A crise interna da Receita Federal está prejudicando o comércio exterior e ameaçando o poder de arrecadação da União. As paralisações aumentaram nas últimas semanas quando os auditores fiscais e os analistas tributários entraram em pé de guerra por causa do projeto de lei que altera direitos, reajusta salários e cria programa de bonificação da instituição. Enquanto os servidores não entram em um acordo, exportadores e importadores acumulam prejuízos em função dos atrasos na liberação de mercadorias e o governo perde receitas já que as autuações do Fisco estão em ritmo menor do que em 2015.
Os auditores fiscais pressionam o governo para que o projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados seja aprovado na versão original enviada pelo Executivo. Ela estabelece uma série de prerrogativas (direitos) para a função de auditor e cria o Programa de Bonificação por Eficiência para os cargos de auditores e analistas. Já os analistas pressionam para que o substitutivo apresentado pelo deputado Wellington Roberto (PR-PB) seja aprovado. Ele estende as prerrogativas, a condição de autoridade fiscal e o Programa de Bonificação a todos os funcionários da Receita, inclusive os de nível técnico.
Segundo o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), os auditores estão fazendo paralisações nas terças e quintas-feiras contra o substitutivo e nos demais dias da semana acontecem as operações “Padrão” e “Meta Zero”, em que somente as cargas essenciais (medicamentos, animais vivos, perecíveis e cargas perigosas) são liberadas. Cerca de 400 auditores em posições de chefia também apresentaram a renúncia a seus cargos. A mobilização vai continuar até que o projeto original seja restabelecido.
Perdas
Enquanto o imbróglio não se resolve e as paralisações continuam, as autuações caem. A Receita esperava lançar R$ 155,4 bilhões em crédito tributário neste ano, mas até agosto (mês do último dado disponível) o montante acumulado foi de R$ 73,2 bilhões, valor 14% menor do que o registrado no mesmo período de 2015, ano em que o Fisco não bateu a sua meta de autuações.
O presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita (Unafisco), Kleber Cabral, afirma que a meta de autuações para este ano não será alcançada e que toda a área de julgamento de processos está paralisada, enquanto há R$ 750 bilhões em processo para serem julgados. O coordenador da área de Acompanhamento dos Maiores Contribuintes, Guilherme José Dias, setor responsável por mais de 60% da arrecadação administrada pela Receita, também afirmou que a área não irá bater a meta.
Comércio exterior
O comércio exterior também é prejudicado por causa da crise da Receita Federal. Segundo tradings de Curitiba e região, a liberação de mercadorias está atrasada nas aduanas e os empresários estão tendo que arcar com os custos para armazenar as mercadorias por mais tempo. “Paralisa a aduana, paralisa o país. E não tem o que ser feito”, resume o executivo de comércio exterior Rafael Ortolan.
Um empresário do setor que não quis ser identificado afirmou que está demorando 22 dias para liberar as mercadorias via canal amarelo, procedimento de importação que fiscaliza a documentação. Já pelo canal vermelho, que inclui inspeção da mercadoria, a demora chega a 37 dias. Ele conta que, como uma carga sua não foi liberada na última sexta-feira (18) no Porto Seco, de Cuiabá, ele teria que pagar mais R$ 28 mil de taxa de armazenagem na segunda-feira (21).
Procurada, a Receita não se manifestou sobre o assunto.