Analistas
Plano de desenvolvimento foi "requentado"
Desde o ano 2000, a Comissão Europeia intensificou a abertura de seus mercados e estabeleceu um ambicioso conjunto de objetivos políticos que foram batizados de Estratégia de Lisboa. Assim foi definida a meta de crescimento econômico médio de 3% ao ano, e que o "pleno emprego" seria alcançado em 2010. Nenhuma dessas conquistas foi obtida.
Apesar disso, um punhado de medidas foram bem-sucedidas, como a ampliação dos serviços de banda larga e a redução das emissões de gases do efeito estufa em alguns países. De acordo com aquelas metas, as nações da UE também deveriam fazer mais para apoiar a economia digital e as pequenas empresas, bem como reduzir a regulação e promover a competitividade nos setores de gás natural, eletricidade e telecomunicações.
Tanto a comissão como os governos europeus decidiram requentar o plano e dar-lhe sobrevida com um novo nome, Europa 2020. Numa recente conferência da OCDE, o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, descreveu o pacote como "um novo modelo de crescimento para a Europa". Porém, como antes, as expectativas de sucesso são pequenas.
Para a maioria dos analistas, o novo plano não é muito diferente do anterior. Ele contém sete iniciativas-chave em torno da uma "agenda digital", da inovação e do uso eficiente dos recursos. A linha mestra ainda parece ser o livre mercado, com ênfase no envelhecimento dos conceitos de setores e indústrias nacionais. O documento também insiste em "reformas estruturais" um mantra que significa menos déficit orçamentário, menos regulamentação sobre o mercado de trabalho e a remoção de potenciais barreiras ao crescimento, como os subsídios estatais a segmentos em dificuldades.
A diminuição dos rombos de orçamento permanece no topo das prioridades. "Sem uma consolidação fiscal, não iremos crescer por uma simples razão: não haverá confiança. Sem confiança, não há investimento; sem investimento, não há crescimento", disse Barroso.
O secretário-geral da OCDE, Ángel Gurría, instou os países-membros a "se estruturarem", mesmo que estejam mergulhados em programas de austeridade. Essas profundas mudanças estruturais foram "deixadas de lado para enfrentar uma emergência", disse ele. "Agora é hora de retomá-las e colocá-las na linha de frente." Neste momento, o futuro do euro pode ser usado como uma grande justificativa para as reformas. É difícil dizer, no entanto, se o cumprimento da apostila da UE será suficiente.
Irlanda
Os irlandeses, em particular, têm razões de sobra para se sentirem maltratados. Ao longo da última década, o governo de Dublin foi constantemente elogiado como um bom aluno ao abrir-se para os mercados de produtos, serviços e capitais. Um estudo da OCDE sobre a Irlanda, publicado em 2008, pouco antes do estouro financeiro, concluiu que o país havia tido "um desempenho excepcional nos dez anos anteriores" e que sua "base econômica continuava forte".
O documento citava fraquezas, principalmente na infraestrutura e na capacidade das finanças públicas para lidar com uma população em envelhecimento. Por outro lado, elogiava a política de imigração e dizia que os bancos irlandeses eram "altamente lucrativos e bem capitalizados, portanto com boa capacidade para absorver choques".
No fim de dezembro, o governo da Irlanda teve de estatizar pela quarta vez um grande banco, o Allied Irish, conforme demandava o plano de socorro internacional, que emprestará ao país 67,5 bilhões de euros.
Com boa parte da Europa mergulhada em dívidas e enfraquecida por planos de austeridade, era de se esperar que os líderes da União Europeia revissem modelos econômicos e buscassem maneiras de promover o crescimento em meio a uma concorrência global mais acirrada. Mas, pelo que se observa, caso existam ideias novas, elas estão sendo mantidas em sigilo. Na recém-divulgada estratégia de desenvolvimento do bloco, os políticos de Bruxelas oferecem mais do mesmo ainda que o conjunto de objetivos anterior, que visava tornar a Europa a região mais dinâmica do mundo até 2010, não tenha sido cumprido.
Durante a última década, a Comissão Europeia, divisão executiva da UE, demonstrou preferência pelo modelo anglo-saxão de mercados pouco regulados em detrimento dos impulsos mais estatizantes de países como França, Itália e, em menor grau, Alemanha. Isso não mudou muito, mesmo após dois anos de turbulência econômico-financeira que expôs os defeitos da opção. A Grã-Bretanha e a Irlanda, símbolos da ortodoxia do mercado livre, prosperaram durante certo tempo, mas os dois países foram derrubados pela explosão das bolhas imobiliária e de crédito e se viram obrigados a estatizar bancos quebrados.
Por outro lado, o modelo continental clássico com seus sistemas grandes e caros de seguridade social, mercados de trabalho mais regulamentados e governos menos tímidos na hora de intervir para manter indústrias respirando está longe de ter passado ileso pela crise. Exemplos claros são Grécia, Portugal e Itália, cujas montanhas de débitos ameaçam a zona do euro como um todo. "Muita gente ficaria feliz se dançássemos sobre o túmulo do modelo anglo-saxão. Mas não é simples assim", diz um embaixador da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), que falou sob a condição de anonimato.
França e Itália enfrentaram uma recessão mais amena do que outros países da UE, mas também tiveram o crescimento prejudicado durante os anos de bonança econômica. Isso torna difícil o atual ajuste orçamentário bem como a preparação para futuros desafios, como manter viáveis seus sistemas de previdência. A recente briga dos franceses sobre pequenas alterações nas regras de aposentadoria sugere que novos avanços nessa área serão dolorosos. Além disso, com os investidores internacionais cada vez menos dispostos a financiar buracos nas contas públicas, restarão poucas opções para esses governos.
"Vale do Reno"
Alguns enxergam uma saída no modelo do "Vale do Reno", ou seja, no exemplo de capitalismo social mais direcionado da Alemanha, que prioriza o consenso ao invés do enfrentamento, e cujo Estado adota, sempre que necessário, um papel coadjuvante no desenvolvimento. Os anos de produtividade em alta, mudanças nas relações trabalhistas e contenção salarial estão se provando úteis, com a Alemanha assumindo a posição de economia mais sólida da região.
"O modelo inglês era mais atraente do que o alemão, e muitas orientações anglo-saxônicas foram introduzidas na Europa continental. Agora, começou-se a repensar a escolha", disse, em uma entrevista recente, o ex-primeiro-ministro holandês, Jan Peter Balkenende. De forma mais ampla, segundo ele, se quiser ser competitiva, a Europa deve persistir em suas crenças fundamentais na livre circulação de trabalhadores e produtos ao mesmo tempo em que "revê conceitos de bem-estar social".
Tradução: João Paulo Pimentel
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