Moeda só não se valorizou mais perante ao real devido ao entusiasmo persistente do mercado com Bolsonaro como presidente.| Foto: Vanderlei Almeida/AFP

Ao ver o dólar subir e fechar em R$ 3,76 e a Bolsa cair 2,8% nesta quarta-feira (10), muitos podem pensar que o namoro do mercado financeiro com o candidato do PSL à Presidência da República, Jair Bolsonaro, acabou. Mas não é bem assim. Sem o fator interno das eleições e da possibilidade de vitória de um candidato que tem como guru um economista liberal, a cotação da moeda norte-americana estaria um pouco maior, em R$ 3,96.

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A informação é da corretora Guide Investimentos, que criou um modelo estatístico que consegue determinar o peso de componentes internos e externos na cotação do dólar. O modelo observa mais de 30 moedas de maior liquidez no mundo, incluindo o real, e retira delas quatro variáveis capazes de explicar o movimento de câmbio global.

“Essas quatro variáveis explicam 95% da variação do câmbio no mundo. Essas variáveis não são observáveis, mas embutem informações que a gente costuma acompanhar, como o diferencial de juros dos Estados Unidos e preços de commodities”, explica o economista-chefe da Guide, Victor Candido. “Eu pego essas quatro variáveis e eu regrido elas em relação ao real, diariamente, num período de 20 anos [ou desde 1999, quando câmbio realmente começou a flutuar no país]. Ao fazer isso, eu crio o real sintético, que é o preço do câmbio no Brasil considerando apenas os fatores externos”.

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Ao comparar o comportamento do real ao do real sintético, a Guide Investimentos consegue identificar o peso dos fatores domésticos no câmbio. Na terça-feira (9), quando o dólar fechou em R$ 3,75, o modelo da Guide apontava para uma cotação de R$ 3,95 se fossem considerados apenas os fatores de pressão externa. Na ocasião, o que ajudou o real foi ainda o entusiasmo do mercado ainda em torno da votação expressiva de Bolsonaro no primeiro turno.

Nesta quarta (10), moeda teve alta de 1,42% e fechou em R$ 3,7561, influenciada principalmente pelo cenário externo – as bolsas norte-americanas despencaram como reflexo do agravamento da guerra comercial entre EUA e China. As falas confusas de Bolsonaro sobre reforma da Previdência e privatizações, porém, também colaboraram para a desvalorização do real.

Ainda na terça (9), Bolsonaro disse que não usará proposta de Temer para a Previdência. Em entrevista à TV Bandeirantes, Bolsonaro também disse que não dá para vender as estatais para qualquer um. “A gente vai vender para qualquer capital do mundo? Você vai deixar a nossa energia na mão da China? A gente pode conversar sobre distribuição, mas sobre geração não”, afirmou ele. As ações das estatais caíram nesta quarta (10) influenciadas por essas declarações. A Eletrobras foi a mais prejudicada, com queda de 8,86%.

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Na mesma entrevista, o ranço estatista de Bolsonaro também respingou na Petrobras. Ele disse que a empresa "não pode ter uma política predatória" para os combustíveis e que a Petrobras não pode se "salvar" e "matar a economia", em referência à política de paridade internacional praticada pela estatal, na qual acompanha internamente os preços praticados nas principais bolsas de negociação de commodities. Essa política foi adotada durante o governo de Michel Temer, na gestão de Pedro Parente no comando da petroleira. As ações da empresa abriram o pregão de quarta (10) em queda e fecharam com recuo de -2,87%, a R$ 26,05.

São declarações que vão na contramão do que o economista de Bolsonaro, Paulo Guedes, costuma pregar. Ainda assim, como dito no início, Bolsonaro continua com certo crédito com o mercado. Historicamente, 80,2% da pressão cambial sobre o real vem do cenário externo segundo o modelo da Guide e mesmo num dia ruim lá fora o resultado do dia não foi tão negativo.