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Economia mergulha em incerteza inédita após divulgação de gravações

 | Pedro Ladeira/AFP
(Foto: Pedro Ladeira/AFP)

A reação da já combalida economia às gravações envolvendo a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em suposto crime de obstrução de Justiça será a paralisia total. Diante da incerteza que alcançou o mais alto grau ontem, economistas afirmam que tudo vai parar: ninguém compra nada, empresário não investe na expectativa do que acontecerá a partir de hoje.

Além das gravações comprometedoras, a indefinição de qual política econômica o agora ministro Lula vai adotar traz mais incerteza. Não se sabe se o governo vai tentar forçar o crescimento, por meio do estímulo ao consumo, ou se será mais conservador ao indicar a volta ao governo de Henrique Meirelles, que, em 2003, não titubeou em subir os juros básicos de 22% para 26,5% ao ano para combater uma inflação que passava de dois dígitos.

“Nesse contexto de Lula ministro, vazamento de gravações, a economia fica parada, e as coisas tendem a piorar. Essa situação toda tem uma carga muito negativa, matando no nascedouro qualquer expectativa de melhora, seja no campo inflacionário, seja na área fiscal. É praticamente impossível uma recuperação das expectativas nesse contexto. E, sem isso, a economia não anda”, afirmou Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central.

A crise política tomou de vez o assento da crise econômica, diz o economista da Fundação Getulio Vargas (FGV) Armando Castelar.

“Até então, a crise econômica vinha dominando o processo. A preocupação com a questão fiscal, com a inflação e os impactos na crise política. Chegou-se a anunciar a reforma da Previdência. Agora, a política tomou o assento da economia, o que é mais paralisante ainda. Principalmente porque temos opções de amplo espectro: de muito intervencionista a Henrique Meirelles, mais conservador. Ninguém sabe exatamente o que vai acontecer. O momento é de não se comprometer”.

A presidente Dilma veio a público ontem comentar a indicação de Lula para o ministério e, em entrevista coletiva, afirmou que não haveria mudanças bruscas na política econômica. Dilma destacou que Lula, quando foi presidente, defendeu o ajuste fiscal.

Segundo Loyola, apesar dessa garantia da presidente Dilma, o que se vê é a tendência de o governo voltar a dar crédito via bancos públicos para tentar reativar a economia:

“Essa é uma política perdedora e aloprada. O governo acabou e luta para não ser enterrado. É um governo zumbi”.

Prevendo rumos

No mercado financeiro, analistas afirmam que a tomada de posição ficou mais difícil do que nunca. Mas a contundência das gravações faz especialistas apostarem em reação positiva dos investidores em um primeiro momento, antecipando mudança de governo após a divulgação das conversas.

“Uma parte do mercado pode interpretar que estamos vivendo os estertores de um governo, o que é positivo do ponto de vista dos investidores”, afirmou Maurício Pedrosa, estrategista da Queluz Asset Management. “Mas o mercado odeia incerteza, e sempre põe isso nos preços. E não existe quadro maior de incerteza que este, estamos sendo surpreendidos a cada meia hora”.

Embora admita ser difícil traçar o day-after, Arnaldo Curvello, diretor de Gestão de Recursos da Ativa Investimentos, também aposta em reação positiva por parte dos investidores.

“O mercado vai embutir nos preços um cenário sem Dilma, o que significa Bolsa em alta”, que observa que o ritmo de virada de expectativas é inédito. “Com as notícias da semana passada, o mercado antecipou saída rápida do governo, e os preços subiram. Com a história de que Lula viraria ministro, o mercado desfez posições. Agora, esse tipo de notícia de hoje (ontem) é muito difícil de precificar. É muito “nunca antes na história desse país”.

Paralelo com afastamento de Collor

Margarida Gurierrez, professora da Coppead/UFRJ, considera que a entrada de Lula no governo aumenta as incertezas. Para ela, a política econômica está descaracterizada e, com a volta do petista, essa condição se intensifica. Na avaliação da economista, até o governo de Fernando Collor de Mello tinha uma visão mais clara — embora equivocada — dos rumos para a política econômica.

“A política de Collor tinha uma consistência, embora tenha sido errado o confisco. Hoje, qual é a política econômica? Ninguém sabe’

Para o professor da PUC Luiz Roberto Cunha, o governo Dilma tentou blindar a economia ao nomear Joaquim Levy, um fiscalista. Mesma atitude que Collor tomou ao entrar no processo de impeachment. Nomeou Marcílio Marques Moreira para o Ministério da Economia e Francisco Gros para o Banco Central.

“Naquela época, conseguiu-se até acumular reservas. A Dilma tentou fazer isso com Levy, mas não deu certo. Mesmo que Lula tente a alternativa Meirelles, não funciona mais. A deterioração da economia é muito grave, muito maior”.Segundo Cunha, se a opção for estimular a economia, a dívida pública vai explodir.

“Vai ter fuga de capitais, inflação alta, e o país pode ser obrigado a impor controles de capital”, disse.

Para Margarida, a renúncia de Dilma abreviaria o processo de paralisia pelo qual passa o governo:

“Estaria encurtando esse período de muitas incertezas na política e, consequentemente, na economia. O vice, Michel Temer, provavelmente poria em prática o programa do PMDB que é estruturante, mais na linha ortodoxa, privilegiando o ajuste fiscal e as reformas. Não seria fácil, mas estaria abreviando os efeitos”.

Lula pode ajudar?

Fernando Marcato, sócio da GO Associados, discorda. Para ele, a nomeação de Lula pode interromper o marasmo no governo de forma menos traumática que um impeachment. O economista, que também é advogado, avalia que o vazamento da conversa de Lula com Dilma não traz problemas jurídicos e que, mesmo em meio à tensão política, é possível que Lula consiga aprovar reformas no Congresso para destravar a economia.

“Imagina o empresário que está sofrendo com o país afundando? Uma alternativa é passar por um longo processo de impeachment, a outra é trazer de volta um presidente que, no passado, criou pontes com a militância e o empresariado. Na cabeça do empresário, será que não vale a pena aguardar um pouco para ver se o Lula vai fazer isso?”, questiona Marcato.

Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central, avalia que o cenário para a economia já está dado, diante da perspectiva de mais um ano de recessão. Lula pode ajudar na área fiscal, mas ainda é cedo para avaliar.

“Acho que se ele só entrar para apagar fogo, para sobreviver, não vai adiantar. Ele tem que fazer a política pensando na frente”, afirmou.

Luis Otavio Leal, economista-chefe do Banco ABC Brasil, resume as incertezas em relação ao que esperar de Lula.

“Qual vai ser o Lula assumindo? Antes ou depois da Carta ao Povo Brasileiro? Fazer ilações sobre o comportamento dele é difícil. Ele tem um discurso ruim para o mercado e um histórico que é bom”.

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