O governo federal planeja leiloar em setembro 29 hidrelétricas antigas cujas concessões estão vencidas ou prestes a vencer. Como elas serão licitadas por tarifas muito menores que as atuais, o preço da energia ao consumidor tende a subir menos – ou eventualmente cair – na próxima revisão anual de cada distribuidora.
Depois que a maioria das concessões expirou, no início deste mês, a União contratou as antigas concessionárias, entre elas a Copel Geração e Transmissão, para continuarem operando essas hidrelétricas enquanto não sai a licitação. Dependendo do caso, a remuneração das geradoras caiu mais de 80%.
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As distribuidoras, que já estão recebendo cotas dessa energia mais barata, terão de repassar a economia ao consumidor. Mas os paranaenses vão demorar a ver isso em sua fatura. A tarifa da Copel Distribuição foi revisada no mês passado e a próxima mudança só deve ocorrer em 24 de junho de 2016.
Estou curioso para saber se as empresas do setor vão se interessar por valores tão baixos [no leilão].
Valor menor
O valor pago agora às geradoras é o mesmo que havia sido proposto pelo Planalto – e rejeitado pelas empresas – no pacote de renovação antecipada das concessões, entre 2012 e 2013. O governo sempre deu a entender que não aceitaria cifras muito maiores que essas ao relicitar tais usinas.
Foi o que aconteceu em março de 2014, no primeiro leilão do gênero – o da usina de Três Irmãos, em São Paulo, que pertencia à Cesp. “A receita anual do consórcio vencedor corresponde a R$ 17 por megawatt-hora (MWh). Antes, essa usina vendia energia por mais de R$ 100 por MWh”, diz Antonio Bolognesi, consultor especial da GO Associados. “É por isso que a Fitch, uma agência de risco, rebaixou a nota de crédito da Cemig. Com o fim de várias concessões, sua receita vai cair muito, mesmo que ela própria vença a licitação.”
Levando em conta uma queda esperada de 82% na tarifa média de geração das usinas, de R$ 150 para R$ 27 por MWh, a conta de luz dos brasileiros pode ter uma redução anual de R$ 6 bilhões, segundo estimativas do Ministério de Minas e Energia divulgadas pelo Valor Econômico. O montante equivale a 5% do faturamento total das distribuidoras brasileiras em 2014.
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Leia a matéria completaViabilidade
Alguns especialistas têm dúvidas sobre a viabilidade das tarifas máximas que o governo vai fixar no leilão. “Estou curioso para saber se as empresas do setor vão se interessar por valores tão baixos”, diz Renato Queiroz, pesquisador associado do Grupo de Economia da Energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “As geradoras vão receber apenas pela operação e manutenção. Se precisarem trocar um equipamento, terão de pedir à Aneel para incorporar isso na tarifa, o que é extremamente burocrático.”
Para Thais Prandini, diretora-executiva da Thymos Energia, o Planalto terá de “remodelar” as tarifas para que o leilão fique mais atraente. “Imagino que, além do que foi oferecido em 2012, vai entrar a correção pela inflação e alguns custos que estavam de fora. Aqueles valores pagavam com muita dificuldade a operação e a manutenção.”
REMUNERAÇÃO
A Copel está recebendo o equivalente a R$ 14,8 milhões por ano pela operação da usina de Parigot de Souza, em Antonina (Litoral). Pela pequena central Mourão I, em Campo Mourão (Centro-Oeste), a remuneração é de R$ 1,3 milhão. Em ambos os casos, os valores são de outubro de 2012. Em termos atualizados, os montantes equivalem respectivamente a R$ 18,90 e R$ 35,11 por MWh, segundo o diretor da Copel Geração e Transmissão, Sergio Lamy.
VALOR AFETIVO
As usinas de Mourão I (8,2 MW) e Parigot de Souza (260 MW) respondem por apenas 5% do parque gerador da Copel. Mas a segunda tem valor sentimental para a companhia, por sua engenharia e seu papel na emancipação energética do estado. Parigot de Souza é uma usina subterrânea, construída sob a Serra do Mar, que gera energia aproveitando uma diferença de altitude de 754 metros entre o reservatório do Capivari, na Grande Curitiba, e a central geradora, a 15 quilômetros de distância, em Antonina. Quando inaugurada, em 1971, era a maior usina da Região Sul e foi a maior da Copel até 1980.
Cobrança de “bônus de assinatura” pode limitar queda das tarifas
Corre pelo setor elétrico o rumor de que o governo federal, em busca desesperada por recursos extraordinários, avalia cobrar um “bônus de assinatura” na licitação das antigas hidrelétricas, algo inédito desde a adoção do modelo de leilões, em 2004. Em 11 anos de licitações, sempre saíram vitoriosas as empresas que se propuseram a cobrar as menores tarifas pela energia.
Para especialistas, a exigência de um bônus pode limitar a redução das tarifas, pois o pagamento extra elevaria as despesas do futuro concessionário. Ou seja, o dinheiro reforçaria o caixa do governo, mas aliviaria menos o bolso do consumidor.
Copel vai propor alternativa ao leilão
A Copel, que desde 8 de julho presta o serviço de operação de duas hidrelétricas que até então lhe pertenciam, vai apresentar ao governo federal uma proposta para evitar que as usinas sejam licitadas. A sugestão é que a estatal e outras geradoras continuem no comando das antigas concessões, recebendo apenas pela operação e manutenção. Em outras palavras, a ideia é tornar permanente o regime temporário que entrou em vigor neste mês.
No fim de 2012, a Copel não quis participar da renovação antecipada de concessões, em condições muito parecidas com as que propõe agora. A empresa ficou com energia “descontratada” desde então e pôde lucrar com a venda da eletricidade a preços elevados no mercado “spot”.
“Há três vantagens em manter as usinas com quem já está cuidando delas”, argumenta o diretor da Copel Geração e Transmissão, Sergio Lamy. “A primeira é a modicidade tarifária, uma vez que a agência reguladora pode estabelecer receitas anuais para o serviço, como fez em 2012. A segunda está na confiabilidade do serviço, ao manter as usinas operadas por quem as conhece. E a terceira é que, se fizer licitação, o governo terá de indenizar os ativos não depreciados, o que vai contra o ajuste fiscal.” Lamy defende que essa indenização seja diluída na tarifa pelos próximos 30 anos.
Antonio Bolognesi, consultor especial da GO Associados, avalia que, para aceitar tal proposta, o governo tem de mudar a lei. “A legislação é muito clara sobre a necessidade de licitação. E foi seguida à risca em 2014, com a usina de Três Irmãos”, diz. A advogada Fernanda Amante, sócia do Bichara Advogados, também defende o leilão. “É a forma legal, e permite a participação de outros investidores, criando uma competição capaz de reduzir mais a tarifa.”
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