O aumento das remessas de lucros e dividendos em junho surpreendeu o Banco Central e levou o Brasil a registrar o pior resultado nas contas externas para o mês e para o semestre desde 1947. A deterioração no comércio exterior e o aumento das viagens de brasileiros para fora também pesaram para que as transações correntes do país com o exterior registrassem um déficit de US$ 5,2 bilhões no mês passado e de US$ 23,8 bilhões no semestre, o triplo do obtido no mesmo período do ano passado. Além disso, a queda no investimento estrangeiro direto (IED) fez com que o Brasil passasse a depender mais de capital volátil, como o dinheiro investido na bolsa, para financiar o rombo na conta com o exterior.No saldo de junho, quase 80% do déficit se refere a remessas de lucros de empresas ou de investimentos no mercado financeiro. Esse movimento pode ser explicado pelo bom desempenho da economia brasileira em relação a outros países. Como lucraram mais aqui, as empresas enviaram mais recursos para ajudar as matrizes, em países mais afetados pela crise econômica global sobretudo na Europa. As empresas que mais enviaram recursos foram as de veículos, química e energia.
Para o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, o movimento deve prosseguir até a recuperação da economia europeia. "Em algum momento, essas empresas terão de voltar a ampliar os negócios aqui, mas é preciso que a situação melhore lá fora." A saída recorde preocupa ainda por refletir queda de 40% no saldo comercial e aumento de 100% de viagens.
Financiamento
Outro problema é o financiamento desse déficit, que precisa ser coberto pelos investimentos estrangeiros. O investimento direto em empresas atingiu o pior resultado para meses de junho em sete anos. No semestre, foram US$ 12 bilhões, menos de um terço da meta do BC para 2010 (US$ 38 bilhões). Houve ainda saída de investimento pelo pagamento de empréstimos a matrizes.
O valor não cobre o déficit semestral de US$ 23,8 bilhões nas transações correntes, que triplicou em relação a 2009. Isso torna o país mais dependente dos investimentos em ações e títulos públicos, que chegaram a US$ 19 bilhões no semestre. A previsão do BC é fechar 2010 com resultado negativo recorde de US$ 49 bilhões.
Para julho, a instituição espera deficit de US$ 3,7 bilhões, o que faria o resultado em sete meses superar 2009 inteiro. Já o saldo acumulado em 12 meses equivale a 2,1% do PIB o pior valor nos oito anos de governo Lula.
Fluxo permanece no vermelho em julho
O fluxo cambial, entrada e saída de moeda estrangeira no país, estava negativo em US$ 2,93 bilhões entre os dias 1.º e 22 de julho, informou ontem o Banco Central (BC). O resultado foi influenciado, sobretudo, pela conta financeira, por onde passam os investimentos estrangeiros diretos, que registrou déficit de US$ 1,73 bilhão no período. As compras somaram US$ 19,07 bilhões e as vendas, US$ 20,8 bilhões. De acordo com o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, isso ocorre em decorrência das remessas de lucros e dividendos feitas a partir do Brasil.
Balança
A balança comercial brasileira registrou, na quarta semana de julho, um superávit de US$ 148 milhões, com exportações de US$ 4 bilhões e importações de US$ 3,85 bilhões. No mês, há um saldo positivo de US$ 1,49 bilhão. As vendas externas, de US$ 13,88 bilhões, aumentaram 32,8% em relação ao mesmo período de 2009 e apenas 0,3% ante junho deste ano. Os gastos no exterior, de US$ 12,39 bilhões, subiram 49,3% frente a julho do ano passado e 3,3% em comparação ao mês anterior. No ano, a balança acumula um superávit de US$ 9,364 bilhões.
Favorecidas pelo real valorizado ante o dólar e pelo aquecimento do mercado interno, as importações vêm crescendo a taxas maiores do que as exportações. Tendo julho do ano passado como base de comparação, as compras externas de produtos siderúrgicos aumentaram 127,5%; de borracha e obras, 93,7%; aparelhos eletroeletrônicos, 66,9%; equipamentos mecânicos, 54,8%; combustíveis e lubrificantes, 51%; automóveis e partes, 49,6%; e plásticos e obras, 44,7%.