O dólar, que acumula queda de quase 6% este ano, tende a continuar caindo e romper a barreira de R$ 3, preveem analistas do mercado financeiro. Desde maio de 2015 isso não acontece. Segundo os especialistas, embora o país ainda esteja em recessão e a moeda tenha fechado ontem em leve alta (de 0,6%, a R$ 3,085), a expectativa de retomada econômica, queda de juros, reformas e nova repatriação de recursos, além de um cenário externo mais benévolo, vem proporcionando um fluxo ininterrupto de entrada de recursos.
Mesmo concordando que um patamar ainda mais baixo para o dólar não seria sustentável por muito tempo, os economistas já antecipam queda mais intensa da inflação e dos juros, devido à desvalorização da divisa. O banco Santander, por exemplo, não descarta que a Taxa Selic recue para menos de 9% ao fim do ano por causa disso.
“Existem dois fundamentos importantes que moveram a moeda nos últimos meses. Um deles é euforia com o Brasil, a crença de que a redução de juros vai trazer retomada econômica. Outro é a forte valorização do minério de ferro, da soja e da celulose, produtos importantes para o país”, afirma Maurício Molan, economista-chefe do Santander.
Abaixo de R$ 3
Os fatores elencados por Molan se refletiram no risco-país associado ao Brasil, medido pelo credit default swap (CDS, espécie de seguro contra calote da dívida soberana). O indicador recuou de 280 para 228 pontos centesimais (quanto maior o número, mais arriscado é o investimento). Dessa forma, o risco-país brasileiro voltou ao patamar de maio de 2015, quando o Brasil ainda tinha o chamado grau de investimento.
“A lógica dos fundamentos sugere um dólar maior do que é hoje, mas estamos em um período de exceção”,diz Alvaro Bandeira, economista-chefe do Modalmais, referindo-se ao contraste entre a atividade econômica atual e o otimismo dos investidores.
Segundo Gustavo Rangel, economista-chefe para América Latina do ING Financial, parte do movimento de valorização do dólar é explicada pelo apetite dos investidores internacionais por carry trade, aplicações especulativas com recursos captados em países de juros baixos e que lucram com as taxas elevadas em outros.
Como os juros reais (descontada a inflação) do Brasil continuam os maiores do mundo, o país é o destino preferencial desse tipo de operação. A disposição dos investidores para o carry, observa o analista, está embasada no otimismo com relação ao crescimento da economia global este ano.
“O dólar deve romper o patamar dos R$ 3 e cair muito mais, até R$ 2,80, por exemplo. E não tem muito o que o BC possa fazer. Ele pode até tentar reduzir a velocidade desse movimento, parando de rolar os swaps, por exemplo”, avalia Rangel, ponderando, no entanto, que não acredita que o dólar a R$ 2,80 seja sustentável a longo prazo, devido a seu impacto nas contas externas brasileiras.
Setor exportador
Para o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, embora já fosse prevista, a tendência de valorização do real está provocando perdas para o setor exportador. Entre outubro e dezembro do ano passado, diz, quando o dólar já estava em queda, o número de empresas exportadoras diminuiu em 196, enquanto o de importadoras aumentou em 368:
“Isso atinge, sobretudo, pequenas e médias empresas. Por isso pleiteamos a elevação, de 2% para 5%, da alíquota do Reintegra (programa que reembolsa parte dos impostos da cadeia exportadora) e uma queda mais rápida dos juros.”
Taxa Selic
O recuo mais veloz dos juros deve acontecer, mas justamente por causa do dólar barato. Para Molan, se o câmbio se mantiver no patamar de hoje por muito mais tempo, a Selic pode ficar abaixo das previsões atuais (9,75% ao fim de 2017, para o Santander). Isso por causa do seu impacto na inflação: produtos importados, como alimentos (trigo e milho, por exemplo) e bens duráveis (veículos, eletrodoméstico e máquinas) tendem a ficar mais baratos.
“Pode ir para 9% ou menos este ano. Ao longo do ano que vem, pode ir para a casa dos 7%, se o câmbio se mantiver assim”, prevê o economista do Santander. No mercado de ações, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) recuou ontem 0,24%, aos 67.814 pontos.