A lentidão com que o mercado de trabalho passou a gerar vagas a partir do início da crise mexeu nas formas de contratação. Além de os salários para novos empregos estarem até 30% mais baixos do que no ano passado, aumentou a procura por funcionários que aceitem trabalhar como pessoa jurídica (PJ). Essa tendência foi sentida por profissionais do mercado e pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Paraná (SRTE/PR), e é um indicativo de que muitas empresas estão tentando evitar os custos de direitos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).A consultora de carreira da Chess Human Resources Michele Carvalho afirma que, desde o ano passado, dobrou a quantidade de empresas que estão priorizando a contratação de PJs hoje 16% dos clientes pedem esse tipo de relação trabalhista. "Isso não é coincidência. Como o mercado sofreu essa mexida recentemente, todo mundo está tentando reduzir seus encargos", diz.Na sua avaliação, essa condição do mercado não é necessariamente ruim porque ao mesmo tempo que traz riscos pode apresentar boas oportunidades profissionais. "Uma proposta como PJ pode ser atraente, só depende de um estudo criterioso."
Na Superintendência do Trabalho, a análise dessa tendência é menos otimista. "A nossa equipe percebe em vários locais e em todos os setores a atitude de demitir os funcionários para recontratar sem pagar encargos trabalhistas. Como a relação de subordinação em relação à empresa se mantém, é o mesmo que contratar um empregado sem respeitar seu direitos", relata o chefe da seção de relações de trabalho da SRTE/PR, Marcus Cardoso da Silva.Fiscalização
Os fiscais do trabalho têm a função de verificar se uma relação de emprego, que é regida pela CLT, foi transformada em um contrato entre duas pessoas jurídicas. Quando isso ocorre, o caso é enviado ao Ministério Público do Trabalho ou diretamente à Justiça do Trabalho.
Com o número maior de casos, a superintendência formou um grupo de trabalho para esse tipo de infração. Os resultados da pesquisa devem sair em um relatório dentro de dois meses, mas os resultados preliminares indicam que o fenômeno da terceirização indevida já se espalhou para todos os segmentos da economia. "Esse relatório vai ajudar a ter um panorama mais preciso das ocorrências no estado. Mas é fato que nos últimos tempos tem havido mais pressão para a terceirização como forma de contratação", diz.
Legalidade
A advogada trabalhista e previdenciária do Centro de Orientação Fiscal (Cenofisco) Andreia Antonacci relaciona o fenômeno ao maior número de pessoas procurando emprego por causa da crise, o que pode levar a abusos. "Apenas se caracteriza empregado autônomo aquele que exerce uma atividade profissional por conta própria, prestando serviços a terceiros sem relação de emprego", explica. Ou seja, um autônomo prevê inteira liberdade de ação, sem cumprimento de horário ou subordinação em relação à empresa contratante.
"Na prática, um trabalhador autônomo presta serviços esporádicos, ou atende a projetos. Devem ser sempre serviços limitados, que se possa enxergar o fim", explica. Portanto, na opinião dela, uma empresa não pode contratar serviços terceirizados dentro da sua atividade principal, aquela que é o seu objeto de lucro. "Terceirizar serviços de vigilância e limpeza é uma coisa, mas manter profissionais externos dentro da sua atividade-fim configura vínculo empregatício. Na Justiça, o empregado tem boas chances de reverter essa situação e ganhar uma indenização", afirma.