O mercado brasileiro de veículos pode não crescer tanto daqui para a frente, quanto se esperava até o início deste mês, quando o estouro da bolha do setor imobiliário norte-americano afetou bolsas de valores em todo o mundo. Em setembro, a Federação Nacional dos Distribuidores de Veículos Automotores (Fenabrave) deve reduzir sua previsão de crescimento das vendas em 2007, que hoje é de 17%, tanto para carros quanto para a soma de todos os segmentos do mercado (ônibus, caminhões, motocicletas e implementos rodoviários). A revisão da estimativa foi anunciada ontem pelo presidente da Fenabrave, Sérgio Reze, em entrevista coletiva durante o 17.º congresso da entidade, em Curitiba.
O temor de consumidores e empresários do setor é que, para se precaver de uma piora do cenário financeiro mundial, os bancos elevem as taxas de juros dos financiamentos. Reze ponderou que, apesar da esperada redução na estimativa, o mercado deve fechar o ano com crescimento expressivo, o que deve se repetir em 2008. "Não haverá retração, e sim um crescimento um pouco menor." No fim do ano passado, a Fenabrave previa um avanço de 9,5% ao longo de 2007. Em março, a estimativa foi revisada para 12%, em junho cresceu para 15% e, no mês seguinte, chegou aos atuais 17%. Entre janeiro e julho, o aumento das vendas foi de 27,5% e, ao que tudo indica, o mercado caminha para bater com tranqüilidade seu recorde histórico, estabelecido em 1997.
O combustível desse avanço é o crédito: o juro ficou menor e o prazo de parcelamento, mais longo. Com isso, a proporção de carros financiados (incluindo leasing e consórcio) vem subindo. Em 2005, 67% dos automóveis foram vendidos com pagamento parcelado; atualmente, esse índice é de 71%, segundo a Associação Nacional de Empresas Financeiras de Montadoras (Anef). Portanto, caso a crise dos mercados financeiros acabe por elevar os juros do financiamento, pode afetar justamente o combustível do crescimento do mercado brasileiro.
"Por enquanto ninguém sabe ao certo qual será a extensão dessa crise nos Estados Unidos. Mas não há sinalização de que haverá uma interrupção abrupta nos financiamentos. O que pode ocorrer são pequenos aumentos dos juros, mas nada que inviabilize a compra do veículo", disse Reze. Um dos bancos que tomou atitude já na semana passada foi o HSBC, que elevou o juro do Crédito Direto ao Consumidor (CDC) para veículos de 1,78% para 1,89% ao mês.
Para o presidente da Fenabrave, o consumidor não parece ter ficado intimidado com a crise das bolsas. "Os números da primeira quinzena deste mês mostram um aumento das vendas em relação a julho, que já foi um mês excepcional, e também na comparação com agosto do ano passado", disse o dirigente, que em seguida deu a entender que o "talento de vendedor" pode ter sido importante para as boas vendas do último fim de semana. "É a velha história de aproveite enquanto o prazo está bom, enquanto o juro ainda está baixo."
Reze avalia que um crescimento de 10% ao ano já seria "forte" e "interessante" para a indústria e os revendedores de veículos. "É melhor do que crescer muito num ano e cair no outro. Com um aumento sustentado de 10%, as montadoras têm tempo para adaptar projetos e aumentar a capacidade instalada sem correria, em conjunto com seus fornecedores." De acordo com o dirigente, a indústria tem uma sobra de capacidade de 500 mil unidades por ano, que garantiria o atendimento da demanda pelos próximos três anos.