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Sustentabilidade

Estagnação pode levar a cortes de ações sustentáveis nas empresas, e isso é um erro

A PepsiCo reduziu em 25% o consumo de água nas suas linhas três fábricas no Brasil. Até o fim de 2019, a empresa busca como meta reduzir mais 8%. (Foto: Rogério Machado/PesiCo/Divulgação)

Um levantamento publicado no início do ano pelo Centro de Estudos do Mercado de Capitais (Cemec) da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) indicou que de janeiro a setembro do ano passado o grau de investimento das empresas brasileiras recuou meio ponto porcentual. Enquanto que em 2017 elas investiram 1,81% do PIB do país, em 2018 (de janeiro a setembro) o aporte foi de 1,36%. A pesquisa envolveu um grupo de 240 empresas, excluindo-se gigantes como a Eletrobras, Petrobras e Vale, que geralmente possuem um grau de investimento maior.

E 2019 não começou diferente. Neste primeiro trimestre, a taxa de investimento (formação bruta de capital fixo) foi de 15,5% do PIB, segundo dados do IBGE divulgados na última quinta-feira (30). É a segunda queda trimestral seguida no indicador (-1,7%). No geral, o PIB do país caiu 0,2% em relação ao trimestre final de 2018.

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Esses dados mostram que, em razão da crise econômica, as empresas estão mais tímidas na hora de botar a mão no bolso, o que se reflete também em uma redução do investimento em ações de sustentabilidade ambiental, seja na readequação de processos fabris ou operacionais ou no patrocínio de programas governamentais ou comunitários em prol de rios, florestas, reciclagem ou educação ambiental.

“Menos capital circulante, menos investimentos. Isso é óbvio. Seguramente, a queda de arrecadação das empresas desestimula os investimentos na realidade local”, afirma o engenheiro civil e membro do Conselho Diretor da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes) Miguel Mansur Aisse. No entanto, diz ele, a questão não passa só pela falta de dinheiro. “Temos várias empresas que produzem tecnologias em pequena escala para reaproveitamento da água, por exemplo. Algumas indústrias usam tecnologias para tratamento de esgotos, os condomínios residenciais mais afastados da rede também. Aliás, independente do caminho que se tome, temos que minimizar o consumo de água, buscando outras fontes, como água de chuva e reuso”, observa.

Para ele, é possível que pequenas empresas, inclusive, busquem soluções de baixo custo que podem otimizar seus processos tornando-os mais verdes e economizando recursos. De acordo com o engenheiro ambiental Eduardo Gobbi, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o risco de governos e empresas privadas reduzirem investimentos em sustentabilidade é de aumentar o passivo ambiental que já é enorme no Brasil. Além disso, há dificuldade em retomar projetos posteriormente, pois os custos aumentam.

Alceu Galvão, consultor do Instituto Trata Brasil, diz que as pequenas empresas têm dificuldade de foco para enxergar onde investir, mas reitera que soluções simples, como separar o lixo ou promover ações de educação ambiental não custam caro e estão acessíveis a qualquer empresa, de qualquer setor. Galvão diz ainda que os investimentos em sustentabilidade, como em saneamento básico, estão atrelados ao desenvolvimento econômico do país.

“Qualquer empresa que queira investir em uma cidade vai olhar primeiro para o saneamento. É um pré-requisito para investir e que depois se reflete em geração de empregos, qualidade de vida, melhoria dos indicadores de saúde, entre outros. Para o país crescer ele precisa investir nisso. E a sociedade também precisa olhar para essa pauta, comprar a briga e não deixar apenas nas mãos dos governantes e das empresas”, frisa.

Por outro lado, ele observa que muitas empresas têm investido em ações sustentáveis, com a indústria de bebidas, que utiliza intensivamente a água. As cimenteiras e mineradores também estão despertando para o melhor aproveitamento dos recursos naturais, segundo Galvão. Ele acredita também que o estímulo para novas ações deve vir dos setores, como a indústria, mineração e serviços, que podem incentivar as empresas a trilharem o caminho da sustentabilidade.

Marcelo Risso Errera, engenheiro mecânico e professor da UFPR, observa que a questão de buscar fontes alternativas de energia é outro ponto fundamental que precisa ser revisto pelas empresas, até pelo custo (financeiro e ambiental) que a energia representa. Uma aposta seria a autogeração, utilizando recursos como biogás, biomassa ou painéis fotovoltaicos e, com isso, utilizar menos energia da rede pública.

Para Errera, o investimento em reuso da água também demandaria um maior empenho por parte das empresas, pois esse investimento se paga com a menor demanda de água tratada utilizada nos processos fabris. “Isso diminui a demanda por novos mananciais e a um custo maior. Mais do que a captação da água da chuva, que depende de condições climáticas, o reuso é a reutilização da água tratada que você já pagou”, conclui.

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Estratégia é investir, mesmo em tempos difíceis

Algumas empresas descobriram que colocar a sustentabilidade no centro de sua estratégia de negócios é, quem diria, um bom negócio. A PepsiCo Brasil, fabricante das marcas Pepsi, Lay’s, Ruffles e Toddy, entre outras, investe na preocupação com o meio ambiente em quatro frentes: agro, processo produtivo, produto e reciclagem. No agro, a meta é ter 100% das matérias-primas certificadas pelo Programa de Agricultura Sustentável até 2025. Para isso, os agricultores parceiros passam por treinamentos e recebem consultoria para que os parâmetros sejam utilizados.

No processo produtivo, a PepsiCo adota um programa de economia de recursos há 10 anos, proporcionando menos gasto com energia, água e resíduos industriais. “Atualmente, menos de 1,25% dos resíduos produzidos pela PepsiCo em suas plantas são enviados a aterros sanitários (somente resíduo de refeitório e banheiro). As sobras de alimentos dos processos produtivos (milho, aveia, batata, entre outros) são moídos e destinados para fabricação de ração animal, por exemplo”, explica Eudes Costa, gerente de Sustentabilidade Ambiental, Saúde e Segurança da companhia.

Além disso, a PepsiCo reduziu em 25% o consumo de água nas suas linhas três fábricas no Brasil. Até o fim de 2019, a empresa busca como meta reduzir mais 8%. O reuso é feito em todos os processos em que é possível fazê-lo. Segundo a empresa, o plano de investimentos sempre destina verbas para projetos de sustentabilidade. “Ao contrário do que se imagina, em momentos de crise é que temos de ser ainda mais criativos e produtivos, buscando alternativas de redução de consumo ou de melhorar a eficiência de nossos processos. Os custos com utilidades (água, energia e gás) em uma companhia representam sempre um grande impacto nos gastos de fabricação e no custo final do produto. Portanto, investir nestas reduções pode representar um diferencial competitivo no negócio”, conclui o executivo.

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