Na última década, a corrida mundial por energia limpa ultrapassou a fronteira continental e chegou ao mar. Com uma expansão acentuada em terra, as eólicas também foram escolhidas para desbravar os oceanos. Embora a produção eólica offshore seja uma tendência recente no mundo, tudo indica que, no Brasil, não teremos empreendimentos dessa natureza tão cedo, principalmente porque ainda há um longo caminho para percorrer em terra.
De 2006 até o final do ano passado, a capacidade de produção eólica offshore no mundo passou de 882 megawatts para 12 gigawatts. O avanço médio de um gigawatt por ano ainda é tímido se comparado ao tamanho do potencial, mas a tendência é que haja um crescimento mais robusto nos próximos anos, principalmente com a expansão liderada pelo Reino Unido e Alemanha – que triplicou sua capacidade de produção eólica offshore entre 2014 e 2015 – e com a entrada forte da China nesse mercado nos últimos dois anos.
No Brasil, um levantamento acadêmico feito a partir de dados obtidos entre 1999 e 2009 por satélite que fornece informações de velocidade e direção do vento nos oceanos, estimou-se que o potencial energético offshore na costa brasileira seria cerca de 12 vezes maior que na área continental do país. Apesar disso, o país não possui empreendimentos eólicos em alto mar, e nem deverá ter nos próximos anos.
Segundo Elbia Gannoum, presidente da ABEEólica, não há interesse técnico-econômico de investir nessa modalidade aqui por duas razões basicamente: “Além da diferença de custo, muito maior no modelo offshore, o potencial eólico em terra [estimado em 143 GW] firme hoje é muito superior à necessidade de energia do país”, afirma.
Outro aspecto que joga contra a tecnologia é o custo. O megawatt eólico no mar chega a ser cerca de três vezes maior do que em terra. Para especialistas, esses argumentos são suficientes para descartar a adoção de eólicas em alto mar no Brasil, pelo menos por ora.
“O modelo é competitivo na Europa porque lá eles têm pouca disponibilidade em terra e o preço da energia já é muito alto. No Brasil ainda temos um enorme potencial em terra firme. Não tem porquê investir em fontes mais caras”, avalia Dario Jackson Schultz, gerente da coordenação técnica de fontes renováveis da Copel.
Na Europa, contudo, o cenário é outro. Segundo Odilon Camargo Schubert, CEO da Camargo-Schubert Engenharia Eólica, vários fatores levaram alguns países europeus a buscar os ventos marinhos. As metas severas de redução de emissões são um exemplo, mas há outras determinantes mais específicas.
“Na Alemanha, por exemplo, o custo da energia é alto e o país é muito dependente do gás da Rússia. Na terra ou no mar, as usinas eólicas são instaladas dentro de um sistema de generosos subsídios à energia renovável”, detalha. Mais da metade da energia limpa do país é propriedade privada de agricultores e cidadãos do país. Já a forma como se estabeleceu o mercado eólico na Inglaterra fez com que o país, embora ainda com potencial em terra, partisse para o modelo offshore. Está na Inglaterra, por exemplo, o maior parque eólico offshore do mundo, o London Array, no Mar No Norte.
De forma geral, o mar oferece menos turbulência e maior estabilidade e potência dos ventos, o que possibilita gerar mais energia a partir de um número menor de equipamentos. A velocidade média do vento chega a ser 20% maior do que em terra, e a energia resultante dos parques eólicos marítimos pode ser até 70% maior. Na costa da França, por exemplo, está em funcionamento o maior aerogerador offshore do mundo, com uma capacidade de 6 megawatts (MW), o dobro da potência das máquinas instaladas em terra.
Se comparada a energia eólica já produzida em terra firme, contudo, a modalidade o offshore ainda está engatinhando. Até o fim de 2015, a capacidade instalada dos parques eólicos onshore era de 420 GW no mundo, enquanto no mar era de apenas 12 GW. A expectativa é que a evolução da tecnologia possa baratear o custo de produção, instalação e manutenção nos próximos anos, desenhando um futuro promissor para as eólicas no mar.
Potencial eólico brasileiro em terra firme supera 10 Itaipus
Poucos lugares do mundo têm condições tão favoráveis à geração eólica em terra firme quanto alguns pontos do Brasil, segundo Odilon Camargo Schubert, CEO da Camargo-Schubert Engenharia Eólica. Responsável pela pesquisa e elaboração do Atlas do Potencial Eólico Brasileiro, de 2001, e pelo mapeamento dos ventos em mais 11 estados, incluindo o Paraná, Schubert diz que a pesquisa revelou um potencial enorme no interior de algumas regiões, sem problemas como a maresia, alta salinidade e temperaturas elevadas, típicas de ambientes marinhos e que encarem a tecnologia.
Uma dessas regiões é o Nordeste brasileiro, onde os ventos são bem comportados. Ao longo de três anos de medição, em apenas 72 horas os ventos não sopraram, uma situação absolutamente positiva para a geração eólica, explica Schubert. Na prática, o potencial eólico brasileiro que pode, de fato, ser aproveitado era estimado, em 143 GW em 2001, exatamente a capacidade instalada total do país hoje, incluindo todas as demais fontes de energia.