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O Ministério da Economia voltou a estudar a criação de um fundo com recursos das privatizações e de parte dos dividendos (parcela do lucro) que a União recebe de suas estatais para viabilizar um programa de renda básica. Esse fundo se chamaria Fundo Brasil e o programa seria o Renda Brasil, que vem sendo planejado há meses pelo governo para substituir o Bolsa Família, mas até o momento não saiu do papel por falta de uma fonte de recursos.
A ideia já havia sido aventada pelo governo no passado, conforme mostrou a Gazeta do Povo, mas acabou ficando engavetada em meio a outras prioridades. Agora ela voltou à tona, diante do entendimento do ministro da Economia, Paulo Guedes, de que será necessário lançar um programa social mais robusto para fazer frente ao fim auxílio emergencial, que beneficiará cerca de 45 milhões de pessoas neste ano. O auxílio termina em agosto.
"Nós vamos criar o Fundo Brasil: nós vamos pegar a riqueza que o Brasil tem e vamos permitir, vamos compartilhar com os mais pobres", afirmou o ministro em audiência pública no Senado em março. Declarações semelhantes foram dadas neste mês, em eventos com investidores.
Segundo Guedes, o fundo seria formado pelo dinheiro da venda de estatais e de outros bens públicos, como imóveis da União, e de cerca de 20% dos dividendos que a União recebe de suas estatais. A ideia conta com o aval do Planalto.
Em 2019, a União recebeu R$ 20,9 bilhões em dividendos e participações de suas estatais, segundo dados do Tesouro Nacional. No passado, devido à pandemia de Covid-19 que afetou a receita das empresas, o valor repassado foi bem menor: R$ 6,6 bilhões. Todo esse dinheiro foi para o caixa do Tesouro para ajudar no resultado das contas públicas.
Guedes acredita que a ideia do Fundo Brasil seria bem aceita pela sociedade, pois seria entregar uma parte do patrimônio brasileiro na mão dos mais pobres, sem intermediários. “Isso faz com que o povo sinta que as estatais são dele. Isso é patrimônio do povo brasileiro. Já está na hora de isso chegar ao povo brasileiro direto, sem intermediários. O dinheiro tem de chegar aos mais pobres. Então, vamos robustecer os programas sociais”, explicou.
A eliminação de intermediários, afirma o ministro, se mostrou exitosa no ano passado, quando o governo conseguiu reduzir temporariamente a pobreza com o auxílio emergencial de R$ 600. "Aprendemos a lição da pandemia do ano passado: vamos dar dinheiro na veia para os pobres! Nós não precisamos de tantos intermediários, de tanta gente fingindo que está ajudando os pobres, sendo que, na verdade, nós poderíamos ajudá-los como fizemos no ano passado”, afirmou Guedes.
Nas suas declarações recentes, o ministro não detalhou qual seria o valor do benefício do Renda Brasil, que seria financiado via Fundo Brasil. Mas ele deu a entender que seria maior que a média do Bolsa Família, que está em torno de R$ 200. “Em vez de ganharem R$ 200, os mais pobres poderiam receber R$ 300, R$ 350, R$ 600”, citou o ministro a senadores que o acompanhavam na audiência pública em março.
Guedes também não explicou como o programa caberia dentro do teto de gastos, a regra que limita o crescimento de grande parte das despesas da União. O Fundo Brasil ajudaria a financiar o Renda Brasil, mas o programa ainda esbarraria no teto para ser incluído no Orçamento. No ano passado, a equipe econômica queria acabar com programas sociais ineficientes, mas a ideia foi barrada pelo presidente Jair Bolsonaro.
O Renda Brasil seria uma versão turbinada do Bolsa Família (BF), com valor maior e mais famílias beneficiadas. O objetivo é, além de ajudar os mais pobres, dar ao governo uma marca social que pode ajudar na reeleição do presidente, assim como ocorreu com o ex-presidente Lula, que lançou o BF em seu primeiro mandato ao unificar e ampliar programas já existentes.
Dívida pública e outros fins
A senadores e a investidores, Guedes falou que, além de ajudar a financiar o Renda Brasil, os recursos do novo fundo iriam ajudar a abater a dívida pública, uma das principais preocupações da equipe econômica para garantir a solidez das contas públicas. No ano passado, a dívida pública chegou a 89,3% do PIB, puxada pelas despesas com a pandemia. O Tesouro projeta que a dívida só vai começar a cair a partir de 2026.
Caso o Congresso sinta necessidade, Guedes disse concordar em agregar outras duas finalidades para uso dos recursos do fundos: investimentos e desconto nas dívidas de estados e municípios, desde que os entes adotem medidas de ajuste de suas finanças.