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Rentabilidade acumulada dos saldos do FGTS superou IPCA entre 2017 e 2022.
Rentabilidade acumulada dos saldos do FGTS superou IPCA entre 2017 e 2022.| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Após mais de dez anos, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu na terça-feira (12) o julgamento de uma ação que pedia que fosse alterado o índice de correção dos saldos das contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Os ministros decidiram que o rendimento anual dos valores dos trabalhadores não poderá ser menor do que a inflação aferida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no período.

A mudança, na prática, é sutil, e quem tem conta do fundo deve se beneficiar da decisão apenas ocasionalmente. Isso porque o atual modelo de correção, equivalente à Taxa Referencial (TR) mais 3% ao ano, será mantido. A diferença é que a distribuição de resultados do fundo, que já é feita anualmente desde 2017, passará a ser contabilizada como rendimento do saldo do cotista, o que não ocorria até agora.

Somente quando a remuneração total no ano – incluindo a distribuição de lucros – for inferior à variação pelo IPCA, é que o Conselho Curador do FGTS terá de estabelecer uma forma de compensação de modo a garantir a reposição da inflação.

Segundo dados da Caixa Econômica Federal, agente operador do FGTS, a rentabilidade acumulada dos saldos do FGTS entre 2017 e 2022, considerando a distribuição de lucros, foi de 49,83% – acima dos 44,11% do IPCA no mesmo período.

Desde o início da distribuição de resultados do FGTS, a variação dos saldos no fundo foi inferior ao índice de preços apenas em 2021, quando a inflação chegou a 10,06% em razão da crise econômica provocada pela pandemia de Covid-19.

Pela decisão tomada pela maioria dos ministros do STF, não haverá compensação retroativa. A nova fórmula de cálculo de rendimento dos saldos passará a valer a partir da publicação do acórdão do julgamento, o que pode ocorrer já nesta quinta-feira (13).

Cerca de 132 milhões de pessoas têm conta vinculada ao FGTS

O resultado do FGTS que é distribuído aos cotistas consiste na diferença entre as receitas (rendas/rendimentos com operações de crédito, com títulos públicos federais e demais títulos e valores mobiliários, entre outras) e as despesas (remuneração das contas vinculadas com a TR + 3% ao ano, taxa de administração e outras).

O valor é creditado uma vez por ano até o mês de agosto e calculado de forma proporcional ao saldo de cada conta no dia 31 de dezembro do ano anterior. 

Em 2017 e 2018, foram distribuídos 50% dos resultados auferidos no ano anterior; em 2019, base 2018, foi distribuído 100% do resultado; em 2020 e 2021, o Conselho Curador do FGTS deliberou pela distribuição de R$ 7,5 bilhões e R$ 8,1 bilhões, respectivamente. Em 2022 e 2023, o valor repassado correspondeu a 99% dos lucros do fundo.

Segundo a Caixa, ao fim de 2022 havia 217,7 milhões de contas ativas do FGTS, pertencentes a cerca de 132 milhões de pessoas – um indivíduo pode ter mais de uma conta, que é aberta a cada novo emprego com carteira assinada.

O FGTS foi criado em 1966 para substituir a garantia de estabilidade no emprego e funciona como uma poupança compulsória e proteção financeira em caso de desemprego. Depósitos mensais são feitos pelo empregador em montante equivalente a 8% do salário do trabalhador. 

Os valores, no entanto, ficam retidos e só podem ser sacados integralmente em casos específicos, como demissão sem justa causa, aposentadoria, falecimento, quadro de neoplasia, HIV, situações de calamidade pública, ou se a conta não receber novo depósito por três anos ininterruptos.

Desde 2019, também é possível sacar parte do saldo, uma vez por ano, caso o cotista tenha optado pela sistemática do saque-aniversário. Outra situação em que o saldo pode ser utilizado é na aquisição de casa própria, liquidação ou amortização de dívida ou pagamento de parte das prestações de financiamento habitacional.

Julgamento da correção do FGTS se arrastou por dez anos no STF

A discussão no STF sobre uma eventual mudança no índice de correção dos saldos do FGTS foi provocada pelo partido Solidariedade, que, em fevereiro de 2014, protocolou a petição inicial da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.090. Na peça, a legenda questionou o uso da TR, que chegou a ficar zerada por quatro anos, como fator de reajuste das contas dos trabalhadores. 

Um estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) anexado ao processo mostrava perdas de 48,3% nas contas do FGTS em relação à inflação apenas até 2013. A ação pedia a utilização de um indicador inflacionário, como o IPCA ou o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), para correção mensal dos valores, além de indenização corerspondente à diferença retroativa. 

O Instituto Fundo de Garantia do Trabalhador (IFGT), entidade criada para prestar assessoria a trabalhadores interessados em requerer indenização por perdas com o fundo, estima em R$ 804 bilhões a diferença total dos saldos caso tivesse sido utilizado o INPC como indicador de reajuste desde 1999. 

No julgamento, todos os ministros do STF votaram por negar a inconstitucionalidade do uso da TR, mas houve divergência em relação à mudança na fórmula de correção. 

Relator do caso e presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, defendeu que a remuneração do FGTS não poderia ser inferior ao rendimento da caderneta de poupança, que rende o equivalente à taxa referencial (TR), mais 6,17% ao ano. Ele votou ainda para que o novo modelo de reajuste entrasse em vigor a partir de 2025 e não retroagisse. O entendimento foi seguido pelos ministros André Mendonça, Nunes Marques e Edson Fachin.

Ao apresentar o voto-vista, Zanin abriu divergência e votou pela manutenção do cálculo atual, já que, para ele, não caberia ao Judiciário afastar o critério de correção monetária escolhido pelo legislador com base em razões de ordem econômica. Os ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes acompanharam Zanin. 

Prevaleceu o voto médio de Flávio Dino, seguido por Luiz Fux e a Cármen Lúcia, necessário em razão da existência de três diferentes correntes de votos. Dino sugeriu respeitar acordo apresentado pela Advocacia-Geral da União (AGU) com as centrais sindicais, assegurando um piso na remuneração. 

O ministro argumentou ainda que uma mudança maior no fator de correção encareceria linhas de crédito para financiamento habitacional, o que prejudicaria trabalhadores mais pobres. 

Pelo acordo mencionado por Dino, o governo fará em 2024 uma distribuição extraordinária de lucros do FGTS entre os trabalhadores, adicional ao repasse já feito anualmente.

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