Empresas anunciaram, no primeiro semestre, a intenção de investir US$ 61,74 bilhões nos próximos anos, 8,6% a mais do que no mesmo período do ano passado, segundo levantamento feito pela Rede Nacional de Informações sobre o Investimento (Renai), do Ministério da Economia. O indicador é o maior em seis anos. O número de empresas que planejam investir também aumentou: passando de 239, em 2018, para 249, em 2019.
O movimento foi acompanhado pelo crescimento na formação bruta de capital fixo - forma como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mede o investimento - no primeiro semestre. A alta de 3,1% em relação ao mesmo período de 2018 também foi a maior em seis anos.
“Os dois indicadores sinalizam que saímos do fundo do poço e que estamos avançando lentamente”, diz Flávio Castello Branco, gerente da unidade de política econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Há muito espaço a ser retomado, apontam os especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo. Os níveis atuais do investimento são próximos aos do 2° trimestre de 2008. E desde o 3° trimestre de 2013, quando houve o pico, aconteceu uma queda de 28,6%.
Perfil dos investimentos
A expansão é marcada pela maior presença do capital brasileiro. Quase dois terços dos recursos que as empresas planejam aplicar tem origem interna. No primeiro semestre de 2018, eram 39,46%. Ao todo são US$ 40,16 bilhões.
Mais da metade dos investimentos de origem nacional vem de empresas ligadas ao setor público: Petrobras, Companhia de Saneamento de São Paulo (Sabesp) e Eletronorte. Juntas, elas anunciaram, no primeiro semestre do ano, US$ 21,01 bilhões em investimentos.
A Petrobras anunciou que pretende aplicar US$ 14,95 bilhões em extração de petróleo e serviços correlatos e em atividades de pesquisa e desenvolvimento. A Sabesp planeja investir US$ 5,08 bilhões em captação, tratamento e distribuição de água em São Paulo. E a Eletronorte tem a intenção de investir US$ 976,9 milhões em eletricidade nas áreas em que atua, no Norte do país.
Segundo Castello Branco, da CNI, dois fatores explicam a forte presença dessas empresas no ranking dos investimentos: tradicionalmente, a Petrobras é um dos maiores investidores e as companhias não ligadas ao setor público sentem a necessidade de reformas macro e microeconômicas para poder voltar a investir.
As três maiores intenções de investimento de empresas não ligadas ao setor público estão relacionados ao segmento de papel e celulose. A Euca Energy planeja direcionar US$ 2,55 bilhões para a construção de uma fábrica de celulose branqueada de eucalipto, em Alto Araguaia (MT); a Klabin pretende aplicar US$ 2,37 bilhões na expansão no segmento de papéis para embalagem; e a Suzano pretende destinar US$ 1,72 bilhão até 2021 para a expansão da base florestal, modernização das operações e terminais portuários.
Receio externo e interno
Os estrangeiros estão receosos em relação ao Brasil, mesmo com o grande potencial de mercado - 210 milhões de habitantes - oferecido. “As empresas não vão trocar a estabilidade de longo prazo por um forte crescimento no curto prazo”, diz Felipe Tanus, diretor de riscos da seguradora de crédito Euler Hermes Brasil.
Um maior investimento estrangeiro vai depender do resultado que a economia trouxer depois da aprovação das reformas. “O país precisa mostrar credibilidade”, afirma o executivo. O investimento direto líquido (entradas menos saídas) caiu 6,9% no primeiro semestre, comparativamente a igual período de 2018, segundo dados do Banco Central (BC).
Outro fator que favorece a cautela é a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, que tende a frear o crescimento da demanda mundial. “Qualquer crise é uma fonte de preocupação para os investidores e traz impactos ao comércio internacional”, diz a diretora de atendimento ao cliente para a Costa Leste da América do Sul da Maersk, Elen Albuquerque.
“Há grande apreensão no ar. Falta uma visão mais clara em relação ao futuro, tanto interna quanto externamente”
Paulo Castelo Branco, presidente da Associação Brasileira de Importadores de Máquinas e Equipamentos Industriais (Abimei)
Segundo ele, essa falta de previsibilidade faz com que as empresas segurem os planos. “O cenário estava mais claro até abril, mas as idas e vindas em relação à reforma da previdência, aumentou a insegurança dos investidores a partir de abril”, diz.
A cautela também é interna. Istvan Kasznar, professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (Ebape/FGV), afirma que a política econômica vem sendo conduzida no sentido de favorecer a queda nos juros, estimular o consumo e criar um ambiente favorável aos negócios. Mas ele aponta que este processo pode sofrer reveses.
“Uma crise política, declarações do presidente ou a reforma previdenciária não fechar em patamares adequados podem impactar negativamente junto aos investidores.”
Muita capacidade ociosa
Outro entrave a um crescimento mais acelerado dos investimentos é a elevada capacidade ociosa. Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o nível de utilização era de 77,7% em julho.
Segundo Tanus, isto faz com que as matrizes, principalmente estrangeiro, não vejam necessidade de investir em expansão. Ele aponta que, quando aumentar o envio de recursos do exterior para o setor produtivo, eles serão direcionados inicialmente à realização de ajustes e à modernização das instalações.
A CNI aponta que 88% das empresas possuem capacidade produtiva para atender a demanda esperada para 2019. Mas, mesmo assim, quatro em cada cinco indústrias pretendem investir. O principal foco é a melhoria do processo produtivo.
Os recursos serão direcionados principalmente para a compra de máquinas e equipamentos e a aquisição de novas tecnologias, como automação e digitalização e tem como alvo o mercado interno.
Máquinas e equipamentos
Um levantamento feito pela Maersk, um dos maiores conglomerados logísticos do mundo, detectou um aumento de 16% nas importações de máquinas e equipamentos no segundo trimestre de 2019, comparativamente a igual período do ano passado. Mas, segundo Elen, isto não significa que os resultados são otimistas.
A executiva ressalta que o forte número foi influenciado pela greve dos caminhoneiros no ano passado, que dificultou a circulação de mercadorias entre o final de maio e começo de junho.
“Não há uma tendência que mostre uma recuperação mais consistente. As empresas estão segurando investimentos porque não veem um crescimento mais forte do consumo”, diz ela. Há dez trimestres não há quedas em relação ao trimestre anterior, mas o consumo das famílias está nos mesmos níveis do segundo trimestre de 2015, aponta o IBGE “Esperamos um cenário mais positivo em 2021 do que em 2020.
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