O mês de outubro chegou ao fim com os reservatórios das hidrelétricas no menor nível desde 2001, ano do racionamento. Para piorar a crise do setor elétrico, a perspectiva é de chuvas abaixo da média para o próximo ano e térmicas funcionando praticamente sem parar. Mesmo no cenário mais otimista, o estresse hídrico vai continuar afetando as distribuidoras, que podem precisar de um novo socorro do governo em 2015. Para o consumidor, isso significaria um custo extra que, cedo ou tarde, vai chegar à tarifa de energia.
INFOGRÁFICO: Veja o nível dos reservatórios das hidrelétricas
O cenário mais crítico se concentra no primeiro semestre do ano que vem. A maior parte das distribuidoras tem contratos que vencem no final deste ano e início do próximo. Se o leilão A-1, marcado para o dia 5 de dezembro, não atrair vendedores em quantidade suficiente para cobrir as necessidades das distribuidoras, elas entram em 2015 já expostas ao mercado spot (de curto prazo), onde o Preço de Liquidação de Diferenças (PLD) está no teto, em R$ 822,83. A conta da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia (Abraade) estima em 4 mil MW médios a quantidade de energia descontratada no primeiro semestre do ano que vem.
A esperança é que a chegada do período chuvoso, que vai de novembro a março, traga chuva abundante para dar um fôlego ao setor. "Os preços deve continuar altos porque é preciso recompor o nível dos reservatórios. Na situação atual, serão necessários dois anos de chuvas acima da média para que isso ocorra", estima o gerente de regulação da Safira Energia, Fábio Cuberos. Além da energia escassa, o consumo tende a crescer nesse período com o aumento das temperaturas e o uso de equipamentos elétricos para aliviar o calor.
Cotas
O alívio deve vir no segundo semestre, quando vence a maior parte dos contratos que não foram renovados por meio da Medida Provisória 579. Na ocasião, Cesp, Cemig e Copel optaram por não antecipar a renovação dos contratos de concessão. Essa energia que corresponde a cerca de 5 mil MW deve ser repartida entre as distribuidoras em forma de cotas e com um custo bem inferior ao praticado no mercado hoje, em torno de R$ 30 o MWh. No caso da Copel, as usinas não renovadas correspondem a apenas 5% do parque gerador da companhia.
Além das cotas, o governo propôs a redução do preço da energia no mercado livre para tentar garantir o sucesso do leilão A-1, em dezembro. Tudo para evitar que haja a necessidade de um novo aporte às distribuidoras. Só neste ano, até agora, foram R$ 17,8 bilhões de reais via empréstimos bancários para sanar o rombo imediato no caixa das distribuidoras e evitar que esse custo chegasse ao consumidor por meio do reajuste tarifário, o que pressionaria ainda mais a inflação.
Ainda assim, os reajustes das distribuidoras vieram altos, a maioria acima dos 20%. Para piorar, os analistas não descartam a possibilidade de racionamento de energia em 2015. "Só um dilúvio neste ano faria o setor respirar mais aliviado. O primeiro semestre de 2015 deve ser tenso", resume Cuberos, da Safira.
Impasse
Proposta que reduz preço da energia no mercado à vista é controversa
Enquanto o cenário hidrológico segue indefinido, o governo tenta reduzir em pouco mais de 50% o teto do Preço de Liquidação de Diferenças (PLD), de R$ 822,83 para R$ 388,04 o MWh, para conter as perdas do setor e garantir o sucesso do leilão de dezembro. O PLD corresponde ao preço da energia no mercado à vista. Dessa forma, quando expostas ao mercado livre, as distribuidoras comprariam energia pela metade do preço que pagam hoje. Isso teria reflexo nas tarifas, já que todo o custo da exposição é repassado posteriormente aos consumidores.
A medida, contudo, divide opiniões em relação ao seu propósito. "A ideia é reduzir o teto do PLD e jogar a diferença de custo nos encargos. Mas e quem pagaria esses encargos?", questiona Cristopher Vlavianos, Presidente da Comerc Energia.
Por enquanto, ainda não está claro quem teria de arcar com a diferença de preço. É provável que esse custo seja rateado entre os agentes do setor elétrico, incluindo as distribuidoras ou seja, em algum momento essa conta deve chegar ao bolso do consumidor. "As mesmas distribuidoras que serão beneficiadas pela medida terão de assumir os encargos", afirma o gerente de regulação da Safira Energia, Fábio Cuberos.