A crise fiscal que pegou em cheio alguns estados brasileiros pode acabar desencadeando uma onda de privatizações no país. A venda de companhias estatais à iniciativa privada é defendida pelo governo federal como uma medida necessária dentro do processo de renegociação das dívidas dos estados com a União e pode ser a última saída para os estados mais encrencados em suas finanças.
Por enquanto, a privatização está no radar de pelo menos três estados que declararam situação de calamidade devido à crise financeira: Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Mas outros estados em dificuldades financeiras como Maranhão, Goiás, Mato Grosso, Distrito Federal e Sergipe podem ir pelo mesmo caminho, acredita o economista Raul Velloso, especialista em Finanças Públicas.
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O Rio de Janeiro vive a situação fiscal mais dramática e pode ser o primeiro a levar adiante o processo de privatização da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae). A venda da empresa à iniciativa privada seria uma das contrapartidas exigidas pela União em troca da ajuda financeira ao estado. A dúvida é com relação ao porcentual da Cedae que seria privatizado: enquanto o governo do estado estaria disposto a vender apenas parte da companhia para o setor privado, a intenção do governo federal seria privatizar 100% da empresa. Pelo acordo com o governo federal, o Rio deixaria de pagar R$ 23 bilhões em dívidas nos próximos três anos.
“O grande teste deve ser o caso do Rio de Janeiro, com a privatização da Cedae. Minas e Rio Grande do Sul vêm na sequência. Se o caso do Rio não funcionar, pode acabar desestimulando os outros estados a irem pelo mesmo caminho”, acredita Velloso.
No Rio Grande do Sul, a lista de estatais cotadas para a privatização contempla a Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), a companhia de gás, a Sulgás, e a Companhia Rio-Grandense de Mineração (CRM). Contudo, o estado tem uma peculiaridade que pode atrapalhar os planos de privatização de algumas estatais. A venda do Banrisul, o banco do estado, para a iniciativa privada, por exemplo, só é possível por meio de voto popular, com realização de plebiscito. A privatização do banco não está nos planos do governo gaúcho, já que o Banrisul é uma das poucas estatais gaúchas que dão retorno ao estado.
Em Minas Gerais, a companhia de energia elétrica estatal Cemig, a companhia de gás Gasmig , e a companhia de saneamento, a Copasa, são as mais cotadas. No início desta semana, os rumores da privatização da companhia mineira Cemig como contrapartida para a ajuda financeira ao estado de Minas fizeram as ações da empresa dispararem na Bolsa de Valores. Os papéis chegaram a subir 7% na terça-feira (31). As ações da Copasa e da Ligth, companhia de energia elétrico do Rio de Janeiro na qual a Cemig tem participação, acompanharam o movimento de alta.
Paraná
A crise fiscal também atingiu o Paraná, mas o estado conseguiu se antecipar ao aprovar, no ano passado, um pacote de ajuste fiscal que, entre outras medidas, previa a venda de ações da Copel e da Sanepar para fazer caixa, com previsão de arrecadação de R$ 2 bilhões. Por ora, apenas as ações da Sanepar foram vendidas, rendendo cerca de R$ 894 milhões aos cofres do governo estadual, que não precisou recorrer ao governo federal. Apesar de estar numa situação aparentemente melhor que outros estados, o governo do Paraná deve enviar um novo pacote de ajuste fiscal à Assembleia Legislativa nas próximas semanas.
Ao negociar a ajuda financeira aos estados por meio do Regime de Recuperação Fiscal, o governo federal exigiu uma série de contrapartidas e abriu a possibilidade de venda de ativos estaduais à iniciativa privada para que os estados possam para fazer caixa e abater seus débitos com a União ou promover medidas de ajuste fiscal. O governo federal também se comprometeu a colaborar oferecendo ajuda do BNDES para estruturar o processo de privatização das estatais.
Velloso, contudo, acredita que o processo de privatização de algumas dessas estatais tende a ser muito longo e, em alguns casos, extremamente difícil, algo incompatível com a urgência dos estados para obter recursos. “Hoje, o que resta aos estados em dificuldades para privatizar são as joias da coroa. Minas e Rio Grande do Sul têm duas empresas que têm valor elevado de mercado, a Cemig e o Banrisul, mas têm restrições na constituição para privatizar, pois precisa de aprovação popular via plebiscito”, afirma.