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"Transgressão" do modelo de metas é maior entre ricos

Para o coordenador do Gru­­­po de Análises e Projeções do Instituto de Pesquisa Eco­­­nô­­­mica Aplicada (Ipea), Roberto Messenberg, foi a crise internacional de 2008 e 2009 que problematizou o apego radical da política econômica dos países à sua lógica de funcionamento. Isso porque, segundo ele, as metas de inflação dizem respeito exclusivamente aos preços dos fluxos de bens e serviços no chamado lado real da economia e, portanto, nada tinham a dizer sobre a evolução dos preços dos ativos financeiros, cujo estouro acabou por desencadear a crise.

"Em segundo lugar, a própria tentativa de lidar com os efeitos negativos da crise sobre o lado real da economia (níveis de emprego e de crescimento do PIB, por exemplo) acabou por levar a uma forte expansão monetária por parte dos países mais industrializados, principalmente dos EUA, que colocou em xeque os níveis e as flutuações até então prevalecentes e consideradas normais das taxas de câmbio no mundo".

Nesse sentido, para Mes­senberg, os bancos centrais que adotaram o sistema de metas de inflação passaram a ter de arcar também com as tarefas inglórias de estabilizar os preços dos ativos e as cotações de suas moedas, o que sobrecarregou os objetivos da política monetária sob aquele regime. "Em função disso, ou seja, de suas necessidades de lidar com a realidade de forma pragmática, eu diria que as políticas econômicas que esses países adotam, corretamente, um sistema ‘sujo’ de metas inflacionárias."

Como funciona

Saiba o que é o regime de metas de inflação e como ele funciona

• Nos anos 90, alguns países da América Latina e Ásia Oriental tiveram uma experiência pouco satisfatória ao optarem por programas de estabilização baseados em âncoras cambiais. A estratégia de política monetária conhecida como meta inflacionária – já utilizada com sucesso em alguns países desenvolvidos como Nova Zelândia desde 1990, Canadá (1991), Reino Unido (1992) e Austrália (1994) – tornou-se uma alternativa atrativa.

• O Chile, em 1991, foi o primeiro país em desenvolvimento a adotar o regime de metas como estratégia de política monetária; posteriormente outros países, como Polônia (1998), Brasil (1999), México (1999) e África do Sul (2000), seguiram essa mesma tendência.

• No Brasil, a definição da taxa de juros é de competência do Comitê de Política Monetária (Copom), a partir da meta de inflação determinada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).

• Na definição da taxa de juros, o BC considera uma série de fatores, como a demanda do setor público, do privado e também da população; a oferta de bens, produtos e serviços; a taxa de desemprego; as expectativas gerais em relação ao crescimento e à composição de preços (a inflação); e também o cenário externo.

• Quando o BC sobe a Selic, atua para conter a demanda das famílias por produtos e serviços e, assim, impedir a escalada de preços. Quando o BC reduz a Selic é porque não vê riscos significativos de inflação e pode estimular o crescimento do país.

• Em 13 anos, a inflação efetiva se aproximou do centro da meta apenas quatro vezes. Para alguns analistas, o modelo de crescimento que baseia o regime de metas de inflação – centrado na distribuição de renda, expansão do crédito e consumo, com juros elevados e câmbio agindo para conter a inflação – está esgotado.

Desde agosto do ano passado, quando o Banco Central deu início ao último ciclo de cortes na taxa básica de juros frente às perspectivas de uma inflação perigosamente fora dos índices estabelecidos, o órgão tem sido criticado e acusado de ter abandonado o regime de metas de inflação – que é a base da busca pelo equilíbrio da economia brasileira desde 1999. Em sete reuniões, de agosto de 2011 a maio de 2012, o Comitê de Política Monetária (Copom) fez a taxa Selic cair 4 pontos porcentuais – passou de 12,50% para 8,5%. Diante da enxurrada de liquidez que os países ricos vêm promovendo para combater a desaceleração econômica, no entanto, não só o Brasil mas outros emergentes têm optado por afrouxar o modelo, com atenção especial também à produtividade e à taxa cambial. Em resumo, a estratégia é de se admitir, sim, um crescimento menor em troca da manutenção dos empregos, da melhor estabilidade possível de preços à população e de se evitar a valorização da moeda.

Nem certo, nem errado

Em 13 anos, a inflação se aproximou do centro da meta apenas quatro vezes. Ainda assim, a adoção do regime de metas não é mesmo uma ciência exata, não é certa nem errada, é apenas uma escolha política em prol de determinado objetivo – no caso, a estabilidade de preços. Em longo prazo, o grande objetivo do Banco Central com o regime é trazer o Brasil para perto das médias inflacionárias de outras economias emergentes, 3%.

Pesquisas já indicaram que entre os países ricos a adoção do regime de metas de inflação não influencia consideravelmente no crescimento das riquezas. Já entre os emergentes, aqueles que adotam o modelo apresentaram um crescimento menor que a média geral.

Para alguns economistas, inclusive o próprio presidente do BC, Alexandre Tombini, essa "maldição" do regime de metas de inflação para os países emergentes poderia ser combatida (ou remediada) com reformas e investimentos estruturais. É justamente aí que se encontram as controvérsias sobre o andamento da economia do país.

Para alguns analistas, o modelo de crescimento que baseia o regime de metas de inflação – centrado na distribuição de renda, expansão do crédito, estímulo ao consumo, com juros elevados e câmbio agindo para conter a inflação – está esgotado. "Modelos de crescimento puxado exclusivamente por consumo (com aumento do endividamento das famílias) têm vida curta", avalia o economista e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Marcelo Curado. São os chamados "voos da galinha" da economia brasileira, que no momento colocam o setor industrial – base para qualquer crescimento sustentável – sob pressões contraditórias. "O estímulo à produção industrial é afetado de forma positiva pelo nível da taxa real de câmbio, mas de forma negativa pelo nível da taxa real de juros", diz o coordenador do Grupo de Análises e Projeções do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Roberto Messenberg.

Para os especialistas, o Brasil está dormindo no ponto e perdendo a hora de investir no combo rigor fiscal e infraestrutura, com foco, principalmente, no setor industrial.

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