A Petrobras não foi a única empresa brasileira a sofrer com a mão pesada do governo. Envolvida em escândalos de corrupção e com um prejuízo bilionário em 2015, a Eletrobras acumula uma série de problemas semelhantes aos da petroleira.
O mais urgente deles foi a suspensão da companhia da Bolsa de Nova York, nesta quarta-feira (18), que pode levar a um rombo de até R$ 40 bilhões neste ano, deteriorando ainda mais as contas públicas.
INFOGRÁFICO: Os números da contabilidade da Eletrobras
Após três prorrogações, a companhia perdeu o prazo para apresentar aos reguladores americanos os balanços de 2014 e 2015 auditados com as perdas por corrupção, mesmo procedimento já exigido da Petrobras.
A KPMG, que audita os dados da empresa, se recusou a assinar os balanços. Com isso, os credores podem executar antecipadamente a dívida da companhia que varia entre R$ 15 bilhões e R$ 40 bilhões, segundo cálculos do próprio governo.
A incerteza sobre o tamanho do rombo da Eletrobras, aliás, é a pedra no sapato do novo governo para definir a nova meta fiscal.
Mas esse não é o único problema. Na prática, a Eletrobras está quebrada. Ao ser obrigada a baixar suas tarifas de energia para preços irrisórios para ajudar a bancar uma redução média de 20% na conta de luz – por determinação da MP 579, de 2012 – a estatal entrou em rota de colisão.
As tarifas da empresa despencaram, chegando a um valor médio de R$ 7,67 por MWh na área de distribuição, segundo cálculo do Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Elétrico (Ilumina), um preço inimaginável para um setor altamente regulamentado e concorrencial. De lá para cá, a empresa acumula prejuízo de R$ 35 bilhões.
Além disso, também foi condenada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a devolver cerca de R$ 7 bilhões (valor corrigido) em recursos do fundo setorial Reserva Global de Reversão (RGR), usado para empréstimos às empresas do setor elétrico. Como gestora do fundo, a estatal se apropriou indevidamente do dinheiro. Agora, promete brigar na Justiça para estender o pagamento ao longo de dez anos.
Crise de identidade
Para Diogo Mac Cord de Faria, sócio da LMDM e coordenador do MBA do Setor Elétrico da FGV, boa parte dos problemas vem da crise de identidade da empresa. “A Eletrobras é uma concessionária de energia ou é poder concedente?”, questiona.
Segundo ele, o governo obriga a empresa a participar dos leilões de energia e a concorrer com investidores privados praticando preços baixíssimos; por outro lado, a empresa atua gerindo cifras bilionárias de importantes fundos do setor elétrico.
“A MP 579 foi o golpe de misericórdia na Eletrobras. Os contratos das renovações têm tarifas que só cobrem 50% dos custos das subsidiárias. Depois que Furnas e Chesf foram proibidas de participar, os leilões esvaziaram porque os investidores privados não querem perder dinheiro com tarifas impraticáveis”, afirma.
Recorde negativo
De 2010 para cá, a Eletrobras perdeu mais da metade do seu valor de mercado, com o pior tombo em 2012. Entre as 20 empresas de capital aberto com pior desempenho no país no primeiro trimestre de 2016, a Eletrobras foi a que registrou o maior prejuízo - R$ 3,89 bilhões ante um lucro de R$ 1,25 bilhão no mesmo período de 2015.
Em cinco anos, desde 2010, o índice de alavancagem financeira da Eletrobras saltou de 25% para 48%. O indicador sinaliza que a empresa praticamente dobrou seu endividamento no mercado em relação total de seus ativos. Ou seja, se a Eletrobras fosse vendida hoje, metade do valor seria destinado para o pagamento da dívida da empresa.
Para tentar evitar o colapso da Eletrobras, o governo tentou, por meio de emendas a uma medida provisória, repassar parte do prejuízo da estatal aos consumidores, prática que se tornou recorrente no setor. No total, cerca de R$ 20 bilhões seriam diluídos nas contas de luz dos brasileiros, mas o Congresso barrou a medida. Na redação final do texto, o alívio nas contas da estatal será de apenas R$ 4,8 milhões.
Para analistas, a Eletrobras não pode existir da forma como existe hoje, com um pé no governo e outro no mercado. “Ou o governo impede a empresa de participar de novos leilões, e passa a gerí-la como uma autarquia, ou fecha o capital, e para de brincar de investidor sem fins lucrativos. A melhor, contudo, é opção é privatizar a empresa”, defende Mac Cord de Faria.