ou distorções, mitigar os efeitos ao consumidor”, escreve no livro.
Oddone, que foi diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP) entre 2016 e 2020, é crítico da intervenção estatal no setor. Citando dados e outras pesquisas anteriores, defende que a politização do petróleo na América Latina “produziu dividendos políticos efêmeros e duvidosos, seguidos de desajustes estruturais” e sugere caminhos que passam pela maior abertura do setor, com mais competitividade.
Oddone relembra o período do governo Dilma Rousseff (PT) em que a Petrobras segurou reajustes nas refinarias, a fim de ajudar no combate à inflação. As consequências dessa prática são conhecidas: o endividamento da estatal explodiu e parte da indústria de etanol foi à lona, incapaz de competir com os preços artificiais da gasolina.
"De 2008 a 2010, a Petrobras praticou preços superiores aos internacionais, se capitalizando para fazer frente aos grandes investimentos planejados no período. Entre 2011 e 2014, os preços nas refinarias estiveram abaixo dessas referências, o que trouxe perdas estimadas em R$ 100 bilhões. Essa prática também prejudicou o setor de biocombustíveis. A partir de 2015, o quadro mudou, possivelmente em função da necessidade de reduzir a dívida da empresa", escreve Oddone.
Na tentativa de fazer a Petrobras segurar reajustes nas refinarias, o presidente Jair Bolsonaro trocou três vezes a presidência da empresa e uma vez o comando do Ministério de Minas e Energia. Os aumentos ficaram mais espaçados, mas ainda assim ocorreram. O que de fato funcionou para baixar os preços foi a redução temporária de tributos federais e permanente do imposto estadual. No início de julho, a queda do preço do petróleo também ajudou, eliminando a defasagem de preços em relação ao exterior.
A coletânea de artigos foi lançada em 30 de maio, antes da implantação das atuais estratégias para contenção de preços dos combustíveis. Mas os textos de Oddone continuam válidos para debater o que será feito a partir de 2023 – ou até antes, a depender de como vão evoluir as ações na Justiça de estados e municípios que perdem arrecadação, ou caso apareçam novas pressões sobre o preço internacional do petróleo, que levem a Petrobras a promover novos reajustes nas refinarias.
Para o ex-diretor da ANP, é importante manter a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) por meio de um valor fixo – em reais por litro – e uniformizar as alíquotas e o preço de pauta, como estabelece a Lei Complementar 192, aprovada em março deste ano.
Domínio de mercado da Petrobras atrapalha o próprio governo
O pesquisador discorre sobre a volatilidade de preço das commodities como café, soja, milho e minério de ferro – cujos preços não têm relação com o custo de produção e sim com o quadro mundial de oferta e demanda – e até faz brincadeira com a falta de uma campanha “o biodiesel é nosso”, em contraste com o grito de guerra “o petróleo é nosso”. Segundo ele, a pressão popular pelo controle de preços é consequência direta do predomínio da Petrobras no setor de petróleo.
“O preço dos combustíveis nas refinarias representa cerca de 30% a 50% do valor final [antes da queda recente nos tributos]. No entanto, concentra a discussão sobre os custos. Isso ocorre porque o domínio da Petrobras no refino faz da estatal a principal formadora dos preços, o que permite que setores da sociedade entendam que possa haver alguma intervenção pública na empresa para proteger o consumidor. O raciocínio está equivocado, mas enquanto a estatal for dominante, a percepção de que o governo é responsável pelo preço dos combustíveis e pode fazer algo estará presente”, explica.
Além da questão de percepção, a competição entre várias empresas seria benéfica para a formação e controle de preços em patamares justos, avalia Oddone. “Só quando houver mais companhias refinando petróleo, importando derivados e disputando efetivamente espaço com a estatal, bem como existir maior competição ao longo de toda a cadeia, os preços serão formados da forma mais adequada possível”, afirma. O caminho passa pela venda de campos maduros para extração de petróleo, venda da metade do parque de refino e também pela abertura do mercado de gás.
Isso quebraria de vez o “monopólio” da Petrobras, e poderia abrir uma discussão técnica sobre a viabilidade de privatização da estatal, defende o pesquisador. “Se essa for a decisão política, a companhia poderá ser dividida e vendida em partes, para diminuir a concentração, levantando recursos que poderão ter um destino mais nobre que o setor de petróleo, já alvo então de investimentos privados mais elevados que os que a Petrobras monopolista sozinha jamais pode fazer”, diz. Um dos pontos de atenção, caso esse caminho seja escolhido, é evitar monopólios regionais, estimulando a disputa por market share, sugere ele.
A Petrobras toca um programa de desestatização que inclui a venda de oito de suas refinarias. O repasse de unidades ao setor privado é também uma determinação de um acordo firmado em 2019 com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que previa a privatização de oito unidades em dois anos – prazo que depois foi estendido.
Uma dessas refinarias já é operada por uma empresa privada, e três tiveram contrato de compra e venda assinado. Em junho, a Petrobras reabriu o processo para se desfazer de outras três unidades. Na prática, embora já tenha passado adiante mais de 80 ativos nos últimos dez anos, a estatal continua dominando o mercado.
A importância de manter o PPI, segundo Oddone, é justamente garantir que outros players tenham interesse em entrar no mercado, o que atrairá mais investimentos. Oddone estima que quem comprar ativos da Petrobras terá interesse em aumentar a produtividade, para otimizar os custos unitários de produção, “o que deve aumentar a oferta doméstica e diminuir as importações”. Outra possibilidade é facilitar o acesso à infraestrutura logística, transformando a Transpetro em prestadora de serviços para toda a indústria, o que também fomentaria a competição.
“Só assim, mais de 20 anos depois do fim do monopólio, a politização, as expectativas de intervenção governamental nos preços ao produtor e as eternas discussões sobre os combustíveis poderão se resumir ao que deveriam abranger: o aumento da oferta e da competição e o nível e formato da cobrança dos tributos”, conclui Oddone. A íntegra da coletânea da qual Oddone participou está disponível gratuitamente em formato e-book.
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