A safra 2010/11 será de boa rentabilidade para a maioria dos agricultores brasileiros, com o apetite da China por produtos como soja e milho garantindo a manutenção das cotações das commodities em patamares elevados capazes de amenizar ineficiências de logística e infraestrutura do Brasil.
A avaliação é de José Roberto Mendonça de Barros, fundador da consultoria MB Associados, que atende as principais empresas do agronegócio do país, e foi feita num momento em que o mercado de commodities agrícolas especula sobre medidas da China para controlar a sua inflação de alimentos, que poderiam arrefecer os preços internacionais.
Para o economista, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, mesmo considerando a correção dos futuros da bolsa de Chicago nesta semana, a soja ainda é negociada acima de 12 dólares por bushel, um preço dos mais altos historicamente --o recorde foi atingido em julho de 2008, acima de 16 dólares. E o principal motivo é a demanda atual.
"A grande mudança é a seguinte: o salário real na China do trabalhador da base da pirâmide está subindo 20 por cento este ano, e provavelmente vai continuar subindo nos próximos anos. É uma mudança do paradigma chinês de crescimento", declarou Mendonça de Barros, comentando o que considera o principal fator da sustentação das commodities agrícolas.
"Ora, quando tem milhões de pessoas que passam a ganhar 20 por cento a mais, a demanda de alimento sobe 30. Então a demanda chinesa --o caso da soja é o mais óbvio de todos-- está explodindo, porque tem mais dinheiro na mão do consumidor final", acrescentou.
O comandante da MB Associados, com atuação no setor agrícola desde 1978, ressaltou que a "fúria" dos chineses por alimentos impediu que os preços da soja (principal produto do agronegócio do país) caíssem neste ano apesar de os três principais produtores (Estados Unidos, Brasil e Argentina) terem colhido safras recordes.
"Os chineses venderam estoques estratégicos de vários produtos e ainda assim a inflação de comida está acima de 10 por cento (ao ano)", disse.
A busca incessante da China nos mercados internacionais para alimentar sua população também incluirá importações de milho, outro fator que deverá sustentar os preços dos grãos --neste ano, os chineses já importaram mais de 1 milhão de toneladas, um volume não registrado em mais de dez anos.
"Deve continuar no próximo ano, o fundamento de ampliação de demanda vai continuar... Os chineses vão importar milho, essa é uma mudança estrutural...", notou ele, indicando que nos próximos anos, considerando as restrições da China em termos de terras agricultáveis e disponibilidade de água, o país terá de importar também produtos prontos como as carnes, um mercado que o Brasil é dos mais competitivos.
A China passou a comprar frango do Brasil este ano --antes o produto chegava ao país somente via Hong Kong. E o Brasil, que tem se consolidado no mercado global de milho, tem potencial de ser importante fornecedor do cereal aos chineses.
Ameaça climática
Mendonça de Barros, que será um dos palestrantes do 10o Seminário de Planejamento Estratégico da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas da Abimaq, no próximo sábado em São Paulo, salientou ainda que, dependendo das condições climáticas, os preços poderão subir ainda mais durante a temporada 2010/11, cujo plantio está se desenvolvendo.
"Pode ter preços fortes dos alimentos, parte estrutural, parte ainda pelas dificuldade para recompor os estoques que estão se reduzindo este ano... (Se tiver algum problema climático) vai ser difícil para a situação internacional e bom para o preço."
Essa situação, se preocupa do ponto de vista da inflação de alimentos, tem garantido bons resultados para o setor agropecuário do Brasil, que deve exportar um valor recorde em 2010.
E viabiliza as regiões do Brasil grandes produtoras como o Mato Grosso, que sofrem com altos custos logísticos, que por vezes chegam a "comer" 40 por cento da receita dos agricultores, disse ele, lembrando que apenas com preços nas alturas os produtores do Centro-Oeste brasileiro conseguem conviver com um câmbio que reduz os ganhos em real.
"A combinação do dólar fraco com transporte alto é que mata o Mato Grosso", declarou ele, alertando que, se as commodities mudarem de direção, como já aconteceu no passado, as margens do setor voltarão a se apertar num país com câmbio fraco, logística deficitária, tributos pesados e com alguns custos de produção em alta.
"Só estamos tendo um cenário positivo porque os preços estão pagando essas ineficiências", acrescentou.
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