Construção civil é o setor que mais demitiu diplomados até maio: engenheiros são as maiores vítimas.| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

A recessão começou a afetar os trabalhadores mais escolarizados. O dado mais recente do mercado formal indica que em maio houve mais demissões que contratações de pessoas com diploma universitário, algo inédito para esse mês na série histórica iniciada em 2004. Segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), quase 5,7 mil vagas ocupadas por profissionais com curso superior foram fechadas no país.

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INFOGRÁFICO: confira o saldo de empregos por escolaridade nos últimos anos

Apesar dessa baixa, a primeira do ano, o saldo acumulado em 2015 ainda é positivo. De janeiro a maio, 62,4 mil pessoas com curso superior foram admitidas, já descontados os desligamentos. Mas esse número equivale a menos da metade do registrado no mesmo período de 2014. É também o mais baixo em pelo menos 12 anos. E corre o risco de passar para o lado negativo se o fluxo visto em maio se repetir nos próximos meses.

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Até 2011, o país gerava empregos para trabalhadores de todos os níveis de instrução. No ano seguinte, o Caged passou a apontar perdas para profissionais que tinham até o ensino fundamental completo. No início deste ano, as empresas passaram a fechar também postos de nível médio. Para especialistas em mercado de trabalho, os graduados tendem a ser as próximas vítimas.

Ajuste no salário

A crise também se manifesta nos salários de admissão do mercado formal. Na comparação com os cinco primeiros meses de 2014, a remuneração dos recém-contratados subiu abaixo da inflação – ou seja, houve perda real – para todos os níveis de instrução. A maior defasagem ocorreu justamente para os trabalhadores com curso universitário. Em um ano, salário médio de admissão deles subiu apenas 3,6%, ante uma inflação de 8,5%.

“O natural é que primeiro as pessoas menos escolarizadas, menos produtivas, percam seu emprego. Mas chega um momento em que a crise atinge os mais escolarizados”, diz João Saboia, professor emérito do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Não acho que maio tenha sido um ponto fora da curva. Minha expectativa é de que esse movimento se aprofunde.”

Maurício Sabadini, professor de Economia da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), também acredita que o processo de deterioração do mercado de trabalho tende a continuar. “Existe uma conjuntura de crise internacional que não vem de agora. Ela é agravada pela política econômica recessiva aplicada aqui. Isso afeta a ponta final, que é o mercado de trabalho”, diz.

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Sem medo de demitir

O economista Cássio Calvete, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), observa que, por algum tempo, o mercado de trabalho permaneceu aquecido apesar da desaceleração da economia. Com isso, muitas empresas evitaram demitir funcionários mais qualificados, pois temiam ter dificuldade em contratar trabalhadores com o mesmo nível de instrução caso a atividade econômica se recuperasse logo. Esse temor passou, diz Calvete.

“A deterioração do mercado de trabalho e o aumento do desemprego têm sido tão rápidos que as empresas sabem que, se demitirem, conseguirão recontratar. O risco de não encontrar profissionais disponíveis está diminuindo”, explica.

Alta no desemprego

A pesquisa Pnad Contínua, do IBGE, também aponta para uma piora no mercado de trabalho para os mais qualificados. Os profissionais com ensino superior são os que menos sofrem com o desemprego, mas sua taxa de desocupação está aumentando. Ela subiu de 3,4% para 4,6% entre o quarto trimestre de 2014 e o primeiro de 2015. No mesmo intervalo, a taxa de desocupação geral (todas as escolaridades) saltou de 6,5% para 7,9%.

Paraná tem o segundo melhor saldo para profissionais mais escolarizados

O Paraná não é exatamente uma ilha de prosperidade para os profissionais com diploma universitário, mas a situação do estado é melhor que a da média nacional. O saldo de empregos formais para esses trabalhadores, de 7,4 mil em cinco meses, é o segundo maior do país, abaixo apenas de São Paulo (28 mil).

De cinco grandes setores da economia do estado, apenas a construção civil registrou corte de empregos para trabalhadores de nível superior neste ano, e o saldo negativo foi de apenas 24 vagas. Mas já aparecem sinais de alerta: em maio, o estado gerou apenas 100 empregos de nível superior.

Como em todo o país, o ensino se destaca como o maior gerador de empregos qualificados, com 3,3 mil vagas no ano. Na outra ponta, bancos e montadoras aparecem entre os que mais demitiram.

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Indústria e construção civil puxam demissões

Alguns setores vêm fechando vagas há alguns meses. É o caso da indústria e da construção civil, que, somadas, cortaram 11,4 mil empregos de janeiro para cá. O drama se reflete na lista de profissionais mais demitidos. Dentre 583 ocupações, a que registrou o maior corte de empregos formais foi a de engenheiros civis e afins, com 3,1 mil demissões no ano.

Comércio e agropecuária exibem saldo ligeiramente positivo, mas declinante. O único setor com resultados mais consistentes é o dos serviços, com pouco mais de 71 mil vagas formais preenchidas em cinco meses. A atividade que mais se destaca é a do ensino, com 46,1 mil contratações – os professores de primeira a quarta série lideram a lista de contratações no país, com 13,1 mil admissões, e profissionais que dão aula para outros níveis de ensino também aparecem nas primeiras posições.

Para o economista João Saboia, da UFRJ, o setor de serviços deve ser o último afetado pela crise. “Ele é muito heterogêneo. Em alguns ramos há participação expressiva de pessoal de nível superior, em outros, não. Mas imagino que em algum momento ainda neste ano ele também comece a ter fluxo negativo”, alerta.