A ideia de que o Brasil está se transformando em um paraíso de empregos atravessou o Atlântico e está encantando portugueses, espanhóis e até mesmo italianos. Uma página no Facebook que promete ajudá-los a conseguir vagas no País já atraiu quase 40 mil interessados - todos os dias, entre 500 e 600 pessoas, a maioria portugueses, se associam à comunidade. De volta à posição de primos pobres da Europa, afundados em uma recessão sem fim à vista e com o desemprego batendo em 15%, Portugal trocou de lugar com o Brasil e assumiu a posição de fornecedor de mão de obra.
No último final de semana, o coordenador da comunidade, que já morou e trabalhou no Brasil, organizou também duas conferências, uma em Lisboa e outra no Porto, para ensinar seus conterrâneos o caminho para emigrar. Centenas de pessoas pagaram 77 para assistir, por cerca de seis horas, um advogado brasileiro especialista em migração explicar o processo para obtenção de um visto de trabalho no País e o próprio organizador da conferência David Bernardo, explicar como encontrar vagas por aqui.
Desempregado, o engenheiro agrônomo João Matado, 29 anos, saiu de Moura, no Alentejo, para assistir seis horas de explicações em Lisboa.
"Foi muito interessante. Serviu para desmistificar essa questão do visto de trabalho, que é bastante complicado. Também fiz contatos muito interessantes durante a conferência", contou ao Estado. Desiludido com suas perspectivas em Portugal, Matado acha que é a hora de retomar os planos de viver no exterior. "No nosso país não está nada fácil viver. Temos sérios problemas de infraestrutura, a condições de trabalho são muito precárias. Sempre quis trabalhar no estrangeiro, esse é o momento", afirmou. Especializado em ovinocultura, acredita que pode achar espaço no Brasil. "Essa é uma área que está começando no Brasil e aqui já temos experiência", disse.
Tiago Cêpeda, 32 anos, engenheiro ambiental especializado em tratamento de resíduos, é um dos poucos membros da comunidade que não está desempregado. Mesmo assim, também quer vir para o Brasil.
"Oportunidades aqui não estão boas com a crise. Já o Brasil está numa boa fase. Trabalho no que eu gosto, mas minha área ainda está iniciando por aí, as possibilidades são maiores", explicou Catarina Almeida, formada em marketing, acabou de ter um contrato de três anos encerrado.
Aos 27 anos, ela está desempregada e com esperanças de vir trabalhar no Brasil. "Tenho amigos muito contentes em trabalhar por aí. Temos a facilidade da língua e o Brasil é bastante atrativo nessa área", explica.
A semelhança cultural, além do crescimento expressivo do País nos últimos anos, é uma das maiores razões para o interesse dos portugueses no Brasil. Notícias de que faltam engenheiros e médicos no País e de que a classe média brasileira vem crescendo expressivamente são avidamente compartilhadas na página do Facebook Empregos no Brasil para Estrangeiros. Dicas como a de um italiano, que sugeriu a seus conterrâneos procurarem possíveis parentes para fazer contato, ou sugestões de áreas que estão contratando, também fazem sucesso.
O interesse dos europeus por empregos por aqui também tem chegado pelas câmaras de relações entre os países. Na Câmara Brasil Espanha, até março já chegaram 250 currículos de pessoas interessadas em emigrar, a maioria nas áreas de engenharias e arquitetura. "Desde 2011 está crescendo o número de pessoas que nos procuram. Começou em 2008, 2009, com a crise na Espanha, e deve aumentar, já que não há perspectiva de melhoria da situação a curto prazo", disse a diretora executiva Maria Luiza Castelo.
A recomendação dada pela Câmara é a mesma dada nas conferências portuguesas: faça contatos antes de vir ao Brasil. "A imaginação pode ser bem diferente da realidade. O Brasil é um país muito grande, não é a mesma coisa trabalhar em São Paulo ou no Nordeste", explicou Maria Luiza.
Apesar disso, a percepção é de que a entrada ilegal de espanhóis tem aumentado. Nem a Polícia Federal nem o Itamaraty dão números mas mesmo antes do Brasil adotar a reciprocidade e endurecer as exigências - o que começou essa semana - houve casos de entrada negada. A avaliação é que a situação vai piorar.
Apesar do interesse do Brasil em atrair estrangeiros altamente qualificados, vir trabalhar no País não é simples. Engenheiros, que realmente andam em falta no País, não podem assinar projetos. Por isso, só podem ser contratados como consultores. Apesar disso, para obtenção de um visto é exigido um contrato de trabalho e apenas depois de quatro anos é expedido um visto permanente.
Os vistos temporários, de até dois anos, cresceram 31% entre 2010 e 2011, mas portugueses e espanhóis não aparecem nem entre as 10 nacionalidades que mais conseguiram emprego no País. Em 2011, foram concedidos 2.692 vistos permanentes - 307 deles para portugueses, outros 269 para espanhóis.