Misto de loteria e parcelamentos extensos, o consórcio caiu no gosto do brasileiro. O número de clientes cresceu quase 10% em fevereiro na comparação com o mesmo mês de 2013 e chegou a 5,82 milhões, segundo a Associação Brasileira de Administradoras de Consórcios (Abac). Com a expansão, aumentaram também as reclamações. O Banco Central (BC), que fiscaliza o setor, recebeu 419 denúncias em fevereiro de 2014, contra 257 registradas no mesmo período do ano passado.
Grande parte das queixas vem da desinformação. Nem todo mundo que entra em um consórcio se preocupa em conhecer a fundo as regras do jogo. O consórcio é uma associação complexa, gerida por empresas que cobram taxas variadas e têm regras rígidas para coibir inadimplência. O conflito ajuda a entender porque 59% das mais de 2,3 mil reclamações ao BC de março de 2013 a fevereiro de 2014 foram consideradas improcedentes, quando empresas comprovam que não erraram. Outras 25% não tiveram conclusão por falta de provas.
É comum, por exemplo, que o cliente se considere sortudo quando é contemplado rapidamente. Pode ser, desde que o cotista esteja pronto para entregar garantias que vão de fiador a tempo mínimo de serviço. A gerente jurídica da Abac, Elaine da Silva Gomes, diz que a situação depende do saldo devedor, e quem é contemplado logo tem uma dívida grande pela frente. "Não existe isso de pagar duas parcelas e conseguir na mesma hora uma casa para morar. O perfil ideal do consorciado é de alguém que pode esperar e pode pagar as parcelas".
Mesmo que o contrato tenha essas condições expressas como deve ser , entraves para liberar o crédito são o principal problema. Nos últimos 12 meses, 43% das reclamações procedentes ao BC eram sobre isso. Vale lembrar que a estatística cobre apenas as 194 administradoras hoje autorizadas pelo órgão.
As autorizadas são as únicas empresas a receberem fiscalização, como prestações de contas e auditorias. Mas o mercado é mais amplo: reúne representantes (que vendem cotas para as administradoras) e gestoras que atuam por liminar que pode ser revertida pela Justiça. Por fora, há golpistas que fazem alusão a consórcio para vender participação em pirâmides, por exemplo.
A supervisora da área de assuntos financeiros do Procon-SP, Renata Reis, explica que vendas enganosas procuram descaracterizar a forma como consórcios funcionam oferecendo vantagens no acesso ao crédito ou na contemplação, que só devem ocorrer por lance ou sorteio. Renata recomenda desconfiar de vendedores que citam, por exemplo, fórmulas infalíveis para calcular entrada ou lance que levariam à contemplação. "Qualquer garantia deve ser denunciada ao consórcio e a órgãos de defesa do consumidor".
Oferta
Negócio com cota contemplada divide opiniões
Basta olhar qualquer site de anúncios gratuitos e lá estarão as ofertas de cartas contempladas. A ideia é que o comprador leve uma cota já sorteada em consórcio para dispor do crédito assim que der as garantias à administradora. Apenas no site OLX, estão publicados cerca de 950 anúncios no Paraná. Ainda que seja comum, essa negociação divide opiniões.
Renata Reis, do Procon-SP, explica que o consórcio permite a transferência de cotas, mas avalia que isso não está definido na lei como negócio. "A venda de crédito de um sorteio não retirado é uma situação difícil de imaginar", opina. "Existe um prazo para retirar esse crédito. Caso contrário, ele precisa voltar ao grupo. Então, como comercializar um crédito ainda não disponível no mercado?", questiona. Por isso, ela aconselha consumidores a evitar intermediadores e a nunca confiar apenas na palavra do cotista.
Elaine Gomes, da Abac, sustenta que a venda é possível. Ressalta, porém, que precisa estar cercada de cuidados. O principal: apenas cotistas podem vender cotas, e não a administradora. Mas a empresa precisa endossar a transferência. "O negócio tem que ser fechado na administradora porque uma série de informações precisam ser checadas, como a validade do crédito ou se existe inadimplência", diz.
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