Anões do orçamento, gafanhotos, sanguessugas, vampiros, mensaleiros. Nos últimos anos, o brasileiro se acostumou a chamar pelos mais diversos apelidos os participantes de esquemas que, em comum, tinham um único objetivo, perseguido por governantes e empresários de má-fé desde os tempos coloniais: desviar dinheiro público. Muito mais difícil que lembrar de tantos escândalos é saber com exatidão o quanto as variadas espécies da fauna corrupta brasileira já arrancaram dos cofres dos governos estaduais, municipais e federal. Mas já existe uma estimativa sobre o que isso representa: segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), o brasileiro trabalha 46 dias por ano somente para bancar os custos da corrupção ou seja, mais ou menos um terço do tempo trabalhado para pagar impostos. Isso porque, de acordo com uma metodologia criada pelo IBPT, aproximadamente 32% de todos os recursos arrecadados são desviados.
Para onde vai todo esse dinheiro, que, pela Constituição, deveria ser usado pelo Estado para garantir o bem-estar da população e o desenvolvimento do país? "Do total desperdiçado, 41% é por desvio de finalidade, ou seja, quando se gasta dinheiro com nepotismo, funcionários fantasmas, edifícios que não são concluídos ou que ficam abandonados porque não se investiu em equipamentos e funcionários para aproveitá-los. Outros 34% se referem a obras e serviços superfaturados. E, em 25% dos casos de desperdício, o dinheiro é simplesmente subtraído pelo administrador", diz o tributarista curitibano Gilberto Luiz Amaral, presidente do instituto.
Para chegar a esse dado, o IBPT pesquisou informações relativas aos últimos 17 anos, veiculadas pela imprensa e publicadas nos sites de tribunais de contas e das diversas instâncias do Poder Judiciário. A partir daí, o instituto concluiu que, em 22.114 casos de desperdício de dinheiro público, foram desviados R$ 189 bilhões em termos nominais ou R$ 2,14 trilhão em valores atualizados.
Mas isso não é tudo, pois a estimativa do IBPT é de que apenas 38% do total desviado foi registrado pela imprensa ou detectado pelos órgãos responsáveis. Isso quer dizer que, desde 1990, R$ 5,63 trilhões foram simplesmente roubados ou mal aplicados pelo poder público.
No ano passado, por exemplo, teriam sido desviados R$ 234,5 bilhões do total de R$ 732,9 bilhões arrecadado por União, estados e municípios. Por dia os governos desperdiçaram R$ 642,5 milhões, o que corresponde a R$ 446,2 mil por minuto. Como o governo aumenta seus gastos todos os anos, precisa arrecadar ainda mais para cobri-los. Quem paga essa conta? De novo, os cidadãos e empresas que pagam seus impostos em dia e vão se acostumando a uma carga tributária que em 2005 atingiu 37,37% do Produto Interno Bruto (PIB).
"Se não houvesse esse desvio, a arrecadação poderia ter ficado em cerca de R$ 500 bilhões. Tirou-se do setor privado mais de R$ 230 bilhões, que gerariam emprego, desenvolvimento, crescimento do PIB", diz Gilberto Amaral.
Caio Marini, professor da Fundação Dom Cabral e pesquisador do Instituto Publix, aponta outro efeito da corrupção: "Independentemente do valor desperdiçado, a conseqüência mais danosa, e difícil de quantificar, é que ele faz com que a sociedade deixe de acreditar e se afaste cada vez mais do governo".
Cláudio Weber Abramo, diretor-executivo da ONG Transparência Brasil, aponta a necessidade de mudanças na própria legislação, que ao menos limitem a possibilidade de desperdício. "A nomeação de pessoas para cargos de confiança, por exemplo, é permitida por lei. E é uma grande fonte de corrupção, como bem mostrou o escândalo do mensalão. Para acabar com isso, é preciso mudar a Constituição, porque as nomeações dão ao governante o poder de lotear o Estado."
Para o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef-PR), Luiz Afonso Cerqueira, a sangria dos recursos públicos só vai diminuir quando o tamanho do Estado também ficar menor. "O Estado precisa abandonar uma série de atividades que não lhe competem, como transporte, estradas, ferrovias, portos e outros. O Estado teria, isso sim, de fiscalizar o empresário privado que vai investir nesses setores."
Impostômetro
550.000.000.000 foram pagos em impostos no Brasil desde o início do ano até a 1h30 de hoje.