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Crise econômica afasta profissionais estrangeiros do mercado de trabalho

 | Marcelo Camargo/Agência Brasil
(Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

A recessão que castiga o mercado de trabalho e trava investimentos tem tirado oportunidades e desempregado uma mão de obra considerada importante por especialistas para o setor produtivo brasileiro aprimorar processos, incorporar novas tecnologias e aumentar a visibilidade do país no exterior.

Relatório do Ministério do Trabalho mostra que, no primeiro semestre de 2016, o número de autorizações concedidas a estrangeiros para trabalharem no Brasil teve uma queda de 21% em relação ao emitido no mesmo período do ano passado. Passou de 18.213 para 14.477 vistos nos primeiros seis meses de 2016. A queda se deu na mesma proporção do recuo registrado em 2015, primeiro ano da recessão, quando os vistos para trabalho somaram apenas 36.868, frente aos 46.740 emitidos no ano anterior.

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O número total de estrangeiros trabalhando no país, que vinha crescendo ano a ano desde o começo desta década, também já dá sinais de recuo, segundo levantamento da Associação Nacional de Estrangeiros e Imigrantes. No primeiro trimestre de 2016, 7.400 postos de trabalho eram ocupados por expatriados, 2.000 a menos do que no mesmo período do ano passado.

Só entre 2011 e 2013, por exemplo, o número de trabalhadores estrangeiros no mercado formal de trabalho brasileiro cresceu 50,9%, de acordo com o Ministério do Trabalho.

“A crise brasileira não poupa ninguém. Nem esses estrangeiros, que são bastante qualificados. Muitos perderam seus empregos porque a empresa estava em má situação financeira. A situação econômica do Brasil também diminui as chances de outros pedirem transferência. Esperamos que, quando a economia voltar a crescer, esse quadro se reverta. O Brasil nos últimos anos foi um campo atraente para estrangeiros dos ramos de petróleo, financeiro e da saúde”, conta o peruano Grover Calderón, presidente da associação de estrangeiros.

Profissionais sem filhos

De acordo com a sócia de Gestão de Pessoas da Ernst & Young, Raquel Teixeira, numa crise, quando a ordem é cortar despesas, pesa contra o estrangeiro em relação ao trabalhador brasileiro o alto custo que tem para a empresa.

“Um expatriado é caro para a empresa porque geralmente seu contrato inclui um pacote de benefícios, além da renumeração alta. Tem o aluguel, a escola dos filhos e o carro custeados pela empresa. O que temos visto hoje é que só os estrangeiros que ocupam cargos estratégicos, essenciais para a empresa, são mantidos”, afirma.

Denise Delboni, especialista em relações trabalhistas e coordenadora do curso de pós-graduação em Administração de Recursos Humanos da FAAP, observa que, neste momento, as empresas só bancam a vinda de estrangeiros se eles forem garantia de melhores resultados.

“Em tempos de recessão, a primeira coisa que a empresa pensa é: tem alguém dentro do Brasil que pode fazer esse trabalho? Se sim, ótimo”, explica Denise.

Mas Paulo Sardinha, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-RJ), conta que empresas já vêm, há algum tempo, driblando os altos custos atraindo dois perfis extremos: o profissional mais jovem, que ainda não formou uma família, ou o mais velho, cujos filhos já são independentes.

“As empresas têm criado um pacote local para os estrangeiros trabalharem no Brasil, excluindo alguns benefícios. E quem se habilita a isso? Ou os juniores ou alguém mais experiente, que só vem com a esposa”, afirma Sardinha.

Investimentos em queda

A queda dos investimentos no Brasil — medido pela Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), indicador do PIB que recua há nove trimestres seguidos — também explica a redução da mão de obra estrangeira no país, apontam os especialistas.

A maior parte desses profissionais é empregada em multinacionais que enviam de suas matrizes pessoas para ocuparem cargos de direção, para implementarem projetos e novas tecnologias. Nestes dois últimos casos, favorece a importação a escassez de mão de obra especializada no Brasil para determinados trabalhos. Segundo Sardinha, também é bastante comum unidades de multinacionais no Brasil trazerem o diretor financeiro de sua matriz.

O dinamarquês Kim Petersen, de 37 anos, chegou ao Brasil há uma década, depois de casar com uma brasileira. O então técnico em eletrônica trabalhou inicialmente como recepcionista no Brasil, para aprender a língua local. Tão logo o boom das commodities tornou os preços do barril de petróleo atraentes e a descoberta da camada de pré-sal impulsionou os negócios nessa área, especializou-se em técnicas de perfuração e passou a trabalhar em plataformas de exploração de petróleo como engenheiro subsea, como são chamados os profissionais que atuam nas estruturas submersas.

