A corrida das empresas de educação por uma alternativa privada de financiamento depois das restrições no programa de crédito do governo, o Fies, terá de ultrapassar barreiras como a inadimplência e a evasão escolar para decolar de fato no Brasil. Embora crescente o número de anúncios de parcerias e produtos, o risco de calotes e de abandono dos cursos pode limitar o apetite nesse segmento num momento em que bancos estão ainda mais rigorosos para emprestar.
Como as primeiras safras de crédito estudantil mal começaram a ser pagas, ainda não há informações consistentes sobre inadimplência. O que torna o segmento mais obscuro, na análise de especialistas. A garantia do Fies vem em parte de fiadores e também de um fundo com contribuição das empresas de educação. Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil são os agentes financeiros, mas não abrem detalhes, sob a justificativa de que a gestão do programa é do governo. O produto tem taxas de juros de 3,4% ao ano e prazo médio de 18 anos.
No ano passado, um relatório do Morgan Stanley estimava que os calotes no Fies podiam chegar a 27% em 2017, considerando atrasos acima de 365 dias. Segundo os analistas Javier Martinez de Olcoz Cerdan e Thiago Bortoluci, os calotes podem consumir o fundo garantidor.
Com as restrições no programa federal, o potencial de migração para o crédito privado é estimado em cerca de 500 mil contratos em 2015, o que é visto como uma porta de entrada de novos clientes para os bancos. Instituições de ensino acreditam que o Fies será reduzido a um terço do volume do ano passado: foram 732.243 novos contratos em 2014, enquanto os desembolsos alcançaram R$ 13,75 bilhões, segundo o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Em 2014, parcerias semelhantes com as que os bancos estão firmando com instituições de ensino foram fechadas com o setor varejista e não se provaram vantajosas. Há muitas variáveis negativas no crédito estudantil, de acordo com Daniel Mitraud, superintendente do Santander Universidades. Os riscos são consideráveis, já que se trata de um crédito de longo prazo e os clientes ainda não têm renda.
A diluição desse risco, diz Mitraud, só acontece com a participação das empresas de educação. Elas podem se responsabilizar por acompanhar a evasão, por exemplo, ou subsidiar os juros. “Para o banco entrar sozinho sem a parceria com a universidade, o produto fica quase inviável. Com universidades considerando composição da taxa, viabiliza o crédito.” Com 450 convênios, o Santander quer ampliar sua carteira de clientes universitários e estuda novas soluções de crédito.
Nas companhias de ensino, a discussão envolve o comprometimento ou não do balanço das empresas com a oferta de crédito. Até agora, a maioria dos grupos lançou programas em que os juros do parcelamento são bancados pela instituição de ensino, e não pelo aluno.
Conflito
Em teleconferência com analistas, a Kroton reconheceu que há um conflito de interesses entre os bancos e as instituições de ensino. “O interesse de um banco e de uma companhia de educação nem sempre é parecido, porque queremos trazer o aluno mesmo sem cobrança de juros, porque a margem operacional do aluno é positiva, mas o incentivo de um terceiro é olhar o risco do aluno”, disse o diretor financeiro da Kroton, Frederico Abreu.
João Carlos Gomes da Silva, diretor da área de empréstimos e financiamentos do Bradesco, descarta que haja conflito de interesses nas parcerias entre bancos e instituições de ensino. As faculdades buscam o maior número possível de matriculados para fazer frente às suas despesas fixas, e o banco quer o cliente do amanhã. “Não temos tido dificuldade e a procura por convênio é crescente”, disse. O Bradesco tem cerca de 50 convênios com instituições de ensino e espera que esse número cresça pelo menos 11% este ano. O banco estuda novas fontes de recursos como, por exemplo, junto a organismos globais. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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