Linha de montagem da Volvo Caminhões. A principal diferença do Rota 2030 em relação ao seu antecessor Inovar-Auto é que os incentivos do novo programa contemplam toda a cadeia automotiva, e não apenas as montadoras.| Foto: Henry Milleo/Gazetea

Enquanto aguarda a aprovação do Congresso, que deve ocorrer depois do 1.º turno das eleições, o novo programa de estímulo ao setor automotivo, o Rota 2030, já tem 81 emendas que sugerem, inclusive, uma nova rodada de isenção de IPI para veículos convencionais, principal bandeira do seu antecessor, o Inovar-Auto, encerrado em dezembro de 2017.

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Mas se depender da equipe econômica do governo os carros não devem ficar mais baratos, pelo menos não para a maioria dos consumidores. O Rota 2030 prevê redução do IPI apenas para carros híbridos e elétricos e, após quase dois anos de negociações, o governo deve brigar para mantê-lo assim, pois não há margem para estender os benefícios, embora o setor ainda espere mais.

Entre uma série de medidas anunciadas no texto original, o ponto forte do Rota 2030 é a isenção tributária direta sobre investimentos feitos em P&D feitos em toda a cadeia do setor automotivo, e não apenas nas montadoras. O objetivo é estimular a inovação em toda a cadeia, tonando-a mais competitiva.

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Ao todo, as empresas terão de investir em conjunto R$ 5 bilhões por ano em P&D, ao longo de 15 anos, para acessar incentivos fiscais que somam R$ 1,5 bilhão anuais a serem abatidos via IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido). Individualmente, as empresas terão de investir 0,8% do faturamento a partir deste ano até chegar gradativamente a 1,2% em 2022. Em contrapartida, poderão abater 10,2% do valor investido (ou até 12% no caso de investimentos em áreas consideradas estratégicas). O setor esperava algo pelo menos 20%. Entre as emendas, algumas propostas sugerem um porcentual de abatimento do investimento em P&D no IRPJ e CSLL de até 100% do valor investido pelas empresas.

A principal diferença em relação ao seu antecessor Inovar-Auto é que os incentivos do Rota 2030 contemplam toda a cadeia automotiva, e não apenas as montadoras. É por isso que na avaliação do mercado e de especialistas ele é um programa mais equilibrado e alinhado às exigências da Organização Mundial do Comércio (OMC), que acusava o Inovar-Auto de protecionismo. A expectativa é que de 200 a 300 novas empresas do setor automotivo sejam beneficiadas pelo novo programa, segundo Feliciano Aldazábal, gerente de Desenvolvimento de Produto e Serviço da F. Iniciativas, consultoria multinacional que auxilia empresas em projetos de inovação, aproveitando linhas de fomento oferecidas pelos países para este fim.

Além do descontentamento pelo atraso na aprovação do programa, o setor não escondeu que esperava mais, especialmente em algumas áreas como no desenvolvimento de tecnologias para veículos elétricos e híbridos. “Esperava-se por um apoio maior por parte do governo neste campo, mas infelizmente o que foi publicado até o momento é um pouco aquém das expectativas. Mas, tenho confiança que isto deve se ajustar à medida que avançarmos com o programa”, afirma Gleide Souza, diretora de Relações Governamentais do BMW Group Brasil que se tornou uma porta-voz do carro elétrico no país.

No Rota 2030, as contrapartidas das empresas ficaram maiores. Diferente da redução do IPI do Inovar-Auto, um incentivo mais imediato que ajudava a engrossar o caixa das empresas com as vendas no dia a dia, a obtenção de incentivos fiscais atrelados investimentos em P&D é um incentivo de longo prazo. Agora, as empresas terão de aguardar o fim do exercício fiscal para poder abater o imposto, que pode ser acumulado de ano para ano, dependendo do resultado financeiro da empresa.

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“Até cinco anos, o caixa da empresa pode não perceber a diferença. Para as montadoras se perdeu o efeito imediato do benefício do IPI. Os fornecedores, por outro lado, ganharam um incentivo que não tinham antes, mais ajustado ao que pedia a OMC”, avalia Aldazábal.