Petersen não contava que a crise causada pela descoberta do escândalo de corrupção na Petrobras e a desvalorização dos preços do petróleo vitimassem seu setor. Foi desligado da empresa na qual trabalhava em agosto do ano passado. Com o mercado retraído pela recessão, decidiu voltar, sozinho, ao país de origem.

“Fui desligado em agosto de 2015, quando toda a equipe de subsea foi encerrada. A maior dificuldade no momento em me recolocar é a situação geral na indústria do petróleo. Viver longe da minha esposa e da minha filha é muito difícil, mas a decisão foi tomada por falta de dinheiro. Eu estou procurando um emprego aqui na Dinamarca e, ao mesmo tempo, fazendo faculdade de engenharia eletrônica”, conta Petersen por e-mail.

Na Dinamarca, além de estudar numa universidade pública, Petersen ganha uma bolsa de cerca de R$ 2 mil mensais para se dedicar integralmente ao curso. Está vivendo na casa dos pais para economizar. Quer voltar para o Brasil, mas só quando o mercado de trabalho voltar a ficar favorável às contratações.

Perfil

De acordo com dados da Coordenação Geral de Imigração do Ministério do Trabalho, no ano passado, a maioria dos novos vistos de trabalho emitidos foram para homens, com idades entre 29 e 49 anos. Quase a metade da mão de obra estrangeira que entrou no país em 2015 tinha completado o ensino superior. Dos Estados Unidos, veio o maior grupo: 5.520 trabalhadores.

“É muito importante as empresas contarem com mão de obra estrangeira, pois isso aumenta seu repertório de soluções para questões como a baixa produtividade, ela ganha visões diferentes sobre um mesmo processo ou problema, ganha em transferência de tecnologia, melhora a imagem do Brasil lá fora e pode gerar novos negócios”, enumera Denise.

Um levantamento realizado pela empresa de recrutamento e seleção Vagas.com mostra que também caiu o interesse dos estrangeiros em trabalhar no Brasil. O número de novos currículos cadastrados por estrangeiros no portal caiu 69% em dois anos — de 6.047 enviados entre janeiro e setembro de 2014 para 1.902 nos mesmos nove meses de 2016. No mesmo período de comparação, caiu 61% o número de candidatos estrangeiros a vagas de trabalho abertas, de 52 mil em 2014 para 20 mil em 2016.

“Em 2012, 2013, tínhamos um volume muito interessante de estrangeiros no Brasil. Vinham porque os salários eram atraentes e ganhavam em euro, dólar. Hoje, as condições mudaram e ele pensa duas vezes antes de transferir sua vida para cá. Eram muito requisitados para projetos pontuais, que duram de dois a três anos. Geralmente, têm um conhecimento técnico apurado raro de ser encontrado no Brasil”, analisa Rafael Urbano, da área de Inteligência de Negócios da Vagas.com.

Vistos

No Brasil, os trabalhadores estrangeiros empregados no mercado formal também são protegidos pela CLT, como qualquer outro trabalhador local. O visto de trabalho tem de ser requisitado pela empresa que vai contratá-lo. Ela também fica responsável, de acordo como o Ministério do Trabalho, pela repatriação do profissional, quando necessário.

Há dois tipos de vistos: temporário e permanente. O primeiro é dividido em quatro categorias: até 90 dias, até um ano, até dois anos com contrato de trabalho no Brasil e até dois anos sem contrato de trabalho no país. O visto permanente pode ser requerido depois de dois anos de trabalho, desde que o estrangeiro permaneça com vínculo empregatício aqui.

A sócia de Gestão de Pessoas da Ernst & Young observa que os vistos são concedidos somente quando a empresa comprova que aquele profissional possuiu capacidade ou habilidade técnica escassa no Brasil, como forma de proteger a empregabilidade do trabalhador brasileiro.

Por e-mail, o Ministério do Trabalho informou que as exigências mais comuns na concessão dos vistos se referem à escolaridade e à experiência profissional. Disse que as empresas geralmente solicitam visto para trazer um profissional do exterior quando não há trabalhadores brasileiros qualificados para aquela função. Mas que, de toda a forma, o ministério verifica se há prejuízo aos trabalhadores brasileiros nessa contratação.

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