O economista Márcio Holland, que foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda entre os anos de 2013 e 2014, vê que o Brasil vem enfrentando repetidas frustrações com resultados fiscais nos últimos dez anos e que a perspectiva é de que ocorra o mesmo nos próximos.
Ele viu por dentro a deterioração das contas públicas sob o governo de Dilma Rousseff (PT) e enxerga o mesmo caminho com Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em que um necessário ajuste fiscal rígido vai sendo adiado por questões eleitorais. No caso, a possível tentativa do petista de se reeleger em 2026 – embora Holland veja que o ajuste não pode passar de 2027.
“Em janeiro de 2027, um novo governo vai ter de anunciar uma nova regra fiscal. Em 2016, anunciamos o teto de gastos. Não durou muito. O governo anterior [de Jair Bolsonaro, PL] teve de fazer cinco emendas constitucionais para mudar a regra do teto para fazer os gastos caberem na regra”, disse em entrevista ao jornal Valor Econômico publicada nesta quinta (3).
Holland comparou o cenário atual ao de 2013 e 2014, quando o ajuste fiscal foi adiado para 2015, após a reeleição de Dilma. Na época, a postergação das medidas econômicas resultou em um custo elevado para reequilibrar as contas públicas, um ciclo que pode estar prestes a se repetir.
“Quando você adia ajuste fiscal, o custo de o equilíbrio ser alcançado é muito maior. Foi isso que aconteceu com o Brasil de 2013 a 2017 e é isso que tende a acontecer agora. [...] O Brasil está correndo severo risco fiscal”, diz ele, destacando que o governo atual parece estar repetindo os erros do passado.
Apesar do pessimismo, Holland reconhece que o ministro Fernando Haddad, da Fazenda, tem se mostrado uma “âncora” importante no controle dos gastos públicos, mas critica a demora em abordar de forma mais ampla a questão fiscal. Ele diz lamentar que a agenda de gastos tenha começado a aparecer apenas a partir deste ano, enquanto que o ajuste fiscal proposto no ano passado foi focado no aumento da arrecadação.
“A gente vai ter um Lula 3 muito parecido com Dilma 1, que foi um período em que, em certo momento, já havia a necessidade de ajuste fiscal, sobretudo a partir de 2012. No caso do Haddad, eu diria que, desde o início do governo, ele deveria ter anunciado o arcabouço com medidas de corte de gastos, além de recuperação de arrecadação”, pontuou.
Ele aponta que o atraso nas ações para reduzir os gastos públicos será um problema sério para o futuro, e vê como urgente a revisão dos critérios de elegibilidade de programas de transferência de renda e benefícios previdenciários – principalmente o Benefício de Prestação Continuada (BPC), um dos focos do governo para o corte de gastos –, que consomem uma parcela significativa do orçamento.
“Praticamente metade da receita líquida vai para uma única rubrica. A conta não fecha”, diz, referindo-se aos gastos com a Previdência, que chegam a R$ 1 trilhão.
A possibilidade de o governo cumprir a meta de resultado primário deste ano existe, segundo o economista, mas ele alerta que isso não resolverá o problema de endividamento do país. Holland afirma que o arcabouço fiscal atual “não ancora a economia para o médio prazo”. “Portanto, não é sustentável”, afirma.
Apesar das tentativas do governo em controlar as despesas e aumentar a arrecadação, Holland prevê que a frustração com o crescimento econômico e a consequente queda na arrecadação podem gerar um agravamento da crise fiscal até o final de 2026.
“Vamos entrar em um desespero muito grande”, prevê o economista, ressaltando que o atual ciclo de alta de juros e o crescimento da dívida pública são fatores que agravam ainda mais o quadro econômico.
O economista ainda ressaltou que, embora o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) tenha dado um alívio temporário, ele não vê sustentação no longo prazo. Para ele, “na beira do abismo, a gente está se equilibrando”.
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