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O Senado Federal acompanhou a Câmara dos Deputados e, seguindo acordo entre governo e líderes partidários, derrubou o veto do presidente Jair Bolsonaro à desoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia até o fim de 2021. Foram 64 votos de senadores a favor da derrubada e apenas dois contra.
Inicialmente, o governo gostaria que o veto fosse mantido, mas um acordo costurado ao longo da manhã desta quarta-feira (4) entre os líderes partidários e o líder do governo no Congresso, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO), formou consenso para a derrubada do veto nas duas Casas. Com isso, a desoneração da folha salarial fica mantida até dezembro de 2021.
O benefício permite que os setores da economia abarcados pela medida troquem o recolhimento de 20% para a Previdência sobre os salários dos empregados por um recolhimento sobre a receita bruta. O valor desse recolhimento varia 1% a 4,5%, de acordo com o setor. Com isso, o empregadores recolhem menos.
O benefício acabaria em dezembro deste ano, mas os parlamentares prorrogaram até o fim de 2021. O presidente Jair Bolsonaro vetou a extensão atendendo a um pedido da equipe econômica, mas o congressistas optaram por derrubar o veto e manter a desoneração diante da pressão dos setores empresariais beneficiados pela medida. O argumento para a extensão foi a geração e manutenção de empregos no período pós-pandemia.
Como foram as sessões de votação
Diante do acordo fechado entre os líderes do governo e os demais líderes partidários, as sessões de votação aconteceram de maneira tranquila. Pela manhã, a Câmara dos Deputados derrubou o veto por 433 votos a 33. No fim da tarde, foi a vez do Senado.
O único momento tenso foi quando o líder do governo no Senado, senador Fernando Bezerra (MDB-PE), afirmou que orientaria a favor da derrubada do veto, conforme acordado, mas votaria pessoalmente contra por acreditar que a lei é inconstitucional. Bezerra usou argumento apresentado pelo ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, que também vê possível inconstitucionalidade.
O voto de Bezerra foi criticada pelos demais senadores. Grande parte dos líderes partidários afirmou que não vem inconstitucionalidade e que levantar essa questão só traz insegurança jurídica para os setores envolvidos, já que o acordo era para derrubada. Apesar da manifestação de Bezerra, o voto dele não interferiu no resultado, e o veto foi derrubado no Senado por 64 votos a 2.
Para que o veto fosse derrubado, era necessária a maioria absoluta dos votos, ou seja, 257 votos de deputados e 41 de senadores. O governo conseguiu adiar por duas vezes a sessão de votação, na tentativa de costurar um acordo para manter o veto, mas teve que ceder.
A ideia da equipe econômica era propor uma desoneração ampla da folha de pagamentos e para todos os setores da economia, em troca da criação de um imposto sobre transações digitais. Essa proposta nem chegou a ser oficializada, diante das resistências.
O presidente do Congresso, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), elogiou a postura do governo em voltar atrás e topar derrubar o seu próprio veto. "Há três meses, a visão do governo era outra. Isso [a derrubada do veto] só foi possível através das manifestações das deputadas e dos deputados, das senadores e dos senadores sobre o quanto era importante a manutenção para a geração de empregos", explicou Alcolumbre.
"Estamos na pandemia, Brasil tá perdendo muitas vidas e a gente não pode perder empregos, ainda mais num momento conturbado como esse que estamos vivendo", completou, acrescentando que os setores beneficiados geram de 6 a 7 milhões de empregos. "A decisão que o Congresso tomou hoje, com o apoio do governo, foi acertada e no tempo certo", concluiu.
Desoneração da folha começou em 2011
A medida foi criada em 2011 beneficiando, inicialmente, 56 setores. Depois, o número foi diminuindo e hoje ela é válida para 17 setores, incluindo construção civil, call centers, confecção, vestuários, fabricantes de veículos e empresas de tecnologia da informação (TI) e comunicação (TIC).
A previsão era de que o benefício acabasse em dezembro de 2020, mas o Congresso aprovou dentro da medida provisória 936/2020 a extensão até dezembro de 2021. Segundo estimativas da Receita Federal, a desoneração da folha já custou R$ 118 bilhões aos cofres públicos desde quando foi criada.
O presidente Jair Bolsonaro vetou o trecho atendendo a um pedido da equipe econômica, que alegou que a continuidade da desoneração é inconstitucional, contrariando o que prevê a reforma da Previdência recém-aprovada, além de ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A reforma da Previdência veda desonerações verticais e com mudança da base de cálculo que sejam posteriores à Emenda Constitucional 103/2019 (da reforma).
A avaliação da mesa diretora da Câmara dos Deputados é de que não há inconstitucionalidade, pois não se trata de uma nova desoneração e sim a extensão de um benefício já existente. Sobre a renúncia de receita, a mesa diz que os parlamentares podem, no próprio Orçamento, cortar despesa equivalente, o que torna a medida legal.
O Orçamento de 2021 foi feito pelo governo prevendo o fim da desoneração. Caso os parlamentares estendam por mais um ano, eles terão de cortar R$ 4,9 bilhões em despesas discricionárias. A previsão é de que essa votação possa ficar até para janeiro de 2021.