Conhecida como PEC dos Precatórios, a emenda à Constituição aprovada em 2021 que autorizou o governo federal a adiar o pagamento de dívidas reconhecidas pela Justiça pode gerar um impacto equivalente a até 2% do Produto Interno Bruto (PIB) de déficit em 2027, segundo relatório do Tribunal de Contas da União (TCU).
Proposta pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL), a Emenda Constitucional (EC) 114/2021 permitiu à União pagar apenas parte dos precatórios com vencimento nos cinco anos seguintes, de 2022 a 2026, além de mudar a metodologia para cálculo da correção do teto de gastos.
Assim, a União deixou de pagar R$ 43,8 bilhões dos R$ 89,1 bilhões originalmente comprometidos para precatórios em 2022, além de ganhar um espaço adicional de mais R$ 62,2 bilhões com a atualização da regra do teto. A manobra permitiu ao governo Bolsonaro aumentar o valor médio da parcela do Auxílio Brasil (atual Bolsa Família) em seu último ano de mandato, quando disputaria a reeleição.
À época da tramitação da PEC, o então ministro da Economia, Paulo Guedes, chegou a dizer que, sem o adiamento no pagamento de precatórios, o governo não poderia cumprir com todas suas despesas obrigatórias, incluindo o pagamento de salários de servidores.
No relatório, o TCU reconheceu os riscos fiscais da PEC, que, ao gerar um acúmulo progressivo de precatórios, implicará no aumento da dívida pública. A corte de contas ainda recomendou aos ministérios da Fazenda e do Planejamento e Orçamento que adotem, “de forma coordenada, as providências necessárias à elaboração de estimativas anuais do passivo acumulado em decorrência dos limites de pagamento de precatórios” instituídos pela emenda.
Ainda segundo o documento, as estimativas devem incluir a indicação de medidas compensatórias para a manutenção do equilíbrio fiscal, baseando-se em diferentes cenários de evolução de valores.
Rombo pode chegar a R$ 744,1 bilhões em 2026
De acordo com estudos da Instituição Fiscal Independente (IFI), que serviram de base à análise do TCU, a PEC dos Precatórios deve gerar um rombo fiscal que pode variar de R$ 121,8 bilhões a até R$ 744,1 bilhões ao fim de 2026, quando os limites para pagamento das dívidas perdem a vigência.
À época da tramitação da PEC, a Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara estimou que o texto poderia gerar até R$ 502 bilhões em precatórios até 2029, e de até R$ 1,45 trilhão até 2036.
O tribunal ainda alerta que o Congresso Nacional não formou uma comissão mista, prevista na EC 114/2021, para examinar os fatores que possam gerar mais precatórios e sentenças judiciais contrárias à Fazenda Pública da União. Conforme o texto, o grupo deveria ter sido criado até o dia 15 de dezembro de 2022.
Apesar disso, o órgão de controle não abriu processo que possa resultar em sanção aos responsáveis pela medida.
A análise do TCU partiu de uma representação apresentada pelos deputados Fábio Trad (PSD-MG) e Professor Israel (PSB-DF), que solicitavam uma avaliação dos efeitos da PEC dos Precatórios. Na corte, o processo foi relatado pelo ministro Antonio Anastasia.
Em um acordo para diminuir as resistências à PEC entre parlamentares ligados à educação, foram priorizados na fila de pagamentos precatórios da União com estados e municípios relacionados ao antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef).
Em 2022, excluindo as dívidas do Fundef, o volume total de precatórios era de R$ 42,17 bilhões, mas a União pagou somente R$ 19,87 bilhões, gerando um passivo de R$ 22,31 bilhões, a serem corrigidos pela inflação.
Para 2023, as dívidas chegam a R$ 73,99 bilhões, incluindo os valores não pagos no ano passado. O limite de pagamento por força da PEC, no entanto, é de R$ 17,1 bilhões, o que significa que, ao fim do ano, o passivo de precatórios ficará acumulado em R$ 56,85 bilhões.
Na instrução técnica, elaborada pela Unidade de Auditoria Especializada em Orçamento, Tributação e Gestão Fiscal (AudFiscal) do TCU, técnicos do órgão destacam que “o limite de gastos com precatórios alivia a execução orçamentária no curto prazo, mas pressiona no médio prazo”.
Esse alívio orçamentário propiciado pela PEC permitiu ao governo Bolsonaro fechar suas contas, e agora beneficia o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que anda à cata de receitas para cumprir as metas fiscais.
“A PEC 23/2021 [PEC dos Precatórios] continha uma escolha política de manejo da realidade fiscal diante da projeção de significativo crescimento das despesas com precatórios e da legislação vigente”, diz trecho do documento. “Escolha esta que é prerrogativa do Poder Executivo, cuja proposta de emenda cumpriu o processo legislativo sem vícios materiais e formais”, conclui o TCU.
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