No último dia 30 de junho, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o Banco do Brasil (BB) deve pagar indenização a um cliente que teve retido o salário depositado em sua conta para pagamento de dívida de cheque especial. O banco alegava ter exercido direito reconhecido em contrato e não haver ilegalidade na retenção, mas o STJ respondeu que a remuneração tem caráter alimentar, o que a torna imune a dedução, e que a apropriação do salário pelo banco é ilícita e dá margem a reparação por dano moral. O BB não quis comentar a decisão judicial.
Não é raro encontrar pessoas que têm parte do salário imediatamente "corroída" quando entra na conta. Foi isso o que aconteceu com a jornalista Maria Tereza Boccardi, na época em que era free-lancer do jornal O Globo e recebia o pagamento em sua conta corrente. "A remuneração oscilava muito, um mês vinha R$ 100, no outro R$ 200. Por isso usei o cheque especial para compensar, o que virou uma bola de neve", conta. Maria Tereza lembra que em alguns meses os recursos que recebia pelo trabalho não eram suficientes para cobrir os débitos no banco. "Fiquei refém do banco, por incompetência minha em administrar os recursos e pela voracidade do banco", lamenta.
Para especialistas, o salário é protegido pela Constituição e não pode ser apropriado pelo banco antes do cliente ter acesso. "Os banqueiros e seus executivos só respeitam o que lhes interessa e exercem enorme pressão nas decisões do Banco Central (BC). São como lobos que legislam pela própria alcatéia", ataca o presidente da Associação Nacional de Defesa dos Consumidores do Sistema Financeiro (Andif), Donizete Piton. "Existe uma resolução do BC que transforma a conta salário em conta corrente quando há movimentações nela, e é por isso que os bancos põem o salário no cheque especial. Mas as resoluções do BC não estão acima da Constituição."
A lei diz que o salário deve ser capaz de atender às necessidades vitais básicas do trabalhador e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social. "Existe a obrigação do mutuário de pagar seus débitos, mas também existe o direito de dever para suprir as necessidades", opina o economista e especialista em direito empresarial, Ruy Orlando Mereniuk.
Para Mereniuk, a única saída para o cliente de banco cujo salário serve para pagar o empréstimo do cheque especial é procurar a Justiça. "As pessoas podem procurar a defensoria pública ou os escritórios-modelo que as faculdades de Direito, que são serviços gratuitos", orienta. O presidente do Acif, Donizete Piton, dá o mesmo conselho, com uma dica. "Lamentavelmente, o cliente tem que entrar na Justiça, ou abrir uma outra conta só para receber o salário", finaliza.
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