No fim de junho, o tecnólogo Gerson Rikio Umezaki foi ao Wal Mart da Avenida das Torres, em Curitiba, decidido a comprar um novo aparelho de tevê para a família. Chegou perto de levar o produto para casa, mas não conseguiu passar do caixa do hipermercado. "Parte do pagamento eu ia fazer em dinheiro, e outra parte em cheque à vista, porque necessitava resgatar o dinheiro de uma aplicação. Após eu já estar efetuando a transação, inclusive com o cheque preenchido, me comunicaram que eu só poderia retirar o aparelho depois da compensação do cheque", conta.
Os estabelecimentos comerciais não são proibidos de criar restrições a vendas com cheques ou cartões, mas têm de informar o consumidor de forma clara sobre as formas de pagamento que não aceitam. Umezaki reclama que não havia qualquer sinalização de critérios especiais de entrega para produtos pagos em cheque. "Não há placas lá avisando o consumidor que o procedimento é este. Se a loja não confia no meu pagamento via cheque, por que eu deveria confiar que a loja iria me entregar o aparelho? Eu não soneguei informações, nem fiz restrição à consulta de meu crédito. Mas quando eu pedi uma cópia da norma interna que rege esta restrição, não me deram", reclama. Ele desistiu da compra no supermercado.
O Wal Mart, em nota enviada por e-mail, alega que o episódio ocorrido com o Umezaki consiste em um fato isolado, alheio à rotina operacional da empresa. Se quisesse, a rede até poderia se negar a aceitar o meio de pagamento. Por lei, segundo o Banco Central, o dinheiro é o único meio de pagamento de aceitação obrigatória. Aceitar cheques, cartões de débito e crédito e vales alimentação e refeição é uma opção do comerciante. A loja pode exigir, por exemplo, que o cheque não seja de uma conta aberta recentemente.
O que não pode acontecer é que a restrição, normalmente utilizada como forma de se proteger de golpistas, se torne um constrangimento para os clientes. Se há restrição ou critério especial de venda, ele deve ser sinalizado de maneira clara, antes do ato da compra. "O direito à informação é assegurado pelo Código de Defesa do Consumidor. A restrição tem de ser informada de maneira ostensiva, como placas ou cartazes no interior da loja. Se não há sinalização, o comerciante não pode recusar aquele meio de pagamento à vista. Ele também não pode fazer distinção entre um ou outro produto. Se não entrega a tevê na hora, também só deveria entregar alimentos quando o cheque fosse compensado", explica a advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Mariana Ferreira Alves.
A professora Ivanise Tratz Martins, especialista em Direito do Consumidor das Faculdades Integradas Curitiba, conta que atendeu a casos de pessoas que abasteceram o carro e só na hora de pagar ficaram sabendo que o posto de combustível não aceitava cheque. "Fizeram um motorista deixar o carro no posto, só entregando quando ele voltou com o dinheiro. O constrangimento sofrido em uma situação como esta é um dano moral", destaca. Ivanise entende que a natureza do cheque é de pagamento à vista, portanto o mais natural é que o consumidor imagine que vai levar o produto para casa no ato da compra. Para a especialista, mais que optar por deixar de fazer compras no local onde houve confusão, o consumidor não pode deixar de reclamar. "E tem de reclamar, de preferência, na hora da compra e na frente de outros consumidores. Se eles levam o cliente para conversar em um escritório, dificilmente resolverão o problema. A gente passa vergonha, costuma ser uma situação desagradável mas, se todos fizerem, as empresas vão começar a tratar os clientes de outra forma", recomenda.