Em janeiro deste ano, Anfavea previu alta de 1,4% na produção de carros em 2014. Hoje, expectativa é fechar ano em queda de 10%| Foto: Divulgação Volkswagen/Fotos Públicas

Ociosidade assombra fabricantes de carros

Apesar de os números absolutos do mercado brasileiro não serem desprezíveis – é o quinto maior em volume de vendas em todo o mundo –, a crise atual e as revisões de crescimento colocam em cheque alguns investimentos realizados pelas montadoras ao longo dos últimos anos. Consultorias de mercado estimam que a ociosidade das fábricas no Brasil tenha alcançado 45% das capacidades de produção, com chances reais de que este índice chegue a 50% em 2015.

De acordo com a Anfavea, os investimentos das montadoras em novas fábricas, linhas de montagem e equipamentos somam R$ 77 bilhões até 2018, sendo R$ 13 bilhões em atividades de engenharia e pesquisa e desenvolvimento de novos produtos. Com uma série de plantas novas, a capacidade produtiva está se reforçando – movimento que não é acompanhado pelo mercado consumidor. "Muito disso acontece pelas exigências de produção local que o governo brasileiro impõe às montadoras, mas resulta em ociosidade para as fábricas", afirma o diretor da IHS Automotive no Brasil, Robson Villagro.

No curto prazo, as empresas contornam a situação com redução de turnos e antecipação de férias aos seus funcionários. "No entanto, isso não é saudável para as empresas. Existe uma capacidade instalada que não é utilizada. Isso se converte em prejuízo para as fabricantes", explica.

Visão

Mais do que alguma falha de avaliação sobre o mercado interno, a alta taxa de ociosidade é justificada pelo planejamento a longo prazo. Com um crescimento galopante dos últimos dez anos, as indústrias não apostavam em uma retração de mercado tão intensa. Além do mais, o Brasil ainda é uma aposta das empresas como fornecedor de produtos para todos os outros países da região.

"Em 2020, economias emergentes como China, Brasil, Leste Europeu, Oriente Médio e América do Sul representarão mais de 50% do mercado global de veículos leves", prevê Villagro.

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As quedas na produção e na venda de carros neste ano no Brasil e o baixo crescimento esperado para 2014 já tem um legado praticamente certo a médio prazo: as expectativas de crescimento do mercado automotivo brasileiro são bem mais modestas do que se imaginava. Enquanto consultorias de mercado cortam suas previsões, as indústrias temem que os investimentos recentes resultem em ociosidade das fábricas.

INFOGRÁFICO: Confira a projeção de vendas para o mercado automotivo

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A previsão mais recente, da consultoria Roland Berger, diz que em 2018 o mercado brasileiro será de 4,2 milhões de unidades vendidas – 23% abaixo da previsão divulgada no ano passado, que esperava um mercado de 5,5 milhões.

A produção também deve ser prejudicada. De uma previsão de 5 milhões de carros fabricados no país em 2018, a expectativa agora da consultoria é de 3,9 milhões – 21% a menos.

A queda de patamar é a consequência natural de um ano fraco para o mercado de veículos e de uma economia com poucas perspectivas de recuperação para um futuro próximo. "O mercado já apontava para uma curva descendente neste ano. Projetar um crescimento tão grande era ignorar os sinais que a economia nos dava", afirma a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif.

Para a economista, era de se esperar que, depois de um crescimento de 263% nas vendas de veículos nos 12 últimos anos, o ritmo se desaceleraria. "É uma revisão do patamar que chegaremos nos próximos anos", completa.

Para este ano mesmo, as expectativas já foram revistas na metade do ano. Em janeiro, a Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) previa um aumento de 1,4% na produção de carros até dezembro em relação a 2013. Hoje, a expectativa é fechar o ano em queda de 10%.

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"Até o fim do ano, a situação será difícil. Com o pessimismo do mercado e a retirada de incentivos fiscais do governo, não vejo muita perspectiva de recuperação no curto prazo", afirma o sócio da Roland Berger para o setor automotivo no Brasil, Stephan Keese.

Longo prazo

Para depois de 2015, no entanto, as previsões parecem menos pessimistas. A esperança é que o mercado apresente uma retomada sutil, mas sólida, puxada pela recuperação da confiança do consumidor.

"Bens como carros e imóveis, por exemplo, são muito prejudicados com a queda de confiança. Mas o mercado aponta para uma retomada para os anos seguintes", afirma Maurício Carvalho, gerente financeiro da Faurecia, fabricante de peças para automóveis.

O afrouxamento da restrição de crédito também deve puxar uma retomada em médio prazo. "Entre as principais linhas de crédito, o financiamento para a compra de carros caiu 9% até agosto em relação ao mesmo período do ano passado. Com um crescimento mais intenso, o acesso ao crédito deve se facilitar", completa a economista Zeina Latif.

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Balanço trimestral

América Latina prejudica resultado de grandes montadoras

Estadão Conteúdo

As concessionárias vazias e os pátios lotados de carros no Brasil são evidentes nos balanços das grandes montadoras, que já registram queda de dois dígitos nas vendas na América Latina e citam o mercado brasileiro como principal responsável pelo resultado ruim. Líder do mercado brasileiro, a italiana Fiat destacou que o faturamento na América Latina caiu 12% no terceiro trimestre na comparação com o mesmo período de 2013. Para explicar o resultado, a empresa apontou para o Brasil, onde foram entregues 17 mil carros a menos este ano, e para a Argentina, onde o número caiu 8 mil.

Na norte-americana Ford, a queda nas vendas na região já gera prejuízo. No terceiro trimestre, a empresa reportou perda antes dos impostos de US$ 170 milhões na América do Sul. Culpa da queda das vendas no Brasil, Argentina e Venezuela, que fizeram a receita recuar 18% no período. Para o ano, a empresa já prevê prejuízo de US$ 1 bilhão na região.

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