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Saída da crise

Enquanto a Europa poupa, administração da UE gasta

Sede da Comissão Europeia, em Bruxelas: falta de disciplina fiscal é criticada pelos países do bloco | Karen Eliot /Creative Commons
Sede da Comissão Europeia, em Bruxelas: falta de disciplina fiscal é criticada pelos países do bloco (Foto: Karen Eliot /Creative Commons)

Na Grécia, aumentam-se os impostos e a idade mínima para a aposentadoria. Na Espanha, funcionários públicos têm cortes nos salários. Na Grã-Bretanha, as despesas do governo nas áreas de bem-estar social, defesa e educação devem sofrer uma redução de 25%. Apesar dos protestos que varrem o continente, uma campanha pela austeridade está sendo arquitetada a um ritmo sem precedentes na Europa moderna. Em Bruxelas, no entanto, os burocratas que comandam a União Europeia discutem sobre qual deve ser a elevação no orçamento do ano que vem. Em 2011, a UE deve despejar bilhões de euros em diferentes regiões do continente, para investir em infraestrutura e em outros tipos de projeto. Os gastos com justiça e segurança pública terão altas acentuadas. E até o custo da máquina administrativa poderá crescer mais de 4%.

Quem apoia essas medidas vê o aumento das despesas públicas como um antídoto à austeridade – uma maneira de manter a frágil recuperação econômica. Os críticos, por sua vez, dizem que esse crescimento nos gastos apenas destaca o distanciamento de Bruxelas do mundo real. A capital da Bélgica e sede da UE é o lugar onde aumentos salariais são fixados em lei e prioridades orçamentárias são determinadas com sete anos de antecedência – e também onde milhões de euros são gastos em esforços questionáveis para unificar o discurso do bloco de 27 países que, com frequência, parece ter pouco poder de decisão em assuntos que realmente interessam aos eleitores, como as questões de imigração.

A conta

Os governos nacionais da UE pagam a maior parte dessa conta – e muitos já perderam a paciência. O secretário de Negócios do Reino Unido, Vince Cable, prevê uma forte reação contra o bloco. "Os governos dos países, inclusive o meu, estão tendo de fazer cortes profundos nos gastos públicos. Ninguém consegue entender por que o orçamento europeu não está sujeito ao mesmo tipo de disciplina", diz.

A Comissão Europeia, órgão executivo da UE, busca um aumento de 5,9% no orçamento do bloco, o que elevaria as despesas anuais para mais de 130 bilhões de euros (R$ 300 bilhões), ou metade do gasto público de uma nação média como a Holanda. Os países tentam limitar o orçamento em 125 bilhões de euros (R$ 290 bilhões), com alta de 2,9% em relação a este ano.

Essa previsão precisa ser aprovada pelo Parlamento Europeu, que, numa mescla de altruísmo e interesses específicos, incluiu ou reeditou uma série de rubricas orçamentárias para o ano que vem. Uma tática bem conhecida da política brasileira também foi muito usada pelos legisladores europeus: a das emendas individuais. Por meio desses instrumentos, são previstos 300 milhões de euros para os produtores de leite, 9 milhões de euros para o Mundial de Jogos Olímpicos Especiais de Verão na Grécia, 10 milhões de euros para um plano de consumo de frutas nas escolas e 8 milhões de euros para a apicultura. O resultado dessa soma é uma quantia 3,5 bilhões de euros acima do que os governos querem pagar.

Subsídios

Como tem ocorrido há décadas, o grosso do orçamento – cerca de 152 bilhões de euros neste ano – será usado na forma de subsídios regionais ou agrícolas, defendidos por alguns parlamentares como uma forma de contrapeso à austeridade. "O orçamento da UE deve servir para os investimentos naquelas áreas que mais exigem atenção nesse período econômico de tantas dificuldades", afirma Goran Farm, representante para questões orçamentárias do principal grupo de centro-esquerda do Parlamento Europeu.

Custo extra

Muitos economistas, no entanto, consideram os subsídios agrícolas um custo extra cobrado dos consumidores europeus, além de um fardo para produtores rurais de países pobres, que não conseguem competir em igualdade de condições. Esses analistas apontam exageros – 8 milhões de euros para promover a conscientização da política agrícola do bloco, por exemplo. Eles também destacam de forma negativa o custo da máquina administrativa, que a Comissão Europeia quer tornar 4,5% mais elevado – para um total de 8,4 bilhões de euros a serem desembolsados em 2011.

Essa despesa incomoda. Alguns países estão cortando os salários dos próprios servidores públicos, mas não conseguem reduzir o gasto com os oficiais da UE, que costumam ganhar bem mais do que seus pares que trabalham nas capitais nacionais. Para completar, esses oficiais pagam menos imposto de renda e recebem benefícios generosos. Neste ano, quando os governos europeus reduziram para 1,85% o aumento salarial dos funcionários da UE – metade do obrigatório, de acordo com o sistema vigente –, a Comissão Europeia levou o assunto às cortes de Justiça (e deve ganhar o caso).

Burocracia

De fato, o custo total para administrar a UE não para de crescer, e é inflado pelos novos órgãos que surgiram com o Tratado de Lisboa, no fim do ano passado. Existem agora um presidente do Conselho Europeu – Herman van Rompuy, da Bélgica – e uma chefe de política externa – Catherine Ashton, do Reino Unido. Há também o Parlamento Europeu, que recebeu 9,4 milhões de euros adicionais para dar conta de mais atribuições.

Rompuy tem 25 milhões de euros à disposição para operar o Conselho Europeu. O serviço de relações exteriores de Catherine Ashton custará 476 milhões de euros em 2011. De acordo com a comissão, boa parte desse valor será suprida com a transferência de equipes já existentes – mas serão necessários 34,5 milhões de euros apenas para bancar os novos cargos.

Tradução: João Paulo Pimentel

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