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"No carnê"

Empresas parcelam venda de túmulos, plásticas e BMW

Já pensou em passar dois anos pagando por uma lipoaspiração? Ou enfrentar 42 meses de suaves parcelas para garantir uma vaga no cemitério? E entrar no carnê para comprar uma BMW?

Pois, em tempos de expansão do crédito no mercado brasileiro, empresas de diversos setores oferecem opções de financiamento quase tão longas quanto os de bens tradicionalmente parceláveis, como carro e casa própria.

Para o futuro

A dona-de-casa Zenaide Teixeira, 42 anos, concluiu há quatro meses o pagamento de um túmulo. Fez a compra em 24 parcelas de R$ 80; além disso, desde fevereiro ela passou a investir R$ 50 todo mês para cobrir todas as despesas dos funerais de cada um dos membros da família: caixão, flores, capela para velório e até lanchinho da madrugada para os visitantes.

Zenaide decidiu pagar em vida pelas despesas com a morte depois que passou por dificuldades com o falecimento de um primo, há dois anos: como não havia vagas no cemitério, a família teve que esperar três dias pelo sepultamento.

"A gente achou uma humilhação. A gente passa a vida trabalhando e não tem nem um enterro digno", diz ela, que afirma não ter medo dos alertas dos parentes, que diziam que tanto investimento funerário poderia trazer mau agouro. "Não estou atraindo morte, estou me preparando", comenta.

Segundo Luciane Cristina, gerente do cemitério Jardim das Acácias, em Rio Bonito (RJ), a compra parcelada é comum. O preço do jazigo varia de R$ 2,5 mil a R$ 6 mil, de acordo com o setor que o terreno ocupa. "Quanto mais na frente, mais caro", diz. Em São Paulo, os custos são maiores: no cemitério Parque dos Pinheiros, os preços variam de R$ 4,8 mil até R$ 19,5 mil e podem ser pagos em até 24 vezes.

Financiamento de luxo

A compra financiada de modelos importados de BMW, Porsche, Land Rover, Volvo e Audi vem crescendo desde junho, segundo Mariana Vieira, gerente de vendas da Eurobike, loja de veículos alto padrão em São Paulo.

A razão para tanto parcelamento, no entanto, não é a popularização dos carros de luxo, segundo ela.

"Nosso público é de classe alta. O financiamento só sai quando é possível viabilizar negócios", diz.

De acordo com Mariana, os compradores dos importados solicitam o empréstimo parcelado para usar o dinheiro em outras aplicações mais rentáveis. "Ele pega o nosso dinheiro com taxa de 0,65% ao mês e aplica em outro investimento com taxa maior", diz. "Como aqui temos veículos de até R$ 1 milhão, é um ótimo negócio".

O executivo Ademar Adhemar Magon Junior, 35 anos, diretor da televisão Cidade S/A, adquiriu um dos modelos da loja em 24 parcelas.

"Como eu já tenho a quantia para o carro, aplico o dinheiro a 0,95% ao mês e pago pelo dinheiro emprestado uma taxa de 0,65%. Ao final das parcelas, vai sobrar dinheiro ", diz.

Sonho estético

A possibilidade de dividir em muitas vezes o custo das cirurgias plásticas tornou mais acessível o sonho de quem quer fazer ajustes na aparência, na opinião do diretor-executivo da clínica Bello Corpo, Walmir Zeferino.

Desde que foi fundada, há quatro anos, a clínica faz financiamentos de cirurgias em até 25 vezes, como foi o caso da ex-operadora de caixa e dona-de-casa Fabiane Nunes da Silva Nicácio, 24 anos.

O marido dela, Cleberson Barbosa, de 25 anos, é gerente de um posto de gasolina em São Paulo. Ele pagou uma entrada e mais 24 parcelas pelas cirurgias de lipoaspiração e dermolipectomia (que abre a região abdominal para retirar a gordura) que Fabiane fez há dois meses para se livrar da gordura acumulada na gravidez do filho de três anos.

Deu resultado: um mês após a cirurgia, ela diz que já havia perdido seis quilos. "Meu marido diz que é o melhor investimento que ele já fez na vida". Segundo ela, o entusiasmo do Barbosa é tanto que ele também quer fazer uma avaliação na clínica para fazer uma lipoaspiração assim que concluir o pagamento do carnê de Fabiane.

Fantasia de carnaval

Para desfilar na avenida em fevereiro do ano que vem, o representante comercial Manoel Sandrinho começou a pagar pelas fantasias - que custam, em média, entre R$ 600 e R$ 700 - em setembro. Ele deposita pequenas parcelas mensalmente, de acordo com o dinheiro disponível, na conta dos responsáveis pelas vendas da Beija-Flor, no Rio de Janeiro.

Hélio Malveira, um dos diretores de harmonia da escola, é responsável pelo setor comercial da ala "Comigo ninguém pode". Segundo ele, a compra parcelada é comum entre os participantes do desfile.

"Tem componentes antigos que a partir de julho já começam a pagar. Sem valor fixo, porque como a fantasia não está pronta nessa época, não se sabe o custo final", diz.

Para Manoel Sandrinho, que desfila na escola há 14 anos, planejar o carnaval com tanta antecedência é tradição. "É meu jeito de garantir minha vaga no desfile", diz. Fertilização in vitro

Casais que buscam tratamento para resolver problemas de infertilidade também podem organizar a divisão dos gastos. No Centro Paranaense de Fertilidade, em Curitiba, a utilização da técnica de fertilização in vitro, que faz a fertilização fora do organismo da mãe, pode ser contratada em até dez vezes.

Segundo o Dr. Karam Abou Saab, um tratamento no Centro custa entre R$ 7 e R$ 8 mil.

A negociação das formas de pagamento, segundo ele, acontece de acordo com as condições financeiras do casal. "Se o cliente tem posses, paga à vista; se não, divide em parcelas", diz Saab, que afirma atender entre 40 a 50 casais por mês.

Para ele, o esforço financeiro vale a pena, mas requer cuidados. "A vontade de ter filhos é tão forte que os casais que se submetem a qualquer sacrifício , inclusive financeiro, para chegar lá", diz. "Nossa preocupação é que o sacrifício não seja tão pesado, porque todo tratamento tem uma chance de não dar certo. E não pode ser um evento irreversível para a vida financeira do casal."

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