Com cerca de mil habitantes, a pequena vila de Ashton Hayes, na Inglaterra, lembra qualquer outra localizada no interior. Mas Ashton Hayes é diferente quando se trata de um dos assuntos mais prementes do mundo, a mudança climática.
Centenas de moradores se uniram para cortar as emissões de gases do efeito estufa – eles utilizam varais em vez de secadoras, voam menos de avião, instalam painéis solares e janelas com vidros duplos para isolar melhor suas casas. A iniciativa, que neste ano completa dez anos, levou a uma redução de 24% nas emissões, segundo pesquisas de um professor de sustentabilidade ambiental que é morador da vila.
Mas o que realmente torna Ashton Hayes incomum é sua abordagem – os moradores fizeram tudo sozinhos, sem incentivo público. Aproximadamente 200 cidades e condados do mundo – incluindo Notteroy, na Noruega, Upper Saddle River, nos Estados Unidos, e o condado de Changhua, em Taiwan – entraram em contato para saber como os residentes agiram.
Exemplo para o mundo
À medida que a ciência do clima se torna mais aceita, e os efeitos de um planeta em aquecimento se tornam mais claros, Ashton Hayes é um estudo de caso para a próxima fase do enfrentamento da mudança climática: fazer as pessoas mudarem seus hábitos.
“Só achamos que todos deveriam tentar limpar sua área. E em vez de sairmos protestando, foi o que fizemos”, diz Rosemary Dossett, moradora do vilarejo.
Um de seus segredos, aparentemente, é que as pessoas de Ashton Hayes se sentem no comando, em vez de seguir políticas públicas. Quando o membro do Parlamento que representa a vila apareceu em sua primeira reunião pública em janeiro de 2006, ficou sabendo que não poderia discursar.
“Dissemos a ele: ‘Essa questão não gira em torno de você, mas de todos nós, e você pode ouvir o que temos a dizer para variar’”, afirma Kate Harrison, moradora e uma das primeiras integrantes do grupo.
Desde então, nenhum político pôde falar ao grupo. O vilarejo manteve a iniciativa distante dos partidos, coisa que, para os residentes, somente serviria para dividi-los em linhas ideológicas.
O projeto foi fundado por Garry Charnock, ex-jornalista formado em hidrologia e que mora no local há quase 30 anos. Ele teve a ideia cerca de uma década depois de participar de uma palestra sobre mudança climática no Festival de Hay, encontro literário anual no País de Gales. O morador decidiu tentar transformar Ashton Hayes, em suas palavras, “na primeira vila carbono neutro da Grã-Bretanha”. “Mas mesmo que isso não aconteça, vamos continuar tentando, pois é divertido”, conta ele.
Conhecer para mudar
Às vezes, as iniciativas para reduzir os gases do efeito estufa envolvem a exploração do sentimento de culpa ou cenários apocalípticos que deixam as pessoas achando que o problema é grande demais para ser atacado.
Em Ashton Hayes – cerca de 40 quilômetros a sudeste de Liverpool, com uma igreja anglicana do século XIX e uma loja comunitária que também atua como agência do correio –, os moradores melhoraram seu humor.
Eles realizam reuniões públicas com vinho e queijo nas maiores casas da cidade, “para que todos deem uma olhada” para saber como os ricos vivem, diz Charnock, diretor executivo da RSK, uma consultoria ambiental. “Não recriminamos ninguém em Ashton Hayes.”
Cerca de 650 pessoas – mais da metade dos habitantes – compareceram à primeira reunião, conta Charnock. Algumas pessoas estavam menos dispostas a participar, mas, pouco a pouco, foram chegando.
Algumas deram até um passo a mais. Quando estavam querendo construir uma casa com uso eficaz de energia e ficaram sabendo sobre o projeto de carbono neutro de Ashton Hayes, Rosemary Dossett e seu marido, Ian, acharam que aquele poderia ser o endereço perfeito para eles.
O casal se mudou da vizinha South Warrington e encontrou duas velhas cabanas agrícolas, que transformaram em uma casa de tijolos de dois andares, instalando janelas enormes com vidros triplos, células fotovoltaicas no telhado, uma bomba geotérmica que aquece a residência e a água e uma cisterna subterrânea que coleta água da chuva para a descarga e a horta.
“Não queria que pensassem que moramos em uma choça de barro”, diz Rosemary, sentada num sofá de sua sala de estar quentinha e bem iluminada.
Os Dossetts também têm uma horta, onde produzem uvas para vinho, fabricam cerveja e mantêm duas vacas, que aparam a grama e também podem virar alimento dentro de alguns anos. Eles pagam cerca de 500 libras anuais pela eletricidade e o aquecimento.
Trabalho formiguinha
Embora cortes profundos pelo globo ainda sejam necessários para um progresso maior, ações para reduzir as emissões, mesmo as de cidades pequenas, são um passo na direção certa, asseguram especialistas que estudam o comportamento da comunidade na mudança climática.
“O elemento formador de uma comunidade em tudo isso tem sido tão importante quanto o impacto ambiental até agora”, declara Sarah Darby, pesquisadora do Instituto de Mudança Ambiental da Universidade de Oxford.
Ela acrescentou que Ashton Hayes estava em uma boa posição para encarar esse tipo de projeto – é uma vila pequena com pessoas instruídas e boa renda, então o simples fato de viajar menos de avião por ano pode ter um efeito enorme.
Os moradores conseguiram reduzir 20% as emissões já no primeiro ano, segundo pesquisas usadas para calcular a pegada de carbono que foram desenvolvidas por Roy Alexander, professor do lugar, e seus alunos.
Algumas pessoas acusaram reduções ainda maiores. As casas que participaram nas pesquisas do primeiro e do décimo aniversário limitaram em cerca de 40% o uso de energia.
Charnock disse pensar que a vila pode reduzir a pegada de carbono em 80%, em relação a 2006, nos próximos anos com a ajuda de subvenções para comprar e instalar painéis solares na escola e outros prédios do local.
Segundo ele, o próximo passado é fazer o governo do condado se comprometer em cortar as emissões tanto quanto Ashton Hayes.
“Existe muita apatia. Precisamos acabar de vez com ela e agir”, garante Charnock.
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