Apesar de enfrentar sucessivas greves e ter problemas de gestão, o futuro processo de privatização dos Correios não dará vazio, ao contrário. Segundo o ministro das Comunicações, Fábio Faria (PSD-RN), há cinco grandes empresas interessadas em comprar a estatal, entre elas a brasileira Magazine Luiza (Magalu), a alemã DHL e as americanas Amazon e FedEx. A quinta – não mencionada pelo ministro – seria outra americana, a UPS, que já teria manifestado interesse no início do ano.
As interessadas até aqui na estatal brasileira se dividem em dois grupos: grandes operadores logísticos e grandes varejistas. A UPS é uma das maiores empresas de logística do mundo. Fundada nos Estados Unidos, tem mais de cem anos e está presente em mais de 220 países, com 495 mil funcionários. No Brasil, atua desde importação e exportação a envio de documentos, amostras e remessas.
Outra empresa americana na lista e dentro do grupo de operadores logísticos é a FedEx (Federal Express Corporation). Maior empresa de transporte expresso do mundo, tem quase cinquenta anos de mercado, frota de mais de 600 aviões e mais de 75 mil veículos. São 280 mil funcionários atuando em mais de 220 países, incluindo o Brasil. Por aqui, está há 30 anos, fornecendo serviços de logística e transporte para mais de 5 mil municípios.
A terceira operadora logística interessada na compra dos Correios é a DHL, que pertence ao grupo alemão Deutsche Post DHL. Considerada a principal empresa de logística do mundo, a companhia foi fundada em 1969 pelos americanos Adrian Dalsey, Larry Hillblom e Robert Lynn. De lá para cá, seus serviços também chegaram a mais de 220 países do mundo. São 380 mil funcionários e 1,588 bilhão de encomendas entregues por ano. No Brasil está há 42 anos, com soluções de armazenagem, transporte e distribuição.
Magalu e Amazon integram os grupos das grandes varejistas interessadas nos Correios. A Amazon é a gigante americana do e-commerce, fundada por Jeff Bezos em 1994. Está entre as cinco maiores empresas de tecnologia do mundo. Entrou no Brasil vendendo apenas livros digitais e seu leitor de e-books, o Kindle, e agora já conta com um marketplace com 30 milhões de produtos em mais de 30 categorias e cinco centros de distribuição para dar conta das entregas.
A única companhia brasileira na lista é o Maganize Luiza, que adotou o apelido "Magalu". Criada na década de 1970, no interior de São Paulo, como uma pequena loja de bens duráveis voltada para a classe média, a empresa se tornou uma das maiores varejistas do Brasil, virando referência em tecnologia e logística para o varejo no país. Tem 17 centros de distribuição, mais de 1.150 lojas distribuídas em 18 estados e um marketplace com 32 mil vendedores diferentes.
Por que os Correios são tão atraentes
A capilaridade da estatal é o seu principal atrativo, afirmam consultores ouvidos pela Gazeta do Povo. Os Correios estão presentes em 5.556 municípios brasileiros, o que corresponde a 99,75% do total. Eles entregam, diariamente, mais de 21,7 milhões de objetos postais, sendo 18,5 milhões de cartas, 1,3 milhão de encomendas e 1,9 milhão de outros objetos.
Eram 99,5 mil funcionários ao fim de 2019, dos quais 53,5 mil carteiros. A estatal tem uma frota de 23,4 mil veículos próprios, 10 linhas aéreas e capacidade de tratar 26 milhões de objetos por dia em suas mais de 40 unidades de tratamento. Tem ainda 11,1 mil agências espalhadas pelo país.
“Os Correios são um dos poucos que chegam em qualquer parte do país: do interior do Nordeste até a cidadezinha no interior de Roraima”, diz Ana Paula Tozzi, CEO da AGR Consultores. Ela conta que os Correios são a única alternativa de entrega a um preço justo a lugares distantes, sendo utilizados inclusive por grandes varejistas, como Magalu e B2W (Americanas.com, Submarino e Shoptime).
“Grandes e-commerces têm uma doca, um espaço físico dos Correios dentro dos seus centros de distribuição para que os Correios façam a entrega nesses lugares distantes, tamanha a expertise dos Correios em logística”, completa. “Somente os Correios conseguem oferecer um equilíbrio de preço. Isso quer dizer entregar por um preço justo desde lugares viáveis, como grandes centros urbanos, a até alguns quilômetros da capital de Roraima”, conclui.
Marco Quintarelli, consultor em varejo, acrescenta que, mesmo instalados no país há anos, os operadores logísticos DHL, UPS e FedEx estão de olho nesse conhecimento logístico que os Correios têm, conseguindo atender um país com dimensões continentais em pouco tempo e a preço baixo.
As varejistas, por sua vez, querem comprar os Correios porque ainda estão estruturando suas operações logísticas, hoje muito mais restritas aos grandes centros.
“Cada vez mais essas empresas de venda on-line estão procurando estrutura de logística que possa atender e entregar rápido em todo o país. Durante a pandemia, isso ficou ainda mais claro. Teve empresas que atrasaram a entrega porque dependiam dos Correios [que ficaram em greve e com o serviço limitado]. Elas viram que faz cada vez mais sentido esse investimento da logística de entrega para poder atender o cliente primeiro”, diz Cantarelli.
O consultor defende, porém, que a privatização dos Correios seja feita com cuidado, para que o consumidor não seja prejudicado com uma empresa privada comprando a estatal e depois cobrando mais caro para regiões distantes.
“O grande desafio do governo nessa privatização vai ser o controle de preço. Imagina mandar daqui [Rio de Janeiro] para o Amazonas. Se não houver acompanhamento de preço, quem comprar os Correios vai colocar o preço lá em cima. O governo vai ter que atuar para prevenir isso.”
O governo prepara um projeto de lei para quebrar o monopólio dos Correios no setor postal. Esse mesmo projeto – que acaba de chegar à Casa Civil da Presidência, última etapa antes do envio ao Congresso – também vai propor um marco legal, contendo as regras de como funcionará o setor após o fim do monopólio público.
Segundo informações preliminares do governo, a nova legislação vai permitir, via concessão pública, a prestação do serviço postal por agentes privados, desde que respeitadas normas de universalidade e outras regras. A decisão final caberá ao Congresso, que vai apreciar o projeto.
Os detalhes da venda dos Correios, porém, ainda não são conhecidos. Não se sabe se a estatal será vendida por partes, por inteiro ou se serão feitas parcerias público-privadas. Um consórcio liderado pela consultoria Accenture foi contratado pelo BNDES para estudar a formatação da privatização. As propostas serão entregues ao governo em novembro, que pode acatar as sugestões ou não. A promessa é privatizar a estatal até 2022.
Os consultores consultados pela Gazeta do Povo elogiaram o modelo alemão de privatização do setor postal. Primeiro, a Alemanha vendeu o controle acionário do Deutsche Bundespost. Quase uma década depois, foi quebrado o monopólio do serviço, abrindo o mercado para players privados. Ainda assim, o governo manteve participação minoritária na companhia.
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