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Escândalo na Petrobras

“Efeito Lava Jato” pode frear economia

Petrobras gastou em 2013 R$ 104 bilhões em obras e equipamentos, o equivalente a 2,2% do PIB | Bruno Domingos/Reuters
Petrobras gastou em 2013 R$ 104 bilhões em obras e equipamentos, o equivalente a 2,2% do PIB (Foto: Bruno Domingos/Reuters)

A devassa promovida pela Operação Lava Jato nos processos de compras e investimentos da Petrobras pode ter efeitos positivos para a estatal no futuro, a começar pelo uso mais racional de seu dinheiro. Mas, no curto prazo, o escândalo de corrupção tem o potencial de reduzir significativamente os desembolsos da estatal, com impactos nada desprezíveis sobre a economia brasileira.

INFOGRÁFICO: Veja os índices de investimentos da Petrobras

No ano passado, a petroleira gastou R$ 104 bilhões em obras e equipamentos, o equivalente a 11,9% de todos os investimentos feitos no país, ou 2,2% do Produto Interno Bruto (PIB). Isso significa que, em um prazo de 12 meses, uma queda de 20% nos investimentos da Petrobras reduziria em pelo menos 2,4% a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), indicador que reflete o total investido por empresas e governos em máquinas e na construção civil.

Com a queda nos investimentos, o crescimento econômico brasileiro também seria mais fraco – ao menos 0,4% menor, na hipótese acima. Não é pouca coisa, ainda mais em tempos de estagnação: a previsão do mercado financeiro é que a economia brasileira avance apenas 0,2% neste ano e 0,8% em 2015.

Os prejuízos à economia tendem a ser ainda maiores, pois os investimentos da Petrobras sustentam milhares de fornecedores, que por sua vez têm contratos com outros tantos subfornecedores. Muitas dessas empresas dependem exclusivamente da estatal, que praticamente detém o monopólio do setor no país, com 90% da produção e 100% do refino de petróleo.

Paralisia

"O efeito das investigações não virá apenas em 2015. Ele já aparece. Os relatos são de que existe uma certa paralisia nos investimentos da empresa há alguns meses", diz o economista Cláudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios. "Fornecedores já estavam tendo dificuldade para receber aditivos contratuais, e isso piorou recentemente, porque aditivo virou palavrão."

Com centenas de contratos investigados por suspeita de superfaturamento e outros ilícitos, a Petrobras está se cercando de cuidados antes de fechar novos negócios. Além disso, poderá ter problemas para financiar seu bilionário plano de negócios. Enquanto não publicar o balanço do terceiro trimestre devidamente auditado, o que só deve ocorrer em 2015, a Petrobras não conseguirá levantar recursos nos principais mercados de crédito do planeta. Se perder o título de "grau de investimento", pior ainda.

Gesner Oliveira, sócio da consultoria GO Associados, cita outro obstáculo. "Um programa de investimentos como o da Petrobras exige muita atenção, mas, nas atuais circunstâncias, a direção da empresa não está focada nele. Sua energia e seu tempo estão sendo absorvidos pelas investigações da Lava Jato."

Governo teme obras paradas

Além de a Petrobras reduzir seus investimentos, outra possível consequência da Operação Lava Jato preocupa o governo federal. Se as empreiteiras envolvidas no escândalo – que estão entre as maiores do país – forem declaradas inidôneas, não poderão participar de licitações, o que ameaçaria os projetos de infraestrutura do Planalto para os próximos anos.

"O governo tinha engatilhado uma discussão sobre investimentos em portos e ferrovias, e a continuação das obras em aeroportos e rodovias. As denúncias não vão interromper ou acabar com o programa de concessões, mas causam um ruído muito grande", diz o economista Gesner Oliveira, da GO Associados.

O presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Augusto Nardes, afirmou na semana passada que, com a eventual interrupção das obras tocadas por essas empresas, o país "praticamente para". Por isso, ele defendeu que os contratos sejam repactuados, com a devolução de valores superfaturados e afins, sem declarar as empresas inidôneas.

As suspeitas de irregularidades em contratos da construtora Delta, declarada inidônea pela Controladoria-Geral da União (CGU) em 2012, resultaram no que ficou conhecido como "faxina" no Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (Dnit). Na ocasião, o processo de relicitação de contratos derrubou os investimentos.

Alternativas

De 2004 a 2014, a União pagou R$ 11,4 bilhões às empreiteiras citadas nas investigações da Lava Jato, segundo a organização Contas Abertas. A tese de que o país "para" interessa às empreiteiras, mas há quem acredite que existam alternativas, entre elas dar mais espaço a empresas médias, muitas vezes "engolidas" pelas gigantes nas licitações, e abrir o mercado a empresas estrangeiras.

Ações caíram 73% desde 2008

A euforia provocada pelos rumores da escolha de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda fez as ações da Petrobras dispararem quase 12% na sexta-feira. Ainda assim, o desempenho na Bolsa da estatal está distante de seus melhores momentos.

As ações preferenciais caíram 16% desde o início do ano. Papéis comprados na megacapitalização da companhia, em 2010, acumulam perdas de 46%. Em relação ao valor recorde atingido em 21 de maio de 2008, de R$ 52,51, a desvalorização chega a 73%. Naquela ocasião, o valor de mercado da petroleira alcançou US$ 309,5 bilhões. Na sexta-feira, estava em US$ 71,5 bilhões.

"Para quem tem ações, recomendamos esperar. Se vender agora, vai pegar preços que estão entre os mais baixos dos últimos dez anos. Para quem não tem, sugerimos que continue assim por enquanto, porque o cenário deve seguir conturbado", diz Antônio Marmo, planejador financeiro da Praisce Capital.

O empresário Gastão Luiz Mendes e Silva, que investe na Bolsa há oito anos, é mais otimista. Depois de aproveitar o "rally eleitoral" para conseguir alguns ganhos de curto prazo, ele mantém ações da Petrobras. "Penso no médio prazo. As perspectivas são boas, até pelas reservas de petróleo da empresa. E acho que a governança vai melhorar depois do escândalo", diz.

A avaliação dele é parecida com a do Deutsche Bank, que na quinta-feira recomendou a compra de ações da companhia com o argumento de que, dentre todas as petroleiras, a Petrobras terá o maior aumento de produção nos próximos anos. Aliás, de 17 bancos e corretoras consultados pela Bloomberg, cinco recomendam a compra dos papéis e doze, manutenção. Nenhum sugere a venda.

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