A última quarta-feira (20) e qualquer outro dia de pequenas altas na Bolsa brasileira são e serão apenas soluços. A longo prazo, o mercado de ações caminha para uma quebra em outubro. É isso que indica o Índice de Mudanças Abruptas (IMA), desenvolvido por dois pesquisadores brasileiros, Marco Antônio Leonel Caetano, docente do Insper, e Takashi Yoneyama, do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), a partir de um modelo matemático com ajustes de parâmetros estatísticos inspirado em métodos antes usados, por exemplo, para a previsão de terremotos.
Em fevereiro, quando o Ibovespa batia os 84 mil pontos, falamos da previsão de crash pela primeira vez aqui na Gazeta do Povo, a data estimada pelo IMA para isso ocorrer era 19 de outubro. Na ocasião, o IMA estava em torno de 0,90 – quando o movimento das ações é de alta e o IMA chega a 1 é porque a leitura de risco de crash se faz presente.
“A ‘energia’ acumulada nas bolsas ao redor do mundo, tornou todos os índices muito próximos do modelo log-periódico de Didier Sornette ”, escreveu Caetano em um artigo naquele mês. Ao perceber isso, ele aplicou o modelo de previsão de turbulências em foguetes do geofísico francês, com parâmetros ajustados para o Ibovespa, e chegou a um prazo de 183 dias, a partir do dia da publicação do artigo (1.º de fevereiro) para o início de um período de fortes quedas na Bolsa brasileira. Ou seja, 19 de outubro. Caetano lembra também que, historicamente, outras quebras de bolsa ocorreram em outubro, como a de 1929, nos Estados Unidos.
Segundo Caetano, nada mudou de fevereiro para cá. “Na realidade, dependendo do cenário, às vezes o período de queda mais forte passa para as semanas de setembro, e depois volta para outubro. Se realmente ocorrer como o modelo prevê, as quedas mais fortes deverão atingir um ponto mais baixo para a Bovespa em outubro desse ano”, pondera o pesquisador.
Os cálculos intradiários do IMA , que acumulam mais de 200 mil dados e 2 mil dias de Ibovespa, têm acertos de 93,8% atualmente. No caso dos cálculos feitos a cada 15 minutos, a margem de erro tem sido de 2,72 dias, em média. Assustador?
“O mercado de ações é como um brinquedo do tipo massa-mola. Ao colocar um peso na vertical, segurado por uma mola, esse peso descerá até que a estrutura da mola o puxe de volta para cima. No começo da brincadeira, as oscilações entre baixas e altas são lentas, mas com amplitudes muito fortes. Ou seja, a diferença entre as máximas e mínimas são grandes. Mas quando o peso está próximo de parar de oscilar, suas altas e baixas são mais frequentes, com amplitudes bem pequenas. Nós estamos no primeiro caso. Se puxarmos demais a mola, ela se arrebenta e o peso cai no chão”, explica o pesquisador.
Autor dos livros Mudanças Abruptas no Mercado Financeiro (na lista dos 10 melhores do prêmio Jabuti em 2014) e Análise de Risco em Aplicações Financeiras, Caetano diz que em maio, antes da greve dos caminhoneiros, os investidores, principalmente os fundos de investimentos, não deixaram a Bolsa oscilar. Compraram demais, camuflando a realidade do país. “O cenário não era para aquele otimismo todo, e com isso, eles ‘quebraram’ o ciclo normal de altas e baixas. Ao fazer isso, você desestabiliza todo o sistema dinâmico. Quando tivemos a greve dos caminhoneiros, (...) a mola não arrebentou, mas está mais para segurar o peso em baixa do que no alto”.
Olhando para o cenário atual e também o que se desenha, com ingredientes externos como a disputa entre EUA e China, a queda dos juros no país norte-americano e a instabilidade na Europa, e internos, como as incertezas políticas e a economia fragilizada, Caetano pinta uma previsão bastante pessimista.
“Tanto do ponto de vista da economia real, como da economia de mercado, os meses à frente serão muito complicados do meu ponto de vista e do ponto de vista da Matemática. Adicione-se a tudo isso uma eleição confusa, e temos o tempero completo de problemas financeiros complexos e abrangentes”, avalia o pesquisador.
Para além das indicações do IMA, nem todo mundo está tão pessimista. Nesta quinta-feira (21), a Ana Botín, presidente mundial do Santander, disse à Folhapress que este é um momento bem diferente de 1982 (crise da dívida externa), 1994 (crise do Médico) ou 2001 (crise da Argentina). "Apesar das aparências, o que está ocorrendo é um novo equilíbrio global. Os Estados Unidos voltaram a crescer e isso é bom para a América Latina e para o mundo", disse ela à agência de notícias.
Como surgiu o IMA
Ainda na década de 1990, o geofísico Didier Sornette resolveu levar o modelo de previsão de turbulências em foguetes Ariane – lançadores de satélites usados pela Agência Especial Europeia à época –, para a área da sismologia, no Departamento de Ciências Terrestres e Espaciais da Universidade da Califórnia.
Sua missão era prever terremotos, ou mais precisamente, o acúmulo de energia capaz de gera-los. Anos mais tarde, esse evento da natureza o inspirou a fazer o mesmo com o mercado financeiro: um modelo capaz de medir o acúmulo de energia (leia-se: dinheiro) no mercado financeiro e prever o próximo momento de queda.
O modelo foi testado em todas as bolsas do mundo e ficou conhecido como log-periódico. Com ele, Sornette previu em 2005 a bolha imobiliária que estouraria em 2008 nos Estados Unidos.
A lógica por trás do IMA é um pouco diferente da de Sornette. Enquanto o geofísico francês conseguiu prever fortes quedas por meio de ciclos periódicos, Caetano e Yoneyama, usando o histórico do Ibovespa e de algumas de suas principais ações, substituíram a metodologia dos ciclos por análises nas oscilações dos preços com frequências variantes e rápidas.
É a técnica das wavelets (ou ondaletas), também usada, por exemplo, pelo telefone celular quando o dispositivo busca pela frequência de sinal mais próxima. Caetano explica que o método consiste em avaliar a variação de ondas pequenas para medir a frequência com que as oscilações mudam com o passar do tempo. Quanto mais próximas estiverem essas ondas de baixa volatilidade, mais próxima também está uma tendência de mudança de cenário no mercado financeiro.
Por outro lado, quando as oscilações são de alta volatilidade e menor frequência, o risco de uma mudança abrupta é menor. Sendo um índice, o IMA traduz esse risco de reversão numa escala de zero a 1. Quanto mais próximo de 1, maior a chance para um crash ou para um rally de alta, dependendo apenas da tendência do movimento dos ativos. Se o movimento das ações for de alta e o IMA estiver um 1, um crash poderá ocorrer. Se os preços estiverem em queda, e o IMA estiver em 1, a tendência pode mudar para alta.