Imagine o torcedor da seleção brasileira acompanhando o Mundial da Alemanha via rádio. Isso mesmo, rádio. Acostumado a ver as jogadas de Ronaldinho Gaúcho por todos os ângulos o torcedor pode não saber, mas há algum tempo as pessoas tinham que construir os lances com a própria imaginação, baseados no que ouviam pelo rádio.
Quem conta esta história da cobertura dos mundiais é o radialista Pedro Culpi, de 66 anos. Pedrinho Culpi, como é conhecido, apresenta o programa sobre cultura italiana "Revivere gl' Italia", na Rádio Colombo, há 19 anos. Com uma memória louvável, o radialista volta ao ano de 1947 quando, ainda garoto, despertou a paixão pelo futebol.
Naquela época, o bairro de Santa Felicidade, em Curitiba, era ainda uma região rural onde os descendentes italianos produziam as verduras consumidas no centro da cidade. Os times locais, Iguaçu e Trieste, faziam o clássico do futebol amador, que levava toda "italianada" aos jogos. O primeiro contato de Pedrinho com a cobertura esportiva foi por meio de um rádio comprado no final de 1946. Mas se ele já ficava de ouvidos grudados nos jogos da suburbana, imagine com as partidas da Copa do Mundo.
O rádio era uma caixa enorme movido à força de um acumulador uma espécie de bateria tamanho extragrande que precisava ser carregada de tempos em tempos. "Era um martírio quando tinha jogo e acabava a bateria. Corríamos fazer a recarga na família Vendramin", lembra Pedro. A "bateria" suportava de doze a quinze dias, mas a fila de espera do seu Vendramin era de pelo menos dois dias. Ou seja, se a carga acabasse no meio do jogo, paciência para saber o resultado.
Foi com esta tecnologia que o jovem Pedrinho acompanhou sua primeira Copa do Mundo. E logo o Mundial de 1950, no Brasil. Os jogos ocorriam em horário nobre, às 15h30, e reuniam os torcedores para "assistir" ao jogo no rádio.
Naquele mundial, na voz de Antonio Cordeiro e Jorge Curi, da Rádio Nacional, Pedrinho presenciou o que chama de "a maior tristeza como um todo". "Eu tinha nove anos e não acreditava, saí de casa chorando, mas voltei para ouvir no rádio se era verdade". A derrota do Brasil para o Uruguai naquele mundial parou o país. "Naquele dia não teve baile, nem missa. Ninguém queria saber de mais nada", lamenta.
Em 1954, na Suíça, Pedro acompanhava o incrível time da Hungria pela revista popular "Paraná Esportivo", publicada a cada dois dias."Eu Via as fotos na revista e revia todo o jogo que tinha ouvido no rádio", conta. Foi também nas revistas de esporte que Pedrinho se interessou por um distante país chamado Suécia, na Copa 58. Enquanto a seleção brasileira batalhava na Copa, os jogos locais não pararam. No dia em que se enfrentaram Brasil e Rússia, jogaram pela suburbana Iguaçu e Poti. Santa Felicidade lotou o estádio e acompanhou os dois jogos: assistiam à suburbana, mas ouviam o Mundial por um sistema de som montado no estádio. "Até os jogadores vinham pedir para a torcida como estava a partida da seleção", conta.
Na campanha do bicampeonato, em 1962, Pedro já pôde ouvir o mundial por meio de um rádio mais moderno, à luz elétrica. Os torcedores se reuniam na Vila Passaúna, em frente a casa da família Lugarine para "assistir" ao mundial. Nos cinemas, a Copa em movimentos nos flashes dos jornais, antes dos filmes. Em 1966, na Copa da Inglaterra, cresceu a mania de ver os lances do mundial no cinema, talvez um prenúncio de o que viria em matéria de cobertura no mundial seguinte.
