A elevada carga tributária, os juros altos e, em especial, a valorização do câmbio vêm afetando o desempenho de alguns setores da economia brasileira. No entanto, o prejuízo maior se verifica nos níveis de emprego, que permanecem praticamente estagnados, ainda que, por exemplo, a produção industrial do país continue apresentando ligeiras variações positivas, porém estáveis. A constatação é de economistas entrevistados pelo GLOBO ONLINE.
Em abril - e em relação a março, segundo dados do IBGE - a produção industrial brasileira caiu 0,1%, a primeira taxa negativa em seis meses. No entanto, em relação a abril do ano passado, houve, crescimento de 6%, marcando a décima elevação e o melhor resultado desde junho de 2005 (6,4%). Nos quatro primeiros meses de 2007, a indústria nacional expandiu-se 4,3% em comparação a igual períododo ano anterior.
Já o desemprego não tem mostrado redução. Segundo o IBGE, apenas nas seis maiores regiões metropolitanas do Brasil, a taxa de desemprego do país não cedeu em abril como era esperado e ficou em 10,1%, a mesma de março. No total das seis regiões, 2,3 milhões de pessoas estavam desempregadas e em busca de trabalho em abril.
Na indústria, no entanto, o emprego cresceu pouco, apenas 0,5% em abril em relação ao mês anterior, na série livre de influências sazonais. Em relação a abril de 2006, a alta é de 1,7% .
O economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Edgard Pereira atribui, em especial, ao câmbio o descompasso entre as evoluções da produção industrial e do desemprego no país, observado em vários segmentos econômicos.
Conforme explicou, o fator mais relevante desse fenômeno está no crescimento do componente importado da produção industrial. Segundo Pereira, cada vez mais estão sendo importadas matérias-primas, bens intermediários, partes e peças que antes eram produzidas no país.
O economista cita, como exemplo, a indústria automobilística, onde a produção cresce a taxas expressivas, mas o nível emprego não avança na mesma proporção. E isso, observa, porque a participação de componentes importados na produção é muito maior. Em outras palavras, há mais produção, mas com menor demanda de insumos internos.
Por causa do câmbio valorizado, as empresas se ajustam, procurando reduzir custos e, nessa redução, fazem susbtituição de insumos. Quando se olha no agregado, o que se constata é que a produção industrial consegue crescer mais rapidamente, mas gerando menos emprego assinala.
A explicação é completada pelo economista Luiz Dias Bahia, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), órgão vinculado ao Ministério do Planejamento.
O que temos observado, a partir da abertura comercial na década de 1990, é que a indústria reduziu muito o emprego, devido à racionalização do processo produtivo e à modernização dos equipamentos. A produção fisica tem crescido, mas com menos quantidade de emprego. É uma espécie de "poupança de mão-de-obra" que se agravou da década de 1990 para cá.
Edgard Pereira ressalta que as taxas de crescimento do consumo, da produção e do emprego seguem um modelo tipo "escadinha": no primeiro caso, a evolução é de 7%; no segundo, de 4%; e no caso do emprego, os índices variam pouco e seguem praticamente estagnados.
Apesar da estagnação nos níveis de emprego, os salários e o número de horas pagas aos trabalhadores da indústria aumentaram em abril deste ano. No caso das horas pagas, a elevação foi de 0,9% em relação a março deste ano. Em relação a abril de 2006, houve crescimento de 1,6% nas horas pagas.
Já o valor da folha de pagamento dos trabalhadores subiu 1,4% de abril de 2006 para abril de 2007, e 3,7% em relação a março deste ano.
China
Para o economista do Iedi, o fator China ainda não afeta os níveis de emprego, mas o fenômeno deveria ser motivo de preocupação do governo, já que, em breve, o gigante asiático deve começar a atuar também no segmento automobilístico, tradicionalmente grande mobilizador de mão-de-obra no país.
Os chineses estão presentes em todos os setores: desde bens de consumo mais simples, como calçados e vestuário; passando pelo "miolo" da cadeia produtiva, como matérias-primas para a indústria de plásticos e de fertilizantes; até à ponta mais sofisticada, como produtos eletroeletrônicos diz.
Na opinião de Luiz Dias Bahia, do Ipea, um dos motivos pelos quais setores como o de calçados e vestuário estão enfrentando problemas em relação à concorrência estrangeira, é o de os empresários terem adotado uma estratégia equivocada.
Segundo o economista, um estudo ainda em desenvolvimento pelo Ipea já constatou que os empresários desses têm apostado na redução de custos, como forma de enfrentar os produtos chineses e indianos, quando, de acordo com Luiz Bahia, deveriam investir em estratégias de inovação de produto.
Os Estados Unidos também sofreram com a invasão de produtos da China de outros países asiáticos, mas reagiram. E não apenas criando criando barreiras alfandegárias. Só isso não protege nem o emprego, nem a produção. O que eles fizeram foi investir fortemente em moda, em qualificação profissional, em inovação de produto. Com isso, acabaram reduzindo a participação do produto do leste asiático a 20% explica.
E essa inovação é necessária, porque daqui a pouco virão os automóveis chineses acrescenta, em tom de alerta, o economista do Iedi, referindo-se à montadora chinesa Chery, que anunciou a instalação de uma fábrica em Montevidéu (Uruguai), ainda este ano, e outra de autopeças em Buenos Aires, ambas em sociedade com o grupo argentino Macri.
O investimento total é de US$ 100 milhões. Segundo estimativas, até o fim do ano, deve começar a chegar ao Brasil o modelo QQ, que deverá ser o carro 0 km mais barato do país.
O economista-chefe do Iedi considera que a única saída para evitar conseqüências piores sobre os níveis de emprego é o reposicionamento da taxa de juros, para diminuir o custo de capital e, como efeito derivado, um ajustamento da taxa de câmbio.
Além de custos de produção e uma carga tributária menores, Edgard Pereira defende também um novo ciclo de investimentos que permita inclusive uma maior modernização da indústria nacional que estimule a geração de empregos.
Nos últimos cinco anos, a taxa de crescimento acumulado da produtividade da indústria é da ordem de 20% mas, para deslanchar um novo período de investimentos que rejuvenesça a indústria brasileira, precisaríamos de condições mais amigáveis conclui.