Durante quase a metade de sua vida, Daniel Cremoneze, 48 anos, trabalhou na fábrica de autopeças da Bosch, na Cidade Industrial de Curitiba. Um colega dele, João Tavera de Oliveira, 47 anos, passou mais de 14 na empresa. Para eles, e outras quase mil pessoas, este Natal não será dos melhores. Todos foram incluídos nos cortes promovidos pelas empresas paranaenses desde o início de dezembro.
Pode-se dizer que são a cara da crise financeira internacional no Paraná: pessoas que, muitas vezes, trabalhavam há vários anos na mesma empresa e acreditavam na estabilidade de seus empregos. Agora, olham para 2009 como um ano de grandes desafios. Será preciso buscar uma nova colocação, ou, ao menos, se preparar para isso.
O ex-almoxarife Daniel Cremoneze conta que atravessou diversas crises econômicas durante os 22 anos em que trabalhou na Bosch. Desta vez, pensou que não seria diferente. "Quando começam a falar em crise, é natural ficar preocupado, mas, como das outras vezes, acreditei que poderia me manter empregado fazendo meu trabalho conforme as necessidades da empresa. Confesso que fui pego de surpresa", lamenta o funcionário, um dos 200 demitidos.
Cremoneze recebia cerca de R$ 3 mil mensais entre salário, gratificações e horas-extras e acredita que a remuneração, considerada acima da média para a função, foi crucial para a inclusão de seu nome na lista de demitidos. "Não sou de chorar, mas na hora [da demissão] não tive como segurar."
Assim como ele, o metalúrgico Itamar Aparecido de Lima, 36 anos, nem sequer imaginava a possibilidade de ser demitido: havia sido efetivado há pouco, após um ano com contrato temporário na Case New Holland (CNH), fabricante de tratores, máquinas e equipamentos agrícolas na Cidade Industrialde Curitiba. Na segunda-feira passada, recebeu a notícia de que fora demitido, junto com outros 59 colegas do setor. Ao todo, a CNH dispensou350 funcionários.
"Na realidade, não imaginava que a crise fosse nos atingir. Três meses atrás houve uma reunião da empresa em que nos disseram que a agricultura não seria afetada pela crise e que não precisávamos nos preocupar, pois não haveria demissões. Minha contratação, inclusive, foi efetivada em outubro para suprir a demanda", conta.
Com a mudança brusca de cenário e a perda do emprego, Lima se viu obrigado a suspender seus planos de reformar a casa e trocar o carro no início de 2009. Ele conta que não tem um "plano b", mas estipulou como meta conseguir um novo trabalho, na mesma área em que atuava, até março do ano que vem. "Sei que não vai ser fácil e que o momento é preocupante, já que todas as indústrias são afetadas ao mesmo tempo. Mas, se for o caso, estou até disposto a mudar de cidade para conseguir trabalho", afirma.
Para Daniel Cremoneze, o futuro é uma incógnita. "Pode até ser falha minha, mas depois de tanto tempo trabalhando, nunca me preparei para esse momento." Com parte do dinheiro que recebeu com a rescisão, ele quitou suas dívidas e, com o restante, abriu uma conta-poupança, que pretende manter como um seguro caso sua recolocação no mercado ultrapasse o tempo em que receberá o seguro desemprego.
Também na Bosch, o operador da linha de produção João Tavera de Oliveira diz ter sido pego de surpresa. "Quando a crise estourou falavam em cortes, mas, como sofro de problemas de saúde, não imaginei que poderia ser demitido. Mas aconteceu justamente o contrário: depois de 14 anos, 4 meses e 10 dias trabalhando na Bosch, fiquei desempregado", lamenta.
Além do salário de R$ 1.780, o trabalhador também perdeu o plano de saúde da empresa, que lhe garantia o tratamento para os problemas cardíacos, na coluna e de artrite que sofre.
Faltando pouco mais de 3 anos para se aposentar, ele se diz preocupado com o futuro e acredita que sua idade de 47 anos, somada ao fato de se locomover com auxílio de muletas, pode limitar as possibilidades de uma nova contratação. "Vai ser difícil encarar [a situação] daqui pra frente", diz.
Na fabricante de ônibus e caminhões Volvo, que demitiu 430 trabalhadores, o clima de festas de fim de ano deu lugar à preocupação com novas demissões que podem ocorrer até março de 2009. "Até agora a medida só afetou a produção, mas o clima é ruim e a expectativa é de que o próximo corte seja ainda maior", diz um coordenador de produção da empresa, que preferiu não se identificar.