Uma caixinha luminosa entra em campoA "Melhor de todas as Copas", a do México 70, pôde finalmente ser "assistida" no real sentido da palavra pelos brasileiros. Pedrinho comprou uma TV de segunda mão para ver a Copa com uma imagem meia-boca, mas de ótimo som. Na final contra a Itália, disse aos amigos: "De qualquer forma hoje vai ter festa em Santa Felicidade". Para muitos, ver a seleção canarinho surrar a Azzurra não teve a menor graça, mas ainda assim teve festa, com direito a uma réplica de três metros da Taça Jules Rimet, feita em vime, que desfilou pelo centro de Curitiba.
A explosão de cores na caixa luminosa surgiu no mundial seguinte. Com a Copa do Mundo de 1974, o Brasil adotou o sistema alemão PAL-M, um ano antes, para acompanhar o mundial. Pedro trabalhava no Pronto Atendimento do Hospital de Clínicas, e pôde ver na TV mais próxima o laranja reluzente de um certo carrossel holandês. Na Argentina 78, pela primeira vez uma equipe paranaense cobria o mundial. Mas foi uma Copa sem vibração, segundo o torcedor Pedro. "Na disputa do terceiro-lugar entre o Brasil e a Azzurra, lamentamos mais pela decepção dos dois países", conta.
Em 1982 iniciou a mania de colecionar fotos das seleções. As revistas esportivas faziam edições especiais com fotos dos times e vendiam a preço de ouro. Todo mundo queria ter o seu. Quatro anos depois, no México 86, Maradona teve a força da mídia para realçar seu valor. Era a Copa de Maradona, e como faz nos dias de hoje, a mídia elevou o jogador à categoria de herói. Um incentivo a mais para acompanhar os jogos da Copa.
De volta ao rádioPedrinho Culpi começa seu programa sobre a cultura italiana na Rádio Colombo, em 1987. Como a Copa 90 aconteceu na Itália, o programa foi a grande coqueluche da colônia de Santa Felicidade. "A participação era grande, muitos ouvintes ligavam para dar palpite". De acordo com ele, a cobertura jornalística foi a melhor até então, mas o futebol deixou a desejar.
A participação dos ouvintes foi ainda maior quando Brasil Itália se reencontraram na final da Copa do Mundo de 1994. "Maledetti i rigatori" ("Malditos os pênaltis"), dizia a imprensa italiana. No bolão do programa de Pedro, um torcedor sugeriu o placar em 0 a 0 com os dois times dando a volta olímpica. Até seria assim, não fossem os pênaltis e os pés de Roberto Baggio.
Tecnologia a todo vaporA cobertura online teve inicio na Copa do Mundo de 1998, mas marcou mesmo no Mundial de 2002. Na Alemanha, a internet continuará como destaque, cobrindo os jogos transmitidos em pleno horário de expediente. Mas os torcedores contarão com uma outra ferramenta para acompanhar a Copa: o celular.
O gerente comercial Danilo de Medeiros Guerra, 30 anos, é exemplo de consumidor voraz das informações da Copa. Além das notícias, Danilo baixa imagens e sons no aparelho. "Na final da Liga dos Campeões, assistimos o jogo ao vivo pela telinha do celular", disse. Na Copa do Mundo, Danilo fará o mesmo. No trabalho o celular ficará ligado nos jogos do mundial. E nada de ligarem para ele.
Além do celular, a tecnologia da Copa chegou ao computador. Um novo apetrecho chamado PCTV permite que o usuário assista aos jogos que passam na TV, na tela do computador. O torcedor poderá ainda gravar os jogos e editar os melhores momentos para assitir mais tarde.
E se o mundial de 74 foi a desculpa para trazer a televisão colorida ao Brasil, novamente na Alemanha, a Copa do Mundo será um laboratório de testes para o modelo de TV digital no Brasil. Alguns privilegiados poderão acompanhar os jogos da seleção pelo novo modelo, que será implantado nos próximos anos.
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