Efeito dos incentivos tributários

A contrapartida das empresas com investimentos em P&D para fomentar a inovação é vista com bons olhos não apenas pelo mercado. Segundo Karin Soldatelli Borsato, coordenadora acadêmica do Centro da Indústria da Universidade Positivo (UP), as empresas precisam desses incentivos para manter os investimentos em P&D e não perder projetos para filiais de outros países.

“Se a gente fica na dependência dos projetos das matrizes, nunca podemos mostrar o potencial dos nossos profissionais. Além disso, se eu não crio projetos novos para a minha filial, porque a matriz vai continuar investindo em mim?”.

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Como professora nos cursos de Mecânica e Engenharia de Produção da UP, que tem parcerias com o polo automotivo estabelecido na região de Curitiba, ela tem acompanhado de perto os programas do setor automotivo, como o Inovar-Auto e agora o Rota 2030. Segundo Karin, isso ajuda a estreitar a relação com as empresas, fazer parcerias em projetos de inovação e definir planos de ação para os egressos da universidade.

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Um relatório de 2017 da F. Iniciativas sobre incentivos fiscais para P&D mostra que embora o impacto quantitativo seja diferente entre os diferentes países, vários estudos comprovam a efetividade das políticas fiscais para investimentos em inovação. Além disso, segundo Aldazábal, o estudos mostram que o gasto adicional em atividades de P&D induzidas pelos incentivos fiscais aumentam com o tempo e, a longo prazo, superam o montante deduzido do Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (IRPJ e CSLL) por P&D.

Na prática, isso indica que a efetividade dos incentivos fiscais à P&D depende de um marco regulatório eficaz e da estabilidade no tempo. Projetado para os próximos 15 anos, o Rota 2030 atende a esse critério que, segundo empresas e especialistas, dá mais previsibilidade e segurança financeira e jurídica para investir.

Lei do Bem também dá incentivos para P&D

Aldazábal lembra que o Brasil já oferece outros incentivos à inovação. A Lei do Bem, segundo ele, retorna de 20,4% a 34% os investimentos feitos em P&D – e muitas das empresas do setor automotivo também se beneficiam dela. Ou seja, quem se encaixa nas duas tem, no mínimo, 30,6% de isenção fiscal em relação aos investimentos feitos em P&D.

Esse porcentual nos coloca num patamar próximo de outros países que usam outras estratégias para fomentar a inovação, como a subvenção econômica. “Lá fora, quando querem potencializar um determinado setor, oferecem financiamento público, mas não é setorial”, diz. Ele cita exemplos de países onde a F. Iniciativas atua há mais tempo, a Espanha e a França.

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Em ambos não existem incentivos fiscais setoriais para investimento em P&D. Na Espanha, por exemplo, existem editais chamados de planos de competitividade que oferecem às empresas financiamento reembolsável com condições melhores que a do mercado.

“Misturar política de financiamento mais atrativo com incentivo fiscal é uma recomendação da própria OCDE [Organização para o Comércio e Desenvolvimento Econômico]”, diz ele. “No Brasil temos hoje uma situação em que subvenção econômica praticamente não existe para inovação, com grandes editais ou com condições melhores para grandes empresas que investem em inovação”, acrescenta.

Incentivo para tecnologia de ponta ficou curto

O programa prevê um incentivo adicional para empresas que estão investindo em tecnologia de ponta, com possibilidade de abater até 12% do valor investido em áreas como propulsão, conectividade, big data e inteligência artificial, eletromobilidade.

Para Aldazábal, esse porcentual ainda é muito baixo para que as empresas assumam riscos de investir nessas áreas mais complexas, que exigem cifras maiores. “Esse plus para tecnologia de ponta ficou curso aqui no Brasil”. Ele reconhece, contudo, que o cenário não dava margem para ir muito além disso. “Começamos com algo interessante. É um programa inteligente para um momento econômico difícil”.

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