O senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) apresentou na manhã desta quarta-feira (29) seu parecer sobre o pacote de benefícios temporários que o governo pretende criar às vésperas da eleição presidencial. Entre as medidas estão a ampliação de programas sociais já existentes e o estabelecimento de novas iniciativas bancadas por dinheiro público.
O relatório propõe o reconhecimento de estado de emergência no país, a fim de permitir a criação de um benefício – um pagamento mensal a caminhoneiros autônomos – sem violar a legislação eleitoral. Segundo o senador, o estado de emergência é consequência "da elevação extraordinária e imprevisível dos preços do petróleo e de seus derivados e impactos sociais dela decorrentes".
O custo total das iniciativas é estimado em R$ 38,75 bilhões e, segundo Bezerra, será bancado por receitas extraordinárias que não estavam previstas ou foram subestimadas no Orçamento da União deste ano. Ele citou R$ 26,6 bilhões em recursos da privatização da Eletrobras que entrarão no caixa do Tesouro, e dividendos de estatais, que devem ficar entre R$ 20 bilhões e R$ 30 bilhões neste ano. Por isso, disse o senador, não será necessário ampliar o endividamento público para custear os repasses.
Todo os benefícios instituídos pelo pacote vão durar até 31 de dezembro. E o dinheiro ficará de fora do teto de gastos, principal regra fiscal do país, que impede o crescimento das despesas acima da inflação. Assim, o governo poderá pagar os auxílios sem precisar cortar outros gastos.
O pacote, embalado em uma proposta de emenda à Constituição (PEC), propõe o seguinte:
- a elevação em R$ 200 no benefício mínimo do Auxílio Brasil, que hoje paga pelo menos R$ 400 mensais e chegará a R$ 600. Também haverá recursos para zerar a fila de espera pelo programa, que segundo Bezerra é estimada em 1,6 milhão de famílias pelo Ministério da Cidadania. Assim, o total de famílias beneficiárias deve subir de 18,15 milhões para aproximadamente 19,8 bilhões. O custo estimado dessa iniciativa é de R$ 26 bilhões;
- a ampliação do auxílio-gás, que hoje paga o equivalente a meio botijão de GLP a cada dois meses para as famílias mais pobres e passará a pagar um botijão a cada dois meses. Com isso, segundo Bezerra, o repasse passa de R$ 60 a R$ 120 a cada dois meses, e vai beneficiar 5,86 milhões de famílias. O custo estimado é de R$ 1,05 bilhão;
- o pagamento de R$ 1 mil por mês a mais de 870 mil caminhoneiros autônomos inscritos no Registro Nacional do Transportador Rodoviário de Carga, da ANTT, agência reguladora do setor. O custo do programa – chamado de "voucher-caminhoneiro" pelo relator e também conhecido por nomes como "Pix Caminhoneiro" e "vale-diesel" – é estimado em R$ 5,4 bilhões;
- o pagamento de uma compensação de R$ 2,5 bilhões para bancar gratuidade a pessoas com 65 anos ou mais no transporte coletivo urbano, semi-urbano e metropolitano; e
- o repasse de R$ 3,8 bilhões aos estados para reestabelecer o incentivo tributário ao etanol hidratado. A lei complementar 194 retirou R$ 0,69 por litro em tributos federais da gasolina e R$ 0,24 por litro do etanol. O repasse aos estados servirá para que eles recomponham essa diferença de R$ 0,45 por meio de créditos tributários aos produtores. O valor total será rateado conforme o consumo de combustível em 2021.
Por determinação do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o substitutivo apresentado por Bezerra não será mais relacionado à PEC 16, a "PEC dos Combustíveis", que foi deixada de lado. O texto do relator será apensado à PEC 1/2022, apresentada ainda em fevereiro e que havia sido apelidada de "PEC kamikaze" pela equipe econômica e classificada de "bomba fiscal" e "insensatez" pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.
Pacheco tomou a decisão porque o pacote de benefícios apresentado por Bezerra em articulação com o governo é muito semelhante à PEC que havia sido rechaçada pelo Ministério da Economia meses atrás.
A aprovação de uma emenda à Constituição exige a aprovação de três quintos dos parlamentares, tanto no Senado (mínimo de 49 votos favoráveis) quanto na Câmara (mínimo de 308 votos), com dois turnos de votação em cada Casa.
O governo tem pressa, e espera que a apreciação da PEC por senadores e deputados seja concluída nesta ainda semana. Bezerra vê boas chances de que a emenda constitucional seja aprovada ainda nesta quarta pelo Senado, que tem sessão a partir das 16 horas.
Estado de emergência valerá apenas para as medidas contidas na PEC, diz Bezerra
Segundo Bezerra, o reconhecimento do estado de emergência valerá apenas para as medidas listadas na PEC e não será um "cheque em branco" para outros gastos.
"Os efeitos do reconhecimento do estado de emergência ficarão circunscritos a valores e medidas contidas no próprio substitutivo. Não vai ser porta aberta para realização de novas despesas. Limita a utilização de recursos para o enfrentamento dessa crise social que está sendo reconhecida", disse o senador a jornalistas. "Não é um cheque em branco. É reconhecimento limitado às medidas que estão sendo sugeridas."
Bezerra afirmou que uma ampla pesquisa em ações julgadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) indica que a ampliação de programas já existentes – caso do Auxílio Brasil e do vale-gás – não é vedada pela legislação em ano de eleição. E que a criação de novos programas, como o voucher para caminhoneiros, é possível desde que sejam apresentadas as condições que justifiquem estado de calamidade ou emergência.
O senador disse ainda que o pacote de benefícios "não é uma invenção brasileira". "Todas as iniciativas que Congresso Nacional está apoiando ou aprovando vêm sendo a prática dominante nos Estados Unidos, na Europa, no Japão e em várias outras economias mundo afora. E [sobre] o voucher-caminhoneiro, percebido às vezes como casuísmo com fins eleitoreiros, vale lembrar que outros países estão adotando vouchers para mitigar efeitos da crise do combustível", afirmou Bezerra, citando um vale de 200 euros criado recentemente pela Espanha.
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