Em entrevista concedida no fim da última semana, quando encerrou sua visita ao Brasil, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, mostrou apoio ao ajuste fiscal que está sendo conduzido pelo Brasil, considerado necessário para restabelecer o crescimento da economia, ainda que exija sacrifício a curto prazo. “Você não pode ter o bolo e comê-lo ao mesmo tempo”, resume.
O governo anunciou um forte corte nos gastos, parte do programa de ajuste fiscal. Como promover o ajuste fiscal sem sacrificar os gastos sociais?
O que ouvi a presidente Dilma dizer foi o seguinte. Número 1: ajustes são necessários. Número 2: os ajustes não serão feitos de forma linear, serão especificamente identificados, orçamento por orçamento. É uma questão de decisão coletiva das autoridades sobre como implementar a responsabilidade fiscal e a disciplina fiscal necessárias para retomar o crescimento. Sei que vocês estão olhando para o lado negativo da medida e numa visão de curto prazo, mas o que se espera aqui é restaurar a confiança, identificar os objetivos da política que alcançarão esse efeito de confiança, que trará os investidores de volta ao Brasil e que será o fio condutor para o crescimento à frente. Esse tipo de mix de política nós apoiamos, e o que se busca é restaurar as condições para o crescimento num futuro não tão distante.
Pela pesquisa que fizemos, parece muito claro que a desigualdade excessiva não conduz ao crescimento sustentável. Se o objetivo é restaurar o crescimento, de forma sustentável, é preciso haver menos desigualdade.
No que diz respeito ao baixo crescimento, o Brasil é um país conhecido pela sua enorme desigualdade. A má distribuição de renda pode dificultar o crescimento econômico e deixar o país preso na armadilha de renda média?
Já publicamos várias pesquisas sobre a relação entre a desigualdade excessiva e o crescimento sustentável. Pela pesquisa que fizemos, parece muito claro que a desigualdade excessiva não conduz ao crescimento sustentável. Se o objetivo é restaurar o crescimento, de forma sustentável, é preciso haver menos desigualdade. E eu gostaria de mencionar e deixar registrado que os programas contra a pobreza que estão sendo implementados nos estratos de renda mais baixa para reduzir a desigualdade são espetaculares. E espero que sejam mantidos.
A senhora se encontrou com mulheres empreendedoras no Complexo do Alemão. Qual é a importância de assegurar oportunidades às mulheres de baixa renda e também às demais mulheres para promover o crescimento inclusivo e sustentado?
O que vi no Complexo do Alemão foi extremamente impressionante nessa perspectiva. Acredito que um programa com foco na mulher tem muito mais chances de sucesso não apenas porque dá poder às mulheres e as coloca como “as guardiãs da bolsa”, como as primeiras beneficiárias dos recursos do Bolsa Família e de outras compensações. Elas são “as guardiãs da bolsa”, mas também são encorajadas a contribuir para a economia. Este é um aspecto dos programas sociais no Brasil que eu não conhecia tão bem. A combinação de treinamento, instrução e o microcrédito que recebem é algo extremamente impressionante. Acho que é realmente uma base sólida para ajudar as mulheres a manter o curso de uma trajetória com mais poder econômico.
A senhora está no FMI há quatro anos. Como vê a economia mundial hoje e em 2011?
A economia global está hoje certamente em uma situação mais estável do que estava em 2011. Depois da crise financeira, houve a recessão, e depois a crise da dívida na Europa. Os problemas estão resolvidos? Não. Fizemos progresso? Sim. O Brasil está enfrentando uma contração do crescimento que, esperamos, será completamente revertido no próximo ano se as medidas forem implementadas adequadamente.
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