A brasileira naturalizada argentina Isela Costantini cansou de ficar somente nas críticas à companhia aérea Aerolíneas Argentinas, estatal que acumulou perdas diárias entre US$ 1 milhão e US$ 2 milhões nos últimos dez anos. Em dezembro de 2015, ela assumiu o cargo de CEO da companhia a pedido do presidente argentino Mauricio Macri com a missão de transformar a empresa, que até então vinha sendo usada para fins políticos, em um negócio rentável.
A expectativa é que a companhia atinja o equilíbrio financeiro, ou seja, deixe de ter prejuízo, em 2018. A executiva também quer diminuir a dependência dos subsídios do governo e entregar uma organização estatal com cultura de empresa privada, focada para a eficiência e produtividade.
Desafios
O desafio, porém, é do tamanho dos problemas políticos e econômicos da Argentina. Com 12 mil funcionários espalhados por diversos países, o último balanço financeiro da Aerolíneas era de 2012, a empresa dependia dos subsídios do governo (uma média de US$ 600 milhões por ano) para funcionar e todos os dias chegavam cartas de credores.
Há, ainda, como herança, o custo da corrupção e da má gestão. A expectativa era que a companhia, composta de quatro empresas, encerrasse o ano de 2016 com um déficit de US$ 1 bilhão. “Encontrei uma empresa com ótima infraestrutura e operações sólidas, mas com péssima gestão”, disse durante palestra a convidados na 14.ª Feira de Gestão da FAE Centro Universitário, nesta quarta-feira (5), em Curitiba.
Se já não bastassem os problemas de gestão, a Aerolíneas Argentinas enfrenta também o problema de ter muitos donos. Por ser uma empresa estatal de mais de 60 anos que já passou duas vezes pelas mãos da iniciativa privada sem sucesso, os argentinos a consideram um patrimônio cultural. “Costumo comparar a Aerolíneas com a seleção argentina”, diz Isela.
Até mesmo quem não usa o serviço se preocupa com o futuro da companhia. A pressão dos seis sindicatos e dos próprios trabalhadores, relata, é enorme. Isso significa, principalmente, que ela não pode reduzir o quadro de funcionários e o presidente Macri nem pode mencionar a palavra privatização. “A ameaça de greve é sempre muito grande”, relata.
O custo de uma greve é tudo o que a companhia não precisa neste momento. Somente a paralisação deflagrada há duas semanas, que durou 16 horas, gerou perdas de US$ 5 milhões. “Fomos pegos totalmente de surpresa”, relatou a CEO da Aerolíneas Argentinas sobre o movimento dos pilotos que pedia reajuste salarial de 45%.
Ações
Apesar de todos os desafios, Isela acredita que será possível entregar uma empresa com contas no azul ao fim da sua gestão. Para isso, ela está virando a estatal – e os funcionários – de cabeça para baixo. A executiva reduziu 30% dos custos não operacionais, revisou os contratos em vigor, diminui de 3% para 1% a comissão paga para agências de viagens, promoveu ajustes comerciais e refinanciou as taxas de juros, que já caíram de 20% para 6%.
As medidas, implantadas ao longo dos últimos dez meses, já surtiram efeito. A expectativa é que a companhia termine 2016 com déficit de US$ 422 milhões (era esperado US$ 1 bilhão), sem ter feito nenhum corte expressivo no quadro de funcionários. Se chegará a meta de equilibro financeiro até 2018, dependerá do quão aderente estarão os funcionários da estatal à cultura proposta pela executiva.
Carreira
Filha do cardiologista argentino Constantino Costantini, que atua em Curitiba, Isela Costantini se formou em comunicação na PUC-PR. Depois de se formar no Brasil, cursou MBA na Loyola University of Chicago, com especialização em marketing e negócios internacionais. Entrou para a General Motors (GM) em 1998 e, depois de passar por vários cargos, virou presidente e diretora de negócios da montadora na Argentina, Uruguai e Paraguai. Lá promoveu uma série de transformações na empresa e ganhou, no ano passado, o prêmio de maior CEO da Argentina. Ela também foi eleita em 2013 uma das 50 mulheres mais poderosas no mundo dos negócios pela revista Fortune. Depois do período na Aerolíneas Argentinas, Isela deseja voltar ao mercado privado.
Raio-x
Confira números da Aerolíneas Argentinas na gestão Isela Costantini:
Grupo
Aerolíneas Argentinas, Autral, Optar e JetPaq
Fundação
1950
Frota
80 aviões de quatro tipos com oito anos de vida, em média
Destinos
24 destinos internacionais e 37 domésticos
Market share
82% do mercado nacional argentino
Pontualidade
86% de taxa de pontualidade até julho de 2016
Cancelamentos
98,6% de taxa de não cancelamento até julho de 2016
Passageiros
6,4 milhões até julho. Em 2015, foram 10,3 milhões.
Funcionários
12 mil
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