O negócio que pode unir o Grupo Pão de Açúcar e o francês Carrefour, que comandam as duas maiores redes de supermercados do Brasil, ainda terá de passar pelo crivo de acionistas das companhias e órgãos de defesa da concorrência. Mas ao menos um aspecto da operação é dado como certo: se ela sair, terá grande participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), instituição pública de fomento, que entraria com algo entre R$ 3,91 bilhões e R$ 4,55 bilhões.
A operação foi formulada anteontem por um fundo chamado Gama, que pertence ao banco privado BTG Pactual, do banqueiro André Esteves o mesmo que, no início do ano, comprou o PanAmericano de Silvio Santos. Pela proposta que a Gama apresentou ao Carrefour França, a fusão ocorreria a partir da criação de uma nova empresa, a Nova Pão de Açúcar (NPA), que dividiria com o Carrefour França o controle da Companhia Brasileira de Distribuição (CBD, nome "oficial" do Grupo Pão de Açúcar).
Dentro da NPA, os atuais acionistas da CBD (os principais são Abílio Diniz e o varejista francês Casino, concorrente do Carrefour) passariam a ter a companhia de Gama e BNDES. Estes dois últimos entrariam no negócio com um aporte de pelo menos R$ 4,6 bilhões, dos quais R$ 690 milhões do BTG e o restante, do BNDES.
De imediato, pode-se identificar um grande vencedor e um grande perdedor desse negócio. Com a ajuda do BNDES, o BTG se tornará um grande acionista do Carrefour, segunda maior empresa do mundo do setor de distribuição, com uma participação de até 18% em seu capital e direito a dois assentos no conselho de administração, incluindo a vice-presidência. Por outro lado, o Casino, que pretendia ampliar sua fatia no Pão de Açúcar, terá de dividir o controle do grupo com seu principal rival, o Carrefour (leia mais em box na página 23).
Patrocínio
Se confirmada, essa não será a primeira vez que o BNDES que é sustentado pelo Tesouro Nacional e pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) patrocina uma operação para criar uma "gigante brasileira". Nos últimos anos, o banco de fomento financiou ou entrou como sócio em vários negócios do gênero, envolvendo empresas como Oi (telefonia), JBS e Bertin (alimentos).
Segundo o banco, a operação é estratégica, pois fortalece o grupo nacional Pão de Açúcar, que assumirá uma posição importante no Carrefour, um dos maiores varejistas globais, abrindo caminho para maior inserção de produtos brasileiros no mercado internacional.
A proposta ainda será analisada pela diretoria do BNDES e também será submetida à aprovação das demais companhias envolvidas. Também terá de passar pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão de defesa da concorrência, uma vez que unirá as duas maiores supermercadistas do Brasil, que em 2010 faturaram juntas cerca de R$ 65 bilhões em seus mais de 2 mil pontos de venda. Carrefour e Pão de Açúcar dominariam algo entre 27% e 28% do setor, mais que o dobro do Walmart (11%).
Redução de custos
A união também geraria uma "sinergia" (leia-se redução de custos) estimada entre R$ 1,3 bilhão e R$ 1,8 bilhão, segundo Claudio Galeazzi, sócio do BTG. Galeazzi lembrou que, nos Estados Unidos, o Walmart tem 32% do mercado americano e, por isso, consegue oferecer preços mais baixos aos consumidores. Com o Pão de Açúcar aconteceria o mesmo no Brasil, disse Galeazzi.
Embora operações que concentram mercado costumem gerar economia às empresas que ganham poder de barganha contra os fornecedores, como destacam os interessados na fusão , tais ganhos não necessariamente são repassados aos consumidores. A fusão de Sadia e Perdigão, por exemplo, é alvo de resistência no Cade justamente porque poderia resultar em aumento de preços ao consumidor.