Cada um de nós tem simpatia por algum número. Alberto Saraiva, de 63 anos, fundador e atual presidente do Habib’s, gosta do zero. De preferência, à esquerda da vírgula. Foi ele quem lançou o modelo de esfiha abaixo de R$ 1. O que parecia impossível para muitos concorrentes foi replicado mesmo durante a recessão econômica, iniciada no segundo trimestre de 2014.
Às vésperas da votação do impeachment de Dilma Rousseff em abril, a empresa lançou o comercial “Caiu”. “O Habib’s uniu o Brasil, o preço da Bib’sfiha caiu para menos de um real”, era o slogan da campanha. Na época, o valor passou de R$ 1,98 para R$ 0,79 e foram vendidas 50 milhões de unidades.
“O zero à esquerda da vírgula tem o poder de se multiplicar em zeros à direita”, diz a teoria criada pelo empresário. “Sempre que a gente passa por alguma dificuldade, fazemos o uso do zero vírgula. Quando você usa o zero vírgula você consagra o seu negócio, porque ele tem uma capacidade tão grande de atrair clientes que salva qualquer empresa”, diz Saraiva.
A política de preço baixo sem perder a qualidade sempre foi uma constante na trajetória do médico nascido em Portugal que morou até os 17 anos em Santo Antônio da Platina, no interior do Paraná, antes de se mudar para São Paulo com os pais e irmãos.
Para Saraiva, preço baixo atrai cliente, e o volume de clientes gera lucro. O lema vem dando resultado. Sem detalhar dados financeiros, o empresário afirma que o grupo cresceu 12% em 2015, valor acima da inflação do período, que ficou em 10,67%. Para este ano, o percentual também deve ficar na casa dos dois dígitos, levando em consideração as novas lojas que estão sendo inauguradas.
30%
Apesar da preferência pelo zero nos dias atuais, a trajetória de Saraiva como empresário do ramo de alimentação foi marcada pelos 30%. Ele assumiu o negócio da família - uma padaria - aos 20 anos, após seu pai morrer em um assalto. A loja ia de mal a pior e, para não levar toda a família à falência, ele baixou o preço do pão em 30%.
A estratégia deu certo e a padaria foi vendida anos mais tarde. Mas Saraiva não parou por aí. Abriu pizzaria, pastelaria e casa de nhoque sempre repetindo a mesma receita de vender mais barato do que à concorrência. Todos os negócios geraram lucro e foram vendidos, enquanto paralelamente ele se formava em medicina pela Santa Casa de São Paulo.
O cozinheiro de mais de 70 anos
O Habib’s só foi surgir em 1988 após conhecer Paulo Abud, um cozinheiro de mais de 70 anos especializado em comida árabe que bateu em sua porta pedindo emprego. Na época, Saraiva já havia fincado os pés no comércio e deixado o diploma de médico apenas como um porta-retrato na parede. O amor à esfiha, apresentada por Abud, foi à primeira vista.
A culinária árabe também chamou a atenção dos clientes. E para atrair toda a família, Saraiva inclui no cardápio produtos que já tinha vendido antes, como a pizza e o pastel. Ele tirou, ainda, aquela cara de fast-food americano ao colocar atendentes que anotam e entregam o pedido do cliente na mesa.
De lá para cá, a empresa que começou com 20 funcionários se multiplicou. São 500 lojas espalhadas pelo Brasil, cinco spin-offs e 22 mil funcionários diretos. Há ainda planos de expansão para os próximos três anos.
Verticalização
Parte do sucesso da rede está também na estratégia de verticalização dos negócios. Para não ficar refém de fornecedores estrangeiros com preços e custos atrelados ao dólar, o empresário criou cinco empresas para atender o Habib’s. Elas produzem o leite, as massas e os sorvetes que são usados pelas lojas e cuidam do call center e das estratégias comerciais do grupo. Quase nada é terceirizado, tudo para controlar a qualidade e o preço.
Até as ideias de campanhas publicitárias saem de dentro do grupo - a execução fica a cargo de agências parceiras. “Quando dobraram os custos de produção, com aumentos nas contas de água e luz, lançamos a promoção de esfiha em dobro”, comenta Saraiva. Teve ainda a “coxinha de mortadela”, que esteve presente na Avenida Paulista, em São Paulo, durante protestos populares.
Livro
Saraiva só não se pronunciou, ainda, sobre a briga pelo Ovomaltine, que passou das mãos do Bob’s para o McDonald’s. Em compensação, o executivo entrou para o ramo da autoajuda empresarial. Ele lançou neste mês em Curitiba o livro “25 verbos para construir sua vida”, pela editora Planeta do Brasil, que já está na lista dos livros de negócios mais vendidos do país.
São 25 verbos e 350 páginas que contam a trajetória do empreendedor para comemorar os 25 anos de Habib’s, completados em 2013. O projeto demorou três anos para sair do papel e será o último. “O livro é suficiente para passar as minhas experiências e sabedorias.” O sonho dele é continuar criando estratégias para bater à concorrência.
“O verbo criar é extremamente importante. Às vezes, as pessoas querem criar grandes coisas, grandes itens, grandes ideias. E não é isso. É o que você tem. Eu aprendi a fazer o pastel e criei a Casa do Pastel, aprendi a fazer o nhoque e criei a Casa do Nhoque. Sempre usei muito aquilo que estava ao meu alcance.”
“Quando eu tinha 14 anos, meu pai vendia os doces que comprava em São Paulo nas cidades no entorno de Santo Antônio da Platina. Era uma lista de 30 doces e ele me colocava para vender com ele nos bares das cidades. E ele falava: ‘você vai vender naquele boteco e eu vou vender no outro. Vamos ver quem vende mais’”
“Não adianta só fazer, é preciso comunicar. Não adianta só ser, é preciso demonstrar. Não adianta só obter a vitória, é preciso que você a divulgue”
“Nunca quis deixar os itens importantes para outras empresas cuidarem. Nós temos que cuidar dos nossos tesouros, nós temos que cuidar dos nossos produtos principais. Eu não terceirizei, eu verticalizei. Dá mais trabalho, mas te deixa mais competitivo”
“O que deu certo não foi o conceito Habib’s. O sucesso foi a maneira como eu conduzi o negócio e as pessoas”