Nos últimos 11 anos, Ben Bernanke tinha nas mãos o poder de definir os rumos da política econômica dos EUA. Como presidente do Federal Reserve (banco central americano), era responsável por baixar ou elevar juros e definir a estratégia para a economia do país sair da crise.
Tamanho poder contrasta com uma situação inusitada: ao tentar conseguir um refinanciamento de hipoteca, Bernanke recebeu um "não" como resposta de seu banco.
A negativa é ainda mais surpreendente diante das informações sobre a renda do economista. Substituído por Janet Yellen no comando do Fed no início do ano, Bernanke ganha cerca de US$ 250 mil por palestra, segundo informações do jornal "The New York Times". Além disso, assinou um contrato milionário para a publicação de seu livro, o que seria suficiente para cobrir o valor do imóvel comprado em 2004, hoje avaliado em US$ 815 mil.
O episódio foi narrado pelo próprio economista, em uma conferência em Chicago na quinta-feira, segundo a Bloomberg News: "Cá entre nós, recentemente tentei refinanciar minha hipoteca e não consegui. Não estou inventando."
O ex-chefe do Fed decidiu compartilhar sua história para mostrar como o sistema de hipotecas é inflexível. Apesar de ter credibilidade e dinheiro suficientes para ser elegível para um empréstimo, Bernanke foi desclassificado por um sistema automático por ter trocado de emprego recentemente. Ex-funcionário público, sua renda potencial pode continuar alta, mas incerta, o que aumentaria o risco de crédito.
"O maior problema em mudar de emprego é quando também ocorre uma alteração na estrutura de pagamento", explica Jim Woodworth, especialista em hipoteca, em artigo, segundo o "NYT". "Por exemplo, alguém que sai de uma vaga assalariada para uma vaga comissionada vai encontrar obstáculos ao tentar obter um empréstimo, mesmo que o novo emprego resulte em maior renda".
Ao usar o exemplo pessoal para demonstrar a dificuldade em conseguir um empréstimo, Bernanke defende que o crédito está mais apertado do que deveria estar. Segundo artigo publicado no "NYT", mais do que uma questão de "aperto contra afrouxamento", os EUA precisam discutir se a dinâmica para concessão do empréstimo está de acordo com a situação da economia.
"Quanto mais automatizadas ficam as hipotecas - baseadas em fórmulas atreladas a histórico de emprego - menos espaço credores individuais têm para julgar de forma mais sensível para concluir que, apenas talvez, o cara simpático com uma barba que parece vagamente familiar e parece que certamente tem muito dinheiro pode ser um bom pagador, independentemente de seu histórico de trabalho", brinca o texto.