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Veja índices de crescimento da economia brasileira desde 1966 |
Veja índices de crescimento da economia brasileira desde 1966| Foto:

Em junho de 1994, o último mês do cruzeiro real, a inflação foi de 47,4%. No mês seguinte, o primeiro do real, ficou em 6,8%. Baixou para 1,9% em agosto e 1,5% em setembro. A súbita desaceleração fez a festa dos consumidores – o poder de compra dos salários subiu 15% na transição das moedas – e deu impulso ao consumo. O que, em tese, faria brilhar os olhos dos empresários. Mas nem todos ficaram contentes: a repentina estabilidade desmascarou milhares de companhias brasileiras, acostumadas a lucrar mais com aplicações financeiras do que com suas atividades.

"As empresas viviam de malabarismos financeiros, que ficaram mais difíceis sem a inflação. Muita gente quebrou e nem soube por quê", conta Maria Alice Silveira Carneiro, sócia-diretora da Água Mineral Timbu. "Por exemplo: se a empresa recebesse 10 mil de seus clientes, cinco dias antes do pagamento dos funcionários, colocava esse dinheiro no 'overnight' [aplicação no banco com correção diária] e, em cinco dias, o transformava em 12 mil. Assim, pagava 10 mil em salários e ainda sobravam 2 mil, sem esforço."

De repente, as empresas tiveram de voltar à esquecida teoria da administração, lembra Jean Michel Galiano, superintendente da imobiliária Apolar. "Empresas sólidas são as que conseguem gerar caixa com suas operações, e não necessariamente as que têm alta rentabilidade. Na transição para a vida sem inflação, muita gente ficou pelo caminho."

Bancos

Acostumados à mesma folia, vários bancos sucumbiram. Econômico e Nacional em 1995, o paranaense Bamerindus em 1997. O estatal Banespa só não sumiu antes por causa da ajuda do governo paulista. "Tínhamos um sistema bancário inchado, com muitos bancos vivendo de inflação. Entre 30% e 40% da receita do sistema era inflacionária, ou seja, obtida ao aplicar recursos de terceiros no ‘overnight’", explica o economista Giuliano Contento de Oliveira, professor da Unicamp, autor de estudos sobre o assunto. "Dos mais de 300 bancos que existiam antes do Real, restam menos de 150."

A saída dos sobreviventes, diz Oliveira, foi expandir o crédito e cobrar tarifas para quase tudo. "Os bancos múltiplos também intensificaram suas atividades não-financeiras, como previdência, seguros e capitalização. Hoje, mais de 50% da receita dos grandes conglomerados vêm desses serviços."

Inovação

Com o fim dos malabarismos, a solução foi inovar. "Os empresários pararam de pensar 'da mão para a boca' e passaram a investir em planejamento e produtividade. Algo que já havia começado com a abertura ao comércio exterior, no governo Collor, e teve de ser acelerado com o câmbio valorizado e as privatizações, nos primeiros anos do Real. Não foi apenas o fim da inflação que mexeu com as empresas, mas também a concorrência com os importados", diz o economista Luiz Afonso Cerqueira, do conselho consultivo do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef-PR). "O consumidor passou a contar com mais opções de produtos e mais qualidade."

Ramon Doria, presidente da Doria Construções, cita o avanço da engenharia. "A técnica e a produtividade foram abandonadas durante todo o período inflacionário. Simplesmente não houve avanço. Melhorias intensivas, que rendem ganhos de 5% ou 10%, perdiam fácil para a 'brincadeira' com a inflação, que rendia 20% ou 30%. Hoje, qualquer ganho de produtividade é uma grande conquista."

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